16 fevereiro 2008

Tipo e características de luta na revolta popular de Maputo (3) (prossegue)

Não é necessário muito tempo para verificarmos o tipo de "análise" que surge aos mais variados níveis quando está em causa o 5 de Fevereiro. A força da revolta popular foi tão grande, tão surpreendente para as nossas almas habituadas a ver pacifismo por todos os lados, que mais nada parece restar senão produzir um discurso de caos irremediável, de desordem primordial, a cargo de multidões bárbaras, selvagens, filhas de Le Bon, esquecidas do diálogo inteligente, da decência urbana. Daí o recurso imagético, cinético, sinestético, a termos e expressões como tumultos, vandalismo, agitação, marginais, crianças instrumentalizadas, mão externa, multidões, assaltos, paus, catanas, pedras, vidros partidos, etc.
O problema, afinal, é sempre o mesmo: é o rio que é culpado, não as margens que o comprimem, é o rio que é selvagem, não as educadas margens que o tornam irascível. Em última análise, o rio foi tornado agitado por uma tenebrosa mão externa.
Por outro lado, enxerta-se no discurso do barbarismo das multidões o discurso proponente e moralizador do que deve ser rectificado a nível técnico, sectorial, humano, como se os problemas sociais que enfrentamos pudessem ser resolvidos pela varinha mágina dos remendos de emergência e dos empenhos racionais propostos pelas madres teresas não de Calcultá, mas de Maputo.
Mas deixemos isso por agora e pensemos se é possível criar uma geografia da revolta popular, do seu tipo, das suas formas de manifestação, dos recursos usados, dos objectivos, dos alvos. Será esse o tema do número seguinte, a sair ainda hoje.
Adenda: leia ou recorde este meu texto aqui.

2 comentários:

Anónimo disse...

...tenho-me perguntado,como é que este governo vai soluçionar este maremoto.
Será que vai monitorar as forças da ordem com o tal PEPER SPRAY para dissuadir qualquer tentativa de continuação das rebeliões?
Será que vão criar uns campos de reeducação para se reeducarem voluntáriamente.
Será que se vão demitir em massa?
Será que vão finalmente por em funcionamento o Concelho de Estado numa tentativa de pedirem ajuda?
Será que vão decretar o estado de sitio?
Será que vão decretar eleições antecipadas?
O que será que nos vai realmente acontecer?
O que será que vai brotar destes proficuos cranios?

AGRY disse...

A imunodeficiência politico-cultural transmitida pelo vírus do neo-liberalismo, não tem cessado a sua propagação pelo corpo social de sociedades mergulhadas, há séculos, na mais abjecta exploração.
O alerta sobre a mudança de bandeiras, estandarte de revolucionários como Amilcar Cabral, foi abafado e adulterado pela ambição de uns poucos.
(Isto é um excerto da postagem no blog http://agrywhite.blogspot.com)