30 junho 2009

Portal da comunidade GLS moçambicana


A comunidade GLS (gays, lésbicas e simpatizantes) moçambicana tem um novo portal, a conferir aqui.

Processo político moçambicano

Confira o n.º 40 do Mozambique political process bulletin, com data de amanhã, aqui.
Adenda às 13:35 de 01/7/09: só agora reparei que não tinha colocado o ficheiro. O meu pedido de desculpas, creio já ter resolvido o problema. E se quer ler em português, faça-o aqui.

Impacto da crise na indústria mineira da África Austral

A nível da SADC já houve um estudo sobre o impacto da crise financeira mundial na indústria mineira da África Austral. Porém, Moçambique não foi abrangido. Confira aqui. Obrigado ao Thomas Selemane pelo envio do material. Finalmente, recorde aqui, aqui e aqui.

Novidades no bricolando

No bricolando o social e a análise, o António Francisco tem uma resposta no fórum da abstenção e o Elísio Leonardo criou um para o Hip Hop. Aqui.

África: assassinados 31 chefes de Estado em 40 anos


Negócios em Moçambique segundo BM

E a Noventa?

Adenda: obrigado ao Ricardo, meu correspondente em Paris, pelo envio da referência sobre a empresa.

Guiné-Bissau

Valor no mercado de portais de Moçambique

O informático Elísio Leonardo do InfoMoz, estudante de informática da Universidade Eduardo Mondlane, continua com os seus interessantes trabalhos de pesquisa e análise. Desta vez, pôs-se a avaliar o valor no mercado dos nove portais de imprensa constantes do meu diário, fazendo uso dos avaliadores encontráveis aqui: http://www.cubestat.com/ e http://www.dnscoop.com/
Confiram os resultados aqui.

29 junho 2009

Por que acreditamos que...? (2)

No primeiro número desta curta série dei-vos várias perguntas diferentes. Naturalmente que as respostas são, igualmente, diferentes.
Porém, todas as perguntas remetem para um solo comum, para um mesmo fio condutor.
Ora, sempre me interrogo sobre a função primeira do pensamento. Encontrei a resposta, eventualmente banal, nos pragmatistas americanos. Produzir a crença é a única função do pensamento – escreveu um dia
Charles Pierce. O progresso científico é a integração permanente de informação numa rede coerente de convições - defende Richard Rorty.
Nesse sentido, as diferenças entre perguntas e respostas, entre contextos e épocas, esbatem-se. Somos todos, afinal, crentes.
(fim)

Recursos de poder e estigmatização

A estigmatização colectiva aparece muitas vezes como algo natural, como algo personalizável, como simples aversão de certos indivíduos por outros, como algo que tem unicamente a ver com pessoas boas e com pessoas más, como algo independente das relações sociais e, em particular, da luta política por recursos de poder. Quem quer chegar ao poder político, quem se apresenta colectivamente como grupo aspirando a disputar recursos de poder, sofrerá uma impiedosa e permanente estigmatização por parte dos gestores actuais desses recursos. Os mais pequenos pormenores serão usados e ampliados como marcadores da panóplia estigmatizante.

28 junho 2009

Quatro elefantes nas margens do Zambeze


Introdução de um texto do Eng.º José Lopes: "Quando nos próximos tempos se ponderar a emissão de licenças ambientais de quatro novas mega-centrais eléctricas nas cercanias de Tete/Zambeze [2 hidroeléctricas (Cahora Bassa/Norte e Mphanda Nkuwa) mais 2 térmicas a carvão (Moatize/Vale e Benga/Riversdale)], seria desejável que, ao invés de uma mera avaliação individual dos projectos, as autoridades moçambicanas nos oferecessem uma detalhada análise comparativa entre estes quatro projectos."

Casamentos ontem: rituais de azáfama

Aos sábados, na cidade de Maputo, a Avenida Friedrich Engels e o Jardim dos Namorados ficam repletos de gente alegre e ansiosa que ali cumpre uma parte significativa do ritual dos casamentos, ritual regra geral iniciado no Palácio dos Casamentos, na Avenida Julius Nyerere. Ontem era literalmente impossível transitar naquela avenida. Dezenas de nubentes, centenas de pessoas de todas as idades e grupos sociais, corais e cânticos de pendor vincadamente relogioso, carros último modelo e chapas, vendedores, uma azáfama multiforme ajustando as regras do informal desde as 9 até, sensivelmente, 18 horas. Para vós, dois pequenos momentos que captei à entrada do Jardim dos Namorados e na Engels:

27 junho 2009

Os linchadores de Nooji

Não há muito tempo ainda, o treinador holandês da nossa selecção nacional de futebol sénior, Mart Nooij, era um homem venerado. Se não ganhavam, os nossos mambas pelo menos empatavam. Os sonhos de chegarmos ao mundial e ao CAN estavam firmes. A seleção começou a perder, jogando com equipas bem mais ganhadoras do que a nossa e logo Nooji tornou-se suspeito, mefistófeles a punir. Perdemos no Quénia por 1/2. De quem foi a culpa? Obviamente que de Nooiji - , argumentam os justiceiros do futebol à procura de um bode expiatório. Aqui como em tantos outros campos da vida, os mais sensatos de nós à superfície parecem ter a mesma alma daqueles que, regularmente, em noites ínvias, lincham supostos ladrões do bem-estar.

Unanimidade (5)

Mais um pouco desta série, destinada a propocionar-vos alguns exemplos de unanimidade e conformismo. Olhai à volta, reparai na produção e na reprodução diárias de regras, obediência e punição:

26 junho 2009

Diamantes de sangue no Zimbabwe

Centenas de crianças estão a ser forçadas pelo exército zimbabweano a minerar diamantes - denunciou em relatório a Human Rights Watch.
Adenda: sobre os diamantes de sangue, leia ainda, em francês, este trabalho.

Deviz entrevistado por Milton no "Savana"

O presidente do MDM e candidato presidencial Deviz Simango (na imagem) foi entrevistado pelo jornalista Milton Machel para o semanário "Savana" desta semana. Confira aqui.

A "hora do fecho" no "Savana"

Na última página do semanário "Savana" existe sempre uma coluna de saudável ironia que se chama "A hora do fecho". Naturalmente que é necessário conhecer um pouco a alma da vida local para se saber que situações e pessoas são descritas. Deliciem-se com "A hora do fecho" desta semana, da qual ofereço, desde já, um aperitivo:

Eles e nós: representações sociais num bairro de Maputo (8)

Mais um pouco da série, elaborada com base em depoimentos recolhidos num bairro da periferia da cidade de Maputo.
Do depoimento de E., Moçambicana: "(...) existem muitos estrangeiros, por exemplo temos aqui Burundeses, Somalianos, Zimbabweanos, Sul-africanos, etc., todos negociantes. Eles para além de desenvolverem o negócio normal, também desenvolvem negócio sujo, são traficantes de drogas. Eu não posso apresentar uma prova palpável, mas toda a gente sabe que trazem drogas no nosso país; não são todos, mas alguns. (...) Eles não empregam Moçambicanos e trabalham entre eles, Moçambicanos servem como carregadores de sacos. (...) como é que eles conseguiram dinheiro que investiram no negócio se são refugiados? (...) Burundeses são grandes feiticeiros em negócios e até utilizam gatos nos balcões deles de venda."

Não ter para a tinha

Resposta de uma enfermeira ante o caso de uma criança aparentemente sofrendo de tinha e que foi presente a uma consulta no Hospital Rural de Marromeu: "Lamento bastante, são tantas crianças que padecem desta doença mas o nosso hospital não tem este tipo de medicamento pelo facto dos medicamentos custarem muito dinheiro e o nosso ministério não opta em comprar medicamentos caros para doenças que não matam, exemplo a tinha. Depois acrescentou: melhor recorrer a farmácias privadas." Confira aqui.

Metralhadoras informais

Com frequência, o boletim de ocorrências do "Notícias" reporta o surgimento de armas de fogo na via pública. Desta vez, duas metralhadoras AKM foram encontradas no bairro de Mavalane, periferia da cidade de Maputo e uma terceira na posse de um indivíduo no bairro do Costa do Sol. A conferir aqui.

Morreu Michael Jackson


Morreu ontem, aos 50 anos, vítima de paragem cardíaca, o popular músico, cantor, compositor, actor, publicitário, escritor, produtor, director, dançarino, instrumentista e empresário norte-americano Michael Jackson, cuja música e cuja forma de dançar tanto influenciaram a juventude do nosso país. Confira aqui. Obrigado aos leitores que me advertiram no mural de recados situado no lado direito deste diário.

25 junho 2009

As amêijoas do Costa do Sol




Neste 25 de Junho, dia de festa, fui recordar as amêijoas em molho de alho do Restaurante Costa do Sol, na Avenida Marginal, junto à praia: as amêijoas na foto de cima, o piripiri bem sacaninha a seguir e, em baixo, as amêijoas com o delicioso pão de alho.

Eles e nós: representações sociais num bairro de Maputo (7)

Mais uma bocado da série, desta vez com o Sr. M., antigo secretário de bairro: "Estrangeiros apareceram neste bairro em 2003 e a maioria são Ruandeses e não Burundeses como as pessoas do bairro dizem (...). Eles estão mais preocupados com o negócio deles, desobedecendo totalmente as leis do país e eles vendem seus produtos nos dias feriados, nos sábados e nos domingos. (...) Aqui no bairro todos dedicam ao negócio e são eles que dominam o mercado. (...) aqui no bairro muita gente se interroga donde provém o dinheiro que esses estrangeiros usam para iniciar o negócio. É difícil explicar esta questão e convencer as pessoas, mas eu entendo que muitos desses estrangeiros têm familiares na Europa e na América e talvez sejam estes familiares que criam condições para eles iniciarem com seus negócios."
(continua)

Por que acreditamos que...? (1)

Por que acreditamos que alguém amarra a chuva no céu? Por que acreditamos que Armando Guebuza vai ganhar as eleições de Outubro? Por que acreditamos que o processo de Bolonha melhora o ensino universitário? Por que acreditamos que com os sete milhões a pobreza absoluta vai desaparecer? Por que acreditamos que o Dr. Única Mezinha dos Grandes Lagos cura não importa que doença? Por que acreditamos que a ciência é uma coisa distinta do senso comum? Por que acreditamos que a orgonite elimina as energias negativas? Por que acreditamos que correr diariamente faz bem à saúde?
Estais a ver tanta pergunta desalmada, cada uma aparentemente única, cada uma aparentemente com seu feudo de contexto e significado?
(continua)

25 de Junho de 1975

24 junho 2009

Aumentar regalias aos deputados

No "O País" online de hoje: (...) o projecto de lei do Estatuto do Deputado, prevê, por outro lado, aumentar regalias aos deputados. Se este projecto for aprovado em definitivo, o Estado moçambicano vai passar a custear o seguro, contra terceiros, das viaturas dos deputados, enquanto estas (viaturas) continuarem propriedade do Estado. A introdução deste seguro vai ter, segundo o Ministério das Finanças, um impacto financeiro adicional anual para o Orçamento do Estado de cerca de um milhão de Meticais (um dólar norte-americano equivale a cerca de aproximadamente 27 Meticais).
Adenda: recordem a minha série com o título Ministeriáveis e deputáveis.

Negócios e política em Moçambique


Faz tempo - creio que desde Outubro do ano passado, vejam lá que desastrada amnésia a minha - que não vos sugeria a leitura dos cabeçalhos do Africa Intelligence, com o seu aliciante casamento entre negócios e política. Aqui.

Sem comentários

No "Magazine Independente" desta semana, p. 5.

Unanimidade (4)

Mais um pouco ainda, nesta odisseia da unanimidade, do conformismo.

(continua)

Unanimidade (3)

Mais um pouco, com humor, da série.
(continua)

Unanimidade (2)

Mais um pouco da série, com um exemplo da clássica experiência de Solomon Asch, boa, em meu entender, para analisar comportamentos de unanimidade e, claro, comportamentos da nossa Assembleia da República, onde o pensamento independente é literalmente apagado pela exigência da unanimidade face ao inimigo político.
(continua)

Eles e nós: representações sociais num bairro de Maputo (6)

Prosseguindo esta série, é agora a vez de reproduzir curtos extractos de depoimentos prestados por compatriotas num bairro da periferia de Maputo. Eis J., proprietário de uma barraca: "Nós temos casos aqui no bairro em que os nossos cidadãos trabalham com Burundeses em condições desumanas e são chutados de qualquer maneira e quando reivindicam aparecem outros cidadãos moçambicanos a defender o estrangeiro. (...) Os Burundeses socialmente não são boas pessoas, eles têm um buraco imaginário que a gente não entende e só estamos a assistir que eles evitam ao máximo relacionarem-se com os naturais (...)".
(continua)

Unanimidade (1)

Será sempre fascinante estudar por que e como se produz e reproduz a unanimidade. Pensava naqueles coros unânimes da nossa Assembleia da República, naqueles consensos - de acordo ou desacordo - por bancada. Pensava, quase em simultâneo, nas experiências de Solomon Asch e Stanley Milgram.
(continua)

Eles e nós: representações sociais num bairro de Maputo (5)

Mais um pouco da série, com um extracto do depoimento de um comerciante ruandês: "Nós não temos problemas com Moçambicanos. (...) O único problema que temos aqui é com a polícia municipal. Eles não trabalham bem, não nos deixam trabalhar no fim-de-semana. Nos sábados e domingos temos tido muitos problemas com eles e também com jovens. Os jovens nos insultam e dizem que temos de voltar para o nosso país. Eles falam isso principalmente nas sextas e sábados, porque são os dias que bebem muito e consomem drogas. Eles chegam mesmo de bater com pedras na minha loja".
(continua)

23 junho 2009

Estrangeiro escapa ao linchamento em Palma acusado de introduzir a cólera

Acusado de contaminar fontes de água, um estrangeiro escapou do linchamento no distrito de Palma, província de Cabo Delgado, tendo sido salvo pela polícia. Há uma epidemia de cólera naquele distrito. Confira aqui.
Adenda: procurei analiar as infra-estruturas sociais e representacionais da crença - de que a cólera é intencionalmente introduzida - no meu livro Cólera e catarse.

Fabricar "nigerianos" com rumores (risco de xenofobia)





Lenda urbana, boato ou rumor é "um relato anónimo, breve, com múltiplas variantes, de conteúdo surpreendente, contado como verdadeiro e recente num meio social do qual exprime de maneira simbólica os medos e as aspirações" (in Renard, Jean-Bruno, Rumeurs et légendes urbaines. Paris: PUF, 2006, 3.e éd., p. 6).
Um anónimo deixou um comentário numa postagem da série com o título O papão "nigeriano" que deixa vermes nas mulheres de Maputo, observando que a imagem do "nigeriano" (aqui reproduzida e a ser distribuída em Maputo; mas podem estar a circular outras imagens) pode ter sido retirada de um livro do médico cirurgião Afonso Paes. Ora, tenho do Doutor Afonso Paes uma obra com a referência Manual de Cirurgia - Cirurgia Geral e Cirurgia Tropical. Ministério da Saúde de Moçambique, 1982, 782 pp., ilustrado. Procurei nela quer a foto reproduzida neste diário quer referências a doenças de rosto, mas nada encontrei. Todavia, o livro contém fotos de doentes que são chocantes para nós leigos (permiti-me mostrar-vos algumas) e que podem ser perfeitamente usadas para criar o pânico e, se me permitirdes a precaução, um movimento de xenofobia. Já agora, sugiro-vos que sigam as minhas séries com os títulos Eles e nós: representações sociais num bairro de Maputo e Notas sobre xenofobia e recordem a série com o título Os riscos do efeito borboleta social na África Austral.

Viana com Deus, Lénine e Samora

O presidente da recém-nascida União dos Democratas de Moçambique - Partido Popular, José Ricardo Viana, ex-dirigente da falida Link (cuja história terminal é no mínimo curiosa e desastrosa) e anunciado candidato presidencial nas eleições de Outubro, decidiu espartanamente dever o país regressar ao socialismo científico que ele afirma ter pertencido aos tempos de Samora Machel. Por quê? Porque - argumenta - a Frelimo roubou e continua a roubar os bens do povo, bens que importa devolver, bens que importa redistribuir neste país empobrecido por aqueles que só pensam em enriquecer. Por isso o seu partido é, como afirmou há dias, uma "Frelimo renovada".
Adenda: há tempos, Viana afirmou que o seu partido era guiado por Deus. Com Deus, Lénine e Samora agora, Viana é o destemido cruzado trivalve que faltava à história política do país. Após o desaparecimento dramático de figuras tão garcia marquesianas quanto as de Neves Serrano (e sua criminalística) e Wehia Ripua (e sua cana de pesca), era triste ver o Homo Sibindycus sozinho em sua pimoada caminhada na luta contra a pobreza. Enquanto isso, aguardemos os pronunciamentos do bem-falante Edson Macuácua.

Eles e nós: representações sociais num bairro de Maputo (4)

Mais um bocado desta série.
No estabelecimento de G., congolês, muito desconfiado: “(…) Moçambique é um bom país, embora existam pessoas que falam mal de estrangeiros, principalmente jovens bêbedos e drogados. Eles muitas vezes chegam nas nossas mercearias e começam a insultar-nos.”
(continua)

Embaixador da Nigéria intervém a propósito do rumor do papão "nigeriano"

O rumor do bicho-papão-nigeriano é forte, coriácio. De tal maneira que o embaixador da Nigéria deu ontem uma conferência de imprensa dizendo que nada prova que o "homem estranho" seja nigeriano e que, além do mais, tudo indica que se trata de um boato. Confira aqui.
Adenda: bem, creio valer a pena recordar a minha série sobre tão desalmado personagem rumorento com o título O papão "nigeriano" que deixa vermes nas mulheres de Maputo.

Prossegue roubo do desenvolvimento para outros desenvolvimentos

Adenda: a propósito deste tema ao qual tenho dedicado muitas postagens, o AF mandou-me um texto do qual extraí o seguinte: “... Em 2004, quando explodiu a procura voraz da China por aço, começaram a desaparecer tampas de esgoto em todo o mundo. ‘Os primeiros roubos foram sentidos em Taiwan [...], os seguintes ocorreram noutras regiões próximas, como a Mongólia e o Quirguistão [...]. Em Chicago desapareceram mais de 150 tampas no espaço de um mês. Na Escócia, aquando do ‘grande roubo de esgotos’, assistiu-se ao desaparecimento de mais de cem em apenas alguns dias. Em Montreal, Gloucester e Kauala Lumpur, transeuntes incautos caíram dentro de buracos’. Os comerciantes chineses compravam as tampas de esgoto a ladrões locais e, em seguida, cortavam-nas e enviavam-nas para a China; os compradores nem se quer pestanejavam perante as palavras “City of Chicago” gravadas no aço que compravam. Tanto os comerciantes como os compradores precisavam de aço, e alguém o fornecia a preços irresistíveis. No que lhes dizia respeito, esta transacção era apenas um bom negócio” (Napoleoni, 2009: 90). Confira aqui.

22 junho 2009

Diferenças de poder

Regra geral discutimos as coisas políticas em termos éticos, morais e moralizadores. Mas a essência das coisas políticas tem outras bases: “As diferenças na capacidade de estabelecer normas e de as aplicar a outras pessoas são essencialmente diferenças de poder (legal e extra-legal). Os grupos mais capazes de fazer aplicar as suas normas são aqueles aos quais a sua posição social dá armas e poder. As diferenças de idade, de sexo, de classe e de grupo étnico estão todas ligadas a diferenças de poder” - Becker, Howard, Outsiders, Études de sociologie de la déviance. Paris: Métaillé, 1985, p. 41.

Eles e nós: representações sociais num bairro de Maputo (3)

No estabelecimento comercial de P., num determinado bairro da periferia de Maputo: “(…) em qualquer parte do mundo é assim, o estrangeiro é tratado assim, quer na Europa, quer na América. Portanto, o que dizem contra nós e nós entendemos que somos estrangeiros. (…) De uma maneira geral os Moçambicanos tratam-nos como Burundeses, mas somos Ruandeses. Nós aceitamos esse tratamento para evitarmos problemas, emboras saibamos que aqui no bairro não existem pessoas do Burundi (…) Quando aconteceu o problema da xenofobia na África do Sul, passámos um bocado mal, porque as pessoas falavam mal de nós e até aqui na minha casa serviu como local de esconderijo de viaturas de todos os ruandeses que residem no bairro (…). Tínhamos medo que os nossos carros fossem apedrejados pelos jovens marginais. (…) Eu fui objecto de emboscada por duas vezes (….)”
(continua)

Eles e nós: representações sociais num bairro de Maputo (2)

Eis JO, comerciante ruandês: “(…) eu não tenho nenhum problema com Moçambicanos, embora existam pequenos casos que considero serem normais. Em princípio, os Moçambicanos tratam-nos como Burundeses, mas nós viemos do Ruanda. Às vezes aparecem pessoas que dizem que vocês Burundeses não são nada e expressam assim para nos gozar. Quando nós ouvimos isso, não nos preocupamos, porque sabemos que mesmo entre vocês, Moçambicanos, se desprezam. Os que vieram do norte são chamados xingondos. Quanto eu estava em Nampula as pessoas da cidade desprezavam os que vinham dos distritos, dizendo que vocês de Mogovolas, de Angoche, não são nada.”
(continua)

Eles e nós: representações sociais num bairro de Maputo (1)

Representações sociais são sempre fenómenos merecedores de atenção. Como é que alguns de nós, Moçambicanos, constróem os estrangeiros? E como é que estes nos constróem? Numa curta série – percutida pelo fenómeno do bicho-papão-nigeriano -, vou deixar aqui pequenos extractos de entrevistas feitas num bairro da periferia da cidade de Maputo por um dos meus assistentes. Começarei pelos estrangeiros, tarefa sempre muito difícil, pois regra geral recusam falar, dizendo que não querem problemas.
(continua)

Informe de Guebuza e ausência da Renamo

O presidente da República, Armando Guebuza, fez hoje na Assembleia da República o último informe do seu mandato sobre o estado da nação.
Os deputados do partido Renamo, na oposição, não estiveram presentes.
Como estudante do social, compreendo a posição do partido enquanto momento de luta política.
Como cidadão, condeno-a.

Dos contadores ao espancamento

Suposto ter furtado dez contadores de água, foi espancado até perder os sentidos na Matola. Confira aqui.
Comentário: banalmente, pessoas supostas ser ladras ou violadoras sexuais vão sendo espancadas ou linchadas, num exercício sistemático de justiça privatizada como este diário tem abundantemente mostrado.

21 junho 2009

Informe e cidadãos

Hoje, nos noticiários das 12:30 e das 19:30, a Rádio Moçambique informou que amanhã o presidente Guebuza fará na Assembleia da República o último informe ao país do actual mandato, assinalando que ele iria dar conta dos feitos em cinco anos de governação. O informe foi acompanhado de uma inquirição a cinco cidadãos sobre o que eles gostariam de ouvir do presidente. Corrupção, pobreza e criminalidade são os três males que os cidadãos ouvidos gostariam que fossem efectivamente combatidos.

O papão "nigeriano" que deixa vermes nas mulheres em Maputo (16)

Lenda urbana, boato ou rumor é "um relato anónimo, breve, com múltiplas variantes, de conteúdo surpreendente, contado como verdadeiro e recente num meio social do qual exprime de maneira simbólica os medos e as aspirações" (in Renard, Jean-Bruno, Rumeurs et légendes urbaines. Paris: PUF, 2006, 3.e éd., p. 6).
Talvez agora tenha mesmo chegado a altura de terminar esta
série, após ter decidido prossegui-la um pouco mais (veja o penúltimo número logo abaixo).
Durante vários dias, procurei sugerir-vos que o rumor do bicho-papão-nigeriano - que creio estar agora atenuado - era um envelope para exprimir vários problemas sociais, era um fusível social, era uma linguagem errada que traduzia, porém, um agregado de problemas verdadeiros, de problemas sentidos pelas pessoas.
A esse envelope foi dada uma cara que parece real, uma cara que até sugere estar doente. A esse propósito, um leitor escreveu o seguinte em comentário: "Vi as fotos da doença que o dito Nigeriano, outras vezes Somali, transmite.
Condilomas, verrugas ou coisa similar. Simplesmente estão num estado bastante desenvolvido. Não precisa ser Nigeriano ou Somali para tê-las e transmiti-las."
O rumor em causa não proliferou em meio rural, parece ser iminentemente urbano, gerando uma rápida difusão pelos mais variados meios de comunicação numa cidade - a de Maputo - inquieta, em especial femininamente inquieta, fazendo coabitar em tensão um passado que sempre se supõe mais seguro e um futuro de contornos inquietantes, uma tradicionalidade que se re-anseia e uma modernidade definitivamente instalada com seus riscos, com os seus medos e com as suas aspirações.

Adenda: tenho a suspeita de que este trabalho estraga os desejos de alguns de verem o rumor transformado em realidade. Afinal o que parece...devia ser, não é? Eis o comentário de um anónimo (ou de uma anónima) hoje deixado num dos números da série: "meu deus me espanta como vocês comentadores tem a audácia de dizer que este caso é mentira pois então me explique o caso da miúda que foi vítima será que já viram o estado do seu órgão genital? é que se tivessem visto nada disso falariam. seria inacreditavel na América, Europa, Ásia, mas tamos em África e com a quantidade de curandeiros que temos aqui, sinceramente outros falam como se fossem doutro continente e n conhecessem as maravilhas e n maravilhas do seu. vocês me metem nojo."
(fim)

O papão "nigeriano" que deixa vermes nas mulheres em Maputo (15)

Lenda urbana, boato ou rumor é "um relato anónimo, breve, com múltiplas variantes, de conteúdo surpreendente, contado como verdadeiro e recente num meio social do qual exprime de maneira simbólica os medos e as aspirações" (in Renard, Jean-Bruno, Rumeurs et légendes urbaines. Paris: PUF, 2006, 3.e éd., p. 6).
Estive a reler a série com o título em epígrafe e achei que faltava algo, que era necessário considerar mais um fenómeno, a saber:
O rumor do bicho-papão-nigeriano que espalha vermes comedores de fígado pelos órgãos sexuais das mulheres vítimas, aparece embutido numa viatura de luxo, negra, certamente com os vidros fumados, numa imagem que lembra muito, como já referi, o quadro presente no imaginário social no tocante ao tatá papá tatá mamã.
Esse fabuloso carro cujas características exactas ninguém conhece - mas que muitos de nós afirmarão conhecer -, é, afinal, em mais uma hipótese, uma alegoria para expressar o estatuto sinuoso, ambíguo, dos poderosos, para exprimir todos aqueles que constróem a sua riqueza com a desgraça dos pobres. A sua natureza de estrangeiro é exemplar pelo facto de remeter simbolicamente para o exterior a corrosão do tecido social interno. O rumor do bicho-papão-nigeriano é um indicador de desigualdades sociais. Os vermes que é suposto ele espalhar são os arautos da desgraça social.
E prontos, aqui fica o acréscimo, no próximo número, recoloco o trabalho com o qual tinha finalizado a série. Mas com um acréscimo, aguardem.
(continua)

O que é democracia? (5)


Vamos lá a um pouco mais desta série, sempre com um cartoon perverso.
A nossa história, a história do nosso país - a história, afinal, de todos os países -, está cheia de fases intolerantes.
Nessas fases, sucessivas gerações têm sido educadas em formas autoritárias de pensar a sociedade e a ordem, em formas voltadas para a arbitrariedade e para o segredo, em formas de respeito absoluto pelo poder, pela tradição e pelo sagrado, em formas de medo, ordem e comando permanentes, em formas de punição a cargo de vivos e mortos em caso de desobediência, em formas, enfim, de violências múltiplas, físicas e simbólicas. Essas formas têem-se instalado em nós como aguilhões, que agem sem necessidade dos seus agentes (o impulso é a ordem dada; o aguilhão é o efeito da ordem guardado no inconsciente do dominado)
Mas não poucas vezes fazemos um grande esforço para mostrar que, afinal, temos democracia, uma vez que temos eleições multipartidárias. Por outras palavras: democracia é suposta equivaler (e, para muitos, a resumir-se) a eleições.
(continua)