21 fevereiro 2008

Custódio Duma associa 5 de Fevereiro e linchamentos


Já defendi, a vários níveis (incluindo a televisão), a tese da intersecção da geografia da revolta popular de 5 de Fevereiro com a dos linchamentos (linchamentos que darão origem a um livro, por mim coordenado, nos próximos tempos). Sei que isso causou alguma surpresa. Ainda bem. O novo sempre surpreende. Surpreende mesmo os condenadores - quantos deles farisaicos - do comportamento violento em si, condenadores que fazem deliberadamente evaporar as condições sociais violentas que geram a violência popular. Altura haverá em que irei desenvolver melhor isso. Por enquanto, o jurista Custódio Duma, da Liga dos Direitos Humanos (na foto), agarrou esse intersecção e escreveu um trabalho do qual reproduzo aqui algumas passagens: "A revolta popular do dia 5 de Fevereiro, teve como causa o elevadíssimo custo de vida e a ausência de serviços públicos para satisfazer as necessidades básicas dos cidadãos. A imagem que nos é mostrada é de um povo que para além de ser explorado é punido com a falta do básico que necessita para sobreviver. Enquanto isso, os criminosos andam à solta e saqueiam o pouco que as pessoas têm sob o olhar tímido das autoridades. As próprias autoridades, sempre que podem, dedicam-se a saquear o cidadão, principalmente os que se encontram nas estradas, como fiscais e polícias. Os professores e enfermeiros, bem como os outros funcionários públicos que no seu dia a dia deviam dedicar-se ao cidadão, simplesmente o saqueiam. (...) Não vejo o fenómeno dos linchamentos e o da revolta social como problemas isolados. São sim problemas com motivações na mesma causa e visam o mesmo fim. (...) O alto custo de vida e a ausência de políticas públicas retiram por inteiro todas as oportunidades que os cidadãos teriam de se realizar como pessoas. Retiram dos cidadãos o sonho de ter sucesso por vias lícitas. A falta de oportunidades está na origem dos vários crimes diariamente cometidos aos nossos olhos. (...) Procura-se vender uma imagem perfeita de Moçambique à custa do sangue e sacrifício das pessoas. Isso é que causa revolta nas pessoas. Procura-se esconder a verdadeira realidade deste país para manter os favores das instituições de Bretton Woods em benefício de alguns. Isso é que causa revoltas ao cidadão. (...) Todos os povos tem o direito de revolta ao governo que se mostre tirano, mesmo que essa revolta ou manifestação seja considerada ilegal. Ao mesmo será legitimada com a sua finalidade de garantir os direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos e as respectivas garantias. Não se engana ao povo, mesmo que este seja maioritariamente analfabeto. Não se mente ao povo, mesmo que este não entenda de políticas e estratégias. Pode adiar-se uma situação mas não será sempre assim. Para bom entendedor, os linchamentos e as manifestações já são um prenúncio de uma mudança de atitude na mentalidade do povo que é açoitado pelo altíssimo custo de vida."
Nota: obrigado ao Custódio por me ter dado a conhecer o texto esta manhã.

2 comentários:

Unknown disse...

Querido Prof. eu é que lhe fico grato pelo grande interesse que tem noassunto e pela publicação do texto.
Espero que o seu estudo seja muito bem sucedido e que embora não seja pesquisador social, estarei a sua disposição no que for possível!!!
Muita força.

Carlos Serra disse...

Obrigado. A si recorrerei na altura devida. aliás, vou escrever-lhe um email.