17 fevereiro 2008

Pelo amor de Deus, párem de ajudar África!

James Shikwati (na foto) é um economista queniano que pensa de forma diferente o assistencialismo ao continente africano. A entrevista que constitui o tema desta postagem data de 2005 (originalmente publicada pelo The Spiegel), mas o jornalista Lázaro Mabunda enviou-me gentilmente a referência com apelo ao debate e achei oportuno chamar a atenção para isso:
DS - Parar? Os países industrializados do Ocidente querem eliminar a fome e a pobreza.
Shikwati - Essas intenções estão prejudicando nosso continente nos últimos 40 anos. Se os países industrializados realmente querem ajudar os africanos, deveriam finalmente cancelar essa terrível ajuda. Os países que receberam mais ajuda ao desenvolvimento também são os que estão em pior situação. Apesar dos bilhões que foram despejados na África, o continente continua pobre.
DS - O senhor tem uma explicação para esse paradoxo?
Shikwati - Burocracias enormes são financiadas (com o dinheiro da ajuda), a corrupção e a complacência são promovidas, os africanos aprendem a ser mendigos, e não independentes. Além disso, a ajuda ao desenvolvimento enfraquece os mercados locais em toda parte e mina o espírito empreendedor de que tanto precisamos. Por mais absurdo que possa parecer, a ajuda ao desenvolvimento é uma das causas dos problemas da África. Se o Ocidente cancelasse esses pagamentos, os africanos comuns nem sequer perceberiam. Somente os funcionários públicos seriam duramente atingidos. E é por isso que eles afirmam que o mundo pararia de girar sem essa ajuda ao desenvolvimento.
DS - Mesmo em um país como o Quênia pessoas morrem de fome todos os anos. Alguém precisa ajudá-las.
Shikwati - Mas são os próprios quenianos quem deveria ajudar essas pessoas. Quando há uma seca em uma região do Quênia, nossos políticos corruptos imediatamente pedem mais ajuda. O pedido chega ao Programa Mundial de Alimentação da ONU --que é uma agência maciça de "apparatchiks" que estão na situação absurda de, por um lado, dedicar-se à luta contra a fome, e por outro enfrentar o desemprego onde a fome é eliminada. É muito natural que eles aceitem de bom grado o pedido de mais ajuda. E não é raro que peçam um pouco mais de dinheiro do que o governo africano solicitou originalmente. Então eles enviam esse pedido a seu quartel-general, e em pouco tempo milhares de toneladas de milho são embarcadas para a África... "

11 comentários:

Anónimo disse...

Já diziam os chineses...se não tou a meter água:
Não dar o peixe ,ensinar sim, a pescar!

AGRY disse...

A propósito justamente do autor referido nesta postagem, julgo ser interessante consultar o link, que indicarei, porque tem a ver com a perspectiva do autor.Ei-lo:

http://forum.jogosonline.com.br/archive/index.php/t-21952.html

Para o visitante anterior. Há quem atribua a Mao Tsé Tung, essa célebre expressão. Penso que o correcto é falarmos de Confúcio
"não se deve dar o peixe ao pobre; deve-se,sim, ensiná-lo a pescar"

Anónimo disse...

...meti mesmo água!
Obrigado pela correção.

Eugénio Chimbutane disse...

Eu continuo batendo na mesma tecla. A ajuda ao desenvolvimento constitui uma externalidade positiva para a África. A intenção do ocidente, agora a China chega a ser boa.
Querem criar poder de compra para os seus produtos, numa situação em que atingiram um elevado grau de avanço tecnológico e a velocidade com que produzem não é correspondida pela velocidade com que os bens e equipamento são comprados nos seus países ou continentes.
O Ocidente está a procura de mercado em África e América Latina. E só poderá garantir mercado, se nos ajudar a sair da pobreza. Por isso acreditam que financiamento à saúde, educação, etc., ajuda na exportação da sua produção de bens, equipamento e serviços e aumenta a capacidade de geração de rendimentos por parte das famílias, o que impulsiona o surgimento na periferia de pequenas empresas também consumidoras dos seus equipamentos e insumos, para além de gerar novos empregos e renda para a população. Com este mecanismo, evitam crises económicas mundiais que poderão ser causadas pela superprodução nos seus países.
Portanto, essa é a crença do ocidente. Mas no terreno as coisas não acontecem como eles querem ou na velocidade desejada. Cada dólar que entra em África, apenas 25 cêntimos é que serve para financiar esse mecanismo. E os outros 75 cêntimos, desaparecem naqueles esquemas que todos nós conhecemos. E o ocidente vai se conformando dizendo, é melhor do que nada. E os dólares vão fluindo para África e América latina.
Para mim, temos que investir em medidas que garantem transparência na gestão desses financiamentos (que muitos aparecem sob forma de dívida externa). Como é que podemos garantir que, para cada dólar que entra, 95 cêntimos sejam aplicados para esses programas de desenvolvimento, que para além de garantir mercado (servindo de tubo de escape, para avanço tecnológico no ocidente e China), contribuiria para um desenvolvimento um bocadinho mais acelerado da periferia? E porquê os patrões (ocidente) ficam indiferentes à essa fraca aplicação dos fundos colocados a nossa disposição? Não estarão a dar pela mão direita e retirando pela mão esquerda? Acho que os que abocanham 75 Cêntimos, para cada dólar que entre podem ter suas contrapartes, no ocidente.

João Feijó disse...

Boa tarde professor. Acabei de lhe enviar um e-mail. Não sei se o recebeu. Um abraço, João

Carlos Serra disse...

Acabo de reentrar, João. Esteja descansado, acabo de abrir o email e já lhe respondo lá...

Carlos Serra disse...

O Lázaro tem razão: é um tema que permite uma ampla discussão.

umBhalane disse...

Há muitos ângulos de uma mesma questão, muitas linhas de força, que no fim vão culminar numa principal.
Essa é que conta.
Estou em grande parte de acordo com Eugénio Chimbutane.

Se fizessemos a questão ao Povo e Governo de Cabo Verde, não tenho quaisquer dúvidas sobre a resposta.

Há casos e casos.

A ajuda, nuns lados resulta, noutros não.

E a culpa não será da ajuda.

Carlos Serra disse...

Este é um tema que permite horas de debate, com posições de força em muitos lados...E James Shikwati é corajoso. Tento imaginar as reacções se ele fosse moçambicano e aqui escrevesse ou dissesse o que escreveu.

Anónimo disse...

Em minha opinião tanto o James Shikwati como os que defendem posições contrarias podem ter efeitos positivos e negativos o que seria util a este debate seria a discusão de mecanismos sustentaveis de financiamento, isto é que impulsionassem o crescimento economico primeiro e depois quem sabe o desenvolvimento economico deixando sempre sinais de mudança nos Africanos comuns.

O Chimbutana andou um pouquinho a volta de possiveis causas já foi muito bom.

Minha sugestão:
Deveriamos questionar o seguinte: De que forma o financiamenþo do Ocidente e China pode impulsionar o crescimento e desenvolvimento economico sustentaveis nos paises do terceiro mundo.

Maxango

Eugénio Chimbutane disse...

Caros,
O assunto merece de facto horas de debate. E esse deve debate deve girar a volta de como garantir a aplicação dos fundos com um mínimo de transparência. Os que montam esquemas para desviar fundos, não sabem que se aplicassem esses fundos nos programas a que são alocados e com transparência, eles estariam muito mais ricos a logo prazo, do que o são ou serão se a máquina do desvio continuar.

Maxango, ai vai a resposta à sua pergunta: transparência! Para mim a intenção dos financiadores é sem dúvidas boa, apesar de tudo!