15 julho 2008

Os riscos do efeito borboleta social na África Austral (7) (fim)

As pessoas não são em si dinâmicas ou preguiçosas. Se elas produzem as condições sociais em que vivem e o imaginário que as organiza simbolicamente, não é menos verdade que são, ao mesmo tempo, produto dessas condições e desse imaginário, da formatação a que aí são sujeitas.
As formas pelas quais classificamos os outros dependem de muitos factores. Regra geral a classificação não é activa, não é agressiva.
O problema surge quando o Outro (o outsider) passa da condição de ser tolerado a ser não-tolerado. No caso aqui em análise e por hipótese, o prejuízo activo e negativo sobre o Outro tornou-se tão mais agudo quanto mais os sul-africanos dos bairros da lata sentiram e sentem que a sua vida não melhorou. E eis aqui o que julgo ser uma chave do problema: um protesto vertical de pobre contra um Estado visto como distante foi projectado horizontalmente sobre outros pobres, pobres estrangeiros.
A xenofobia consiste na projecção do Mal sobre um ser externo ou estrangeiro, sentido como perigoso ou incomodante. Em circunstâncias digamos que normais, os prejuízos e a etiquetagem sobre o Outro não atacam nem mutilam, são uma espécie de protceção identitária, uma auto-estima reconfortada. Porém, quando a presença do Outro se torna imponente, omnipresente – tenhamos em conta a imigração massiva zimbabweana, especialmente esta –, a etiquetagem pode tornar-se, como se tornou, activa e mutilante. Surgiu, então, o “racismo sem raça”. Os estrangeiros foram encarados como criminosos e ladrões de empregos locais. Uma imputação objetivamente falsa foi, porém, subjetivamente sentida como verdadeira. Finalmente, as causas da repulsa não devem ser mecanicamente atribuídas aos aspectos económicos. A privação é sempre multilateral. E sonhos podem ter e têm, também, força material.
A África do Sul está a deportar em massa os imigrantes zimbabweanos, numa medida destinada, certamente, a evitar o recrudescer da xenofobia. O nosso país recebeu mais de 40 mil compatriotas fugidos da violência. Em ambos casos, Zimbabwe e Moçambique receberam e recebem pessoas feridas, potencialmente geradoras de micro-climas sociais de insatisfação.
Tenho para mim que todos os países da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) devem colocar o Estado social na linha de frente, sob pena de um bater de asas social em Alexandra, na periferia de Joanesburgo, poder imediatamente repercutir em Maputo, em Harare ou em Dar es Salaam. E em muitos mais sítios.

1 comentário:

Xiluva/SARA disse...

Espero mesmo que os nossos governos saibam "descer às bases"...