Sonhadores, os sociólogos sempre procuraram duas coisas: as leis do social e a reforma das sociedades. Cá por mim busco bem pouco: tirar a casca dos fenómenos e tentar perceber a alma dos gomos sociais sem esquecer que o mais difícil é compreender a casca. Aqui encontrareis um pouco de tudo: sociologia (em especial uma sociologia de intervenção rápida), filosofia, dia-a-dia, profundidade, superficialidade, ironia, poesia, fragilidade, força, mito, desnudamento de mitos, emoção e razão.
26 novembro 2006
Sociologia da dominação (3)
"Quando falares fala falando sem falares para que te percebam. Quanto à consciência do teu falar, isso fica comigo" (salmo 11 do Livro da Maka Política, 3216 da nossa era)
O que significa dominar? Significa basicamente que sou capaz de conseguir que uma pessoa consciente e em pleno uso das suas faculdades mentais faça o que eu quero que ela faça.
Muitas são as razões que podem levar essa pessoa a deixar-se dominar e muitas, também, as formas de dominação. Sobre isso não me vou debruçar.
A dominação consiste na substituição da vontade de outrem pela minha vontade. Outrem pode barafustar, como Calibão diante de Próspero na Tempestade de Shakespeare, mas obedece.
A mecânica da dominação tem duas componentes: o impulso e o aguilhão. O impulso é a ordem dada; o aguilhão é o efeito da ordem guardado no inconsciente do dominado.
O dominador nasce quando a sua ordem é obedecida (impulso); o dominado nasce quando a ordem já é dispensável e ele se limita a obedecer (aguilhão): bastam insígnias, uniformes, títulos, etc., para fazerem o aguilhão actuar. A dominação está interiorizada, a obediência ganhou vida própria, o quadro de referência do dominado passou a ser o do dominador.
Se os dominadores constroem os dominados, os dominados reproduzem os dominadores.
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Sempre espero os vossos comentários, caros leitores. E reitero: em qualquer altura posso alterar o que aqui vou escrevendo, especialmente tendo em conta esses vossos comentários. O que escrevo apenas tem uma virtude: a de ser um produto defeituoso e sempre inacabado. Por isso vários dos vossos comentários têm-me levado (e continuarão a levar) a mudar o que escrevo.
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2 comentários:
A linearidade da sua ideia assuta-me um bocado, Professor. Essa ideia que dominacao se cinge a que o meu desejo seja obedecido nao permite ver dimensoes de negociacoes nem sempre evidentes, mas muitas vezes potentes.
Como mulher, o que me fascina e como a sociedade, mesmo alegando que somos o sexo fraco, frequentemente se referem a nos como as 'megeras manipuladoras' que conseguem sempre o que querem. E nem sempre isto se refere as classicas mulheres dominadoras.
Vejo a dominacao de facto como uma questao de negociacao e exercicio de poder. Mas creio que a dominacao efectiva nao passa simplesmente por conseguir o que quero, mas conseguir sistematicamente o que quero e sem muito esforco...
Eu iria mais longe, dizendo que se a dominacao e conquistada na base da forca, esta-se de facto perante uma dominacao mutua, em que ambas partes mantem a tensao da negociacao da obedicencia num limiar de permanente possibilidade de desobediencia.
A verdadeira dominacao seria entao aquela em que o dominador nao tivesse sequer que exercer o seu poder... o que Foucault chama de 'governamentalidade'.
Mas entao onde se traca o limite do que eu quero e do que o outro quer? Se alguem me disser que eu nao deveria querer isto que digo que quero, nao estara tambem a tentar dominar-me? E nesse caso nao passarei de quintal em quintal, mas sempre com a coleira em volta do meu pescoco?
Onde inicia a verdadeira individualidade e termina a individualidade associada a minha estrutura socio-cultural?
E... se sou um ser social posso eu ser (querer ser) um ser verdadeiramente individual nos meus desejos e quereres?
Tem razão.Veremos a continuidade do texto.
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