Da antropóloga moçambicana Carmeliza recebi um texto merecedor de reflexão, a saber: "Nos últimos dias tenho lido e ouvido sobre levantamentos populares onde membros da comunidade queimam casas ou agridem membros da comunidade por diversas razões. Em Nicoadala foi por causa da falta de chuvas. Em Cabo Delgado está ligado à cólera. Aqui foram atacados trabalhadores da saúde e morto um médico tradicional. Pergunto-me se outras frustrações se estarão a representar nesta forma de reagir violenta. Aqui pouco ou nada tem a ver a incapacidade do Estado deproteger o cidadão. No caso das chuvas recorre-se à acusação de feitiçaria para explicar as mudanças climáticas. A obra de Michael Taussing é bastante ilustrativa dos mecanismos de acusação de feitiçaria na explicação da realidade em mutação. No caso da cólera, parece-me uma desconfiança das intenções do Estado. A reacção é similar. O resultado é devastador. Dá que pensar."
Comentário: Obrigado, Carmeliza. Agora que estou em Maputo, prosseguirei normalmente a série com o título Ionge: populares acusam autoridades de prender a chuva no céu.
8 comentários:
Citações da postagem da Carmeliza:
1. "Aqui pouco ou nada tem a ver a incapacidade do Estado de proteger o cidadão."
--> Acha mesmo Carmeliza? Sabe bem que a cólera é uma doença que resulta fundamentalmente da falta de saneamento do meio. A quem compete criar as infra-estruturas de base para uma vida sã de todos os cidadãos? Obviamente, ao Estado!
2. "No caso da cólera, parece-me uma desconfiança das intenções do Estado".
--> Ao que parece, através de trabalhadores da saúde, o Estado, depois de desencadeado o surto, veio com soluções paliativas, de tratamento dos poços com cloro.
Continuando a verificar-se casos de cólera depois do tratamento dos poços... alguns elementos da população associaram (cloro = cólera).
Efectivamente, parece terem desconfiado das intenções do Estado e, lamentavelmente, entenderam punir os seus agentes: desconfiança + impaciência perante a incapacidade de resolução do problema + ignorância.
--> Saúde, Educação, Justiça, são responsabilidades do Estado.
Para que as possa executar com sucesso, são necessárias políticas económicas realistas, que, progressivamente nos libertem da incómoda situação de permanente "mão estendida" á comunidade internacional.
O Estado/ governantes, têm de concentrar esforços e recursos no fundamental: na melhoria das condições de bem-estar de todos, incluindo a grande maioria da população ... menos de 50% tem acesso a água potável...
AM
Não só AM,há de facto muitas hipóteses a serem criadas com relação a cólera:
1- quem une e organiza o povo? Governo!
2-Onde é que este (governo) está na altura em que o povo afixa residência em zonas propensas a cheias? Certamente não importa prever isso porque é uma forma de estender a mão aos doadores depois! acredito que mesmo essa de andar a cuidar das fontes de àgua é um projecto com muito dólar em jogo.
Permita-me exemplificar, a Lixeira de Hulene existe a muito tempo. sim, e quando o povo foi oucupar aquele espaço o que é o governo fez? patavina! hoje é um projecto para sua transfência, quando? não se sabe!
Mais, na Matola há várias lixeiras (Obra do conselho Municipal) para além do parque industrial altamente poluidora nem o governo central muito menos o governo local já que se fala de descentralização, não resolvem este problema mais dias menos dias vam aparecer com projecto de corrigir oque podiam ter evitado! oqui julga que o povo vai fazer? agradecer? não se percebe a razão de se parcelar uma zona que ao mesmo tempo querem usar como lixeira ou montar uma fábrica poluente do meio no mesmo bairro!
Para mim o governo é responsável sim de uma ou de outra maneira.
Quanto a chuva, é um assunto que carece de um estudo mais aprofundado porque está adicionado ao modo de viver de uma certa comunidade e a educação só pode ter efeito desejado conhecendo bem alógica das coisas nesta sociedade.
abraços
Anónimo disse...
Citações da postagem da Carmeliza:
"... A quem compete criar as infra-estruturas de base para uma vida sã de todos os cidadãos? Obviamente, ao Estado!"
Analisando este extracto, sugiro um ponto para reflexão: Afinal de contas,Quem é o Estado?
Que eu saiba sobre os seus componentes é a comunidade, o território e o poder politico, por conseguinte, vamos lá especular um pouco sobre o que esta comunidade - população - tem feito para o seu próprio beneficio, estou a falar concretamente daquela gente que, mesmo sabendo que que está em zona propensa quer a cheias ou outro tipo de calamidades ou pandemias (o caso da cólera). Se esta população é um fragmento do Estado, tem também algum papel na prossecução do interesse publico. Então, vamos trabalhar!!! Nota: A primeira economia a nivel mundial tem as suas estrututas assentes na propriedade privada.
Bom trabalho!
o Jornal DN ( Diario de noticia) Online publicou no dia 23 de fevereiro um artigo com o titulo "DEVIDO A MÁ PERCEPÇÃO FONÉTICA EM CABO DELGADO Mortes, violência e destruição" e mais para dentro encontrei o que de seguida vou citar
-"Ernesto Issa, comandante distrital da polícia em Montepuez, diz que durante as investigações os envolvidos disseram que agiram de forma violenta por terem tomado conhecimento de que os agentes de Saúde estavam a distribuir “cólera” para purificar a água,quando na verdade era cloro."
Foquiço, não basta a vontade de um filho ser educado é necessário e indispensável a existência de um mediador dessa mesma educação. É assim como as coisas funcionam mano, estamos a dizer que o governo é que determina o tipo de sociedade que deseja ou não é assim no Estado que se refere na sua postagem!!! Eu já estou cansado desses discursos de empreendedorismo, patriotismo que no fundo niguém o é sem políticas favoráveis.
Estamos a dar exemplo do Conselho municipal da Matola que parcelou e distribuiu terrenos em Malhampswene meia volta usa um sítio no meio do Bairro para deitar lixo o que acha que deve fazer a comunidade perante o poder político armado pronto para matar quem quer que seja que revindica um direito?
Abraços desculpe se não fui cauteloso à sensibilidades.
Caro Foquiço,
> Obviamente que não nos podemos deitar à sombra de uma qualquer árvore esperando que o Criador ou o Estado nos brinde com Maná.
> Referi-me à responsabilidade do Estado/Governo na criação das “Infra-estruturas de base”, aquelas que potenciam o desenvolvimento: (i) acessibilidades; (ii) abastecimento de água potável; (iii) drenagem; (iv) energia eléctrica urbana e rural; (v) saúde; (vi) educação, etc., etc.
No fundo, aquilo a que temos direito como suporte para as nossas actividades – e os governantes devem priorizar – quando utilizam os nossos impostos e os apoios da comunidade internacional.
> Naturalmente que a sociedade civil, através de múltiplas formas de organização tem um papel de relevo na “facilitação” da concretização das políticas governamentais, mas não pode, nem deve substituir-se no que compete ao Estado, desresponsabilizando-o.
> Entendo que precisamos de caminhar para uma cultura de maior exigência, de responsabilização de quem nos governa, de quem tem a obrigação de fazer o bom uso dos parcos recursos que temos.
Não podemos cultivar atitudes dóceis, de conformismo,servilismo: do permanente, sim senhor, excelência!
> As excelências que temos, os nossos ministros e afins, são exigentes: batem-se por casas e carros de luxo (á altura do estatuto); reformas confortáveis, etc.:
Sigamos-lhes o exemplo – exigindo contrapartidas equilibradas.
Sim, meu caro Foquiço,
> A 1ª economia mundial TINHA as suas estruturas assentes na propriedade privada, num mercado aberto, pouco regulamentado. MAS, meu caro: deu no que deu! Se não fosse o Estado a acudir com milhões de milhões de dólares (biliões de 12 zeros), que os contribuintes hão-de pagar, onde estaria a Banca Privada, a Industria Automóvel, as Seguradoras, o Emprego, as Grandes, Médias, Pequenas e Micro empresas dos diferentes ramos de actividade e serviços? Na falência!
> Para sair da crise, a 1ª economia do mundo, os EUA (e a UE também), enveredaram por grandes programas de Investimento Público, modernizar o país (porque nesta fase só o Estado tem liquidez,ou poderes para a criar, e/ou credibilidade para se endividar): vão fazer escolas, hospitais, estradas, modernizar o aparelho de Estado, etc., para assegurarem um certo nível de emprego e, consequentemente, mais poder de compra e consumo (...garantir clientes para o que produzem as grandes, médias, pequenas e micro empresas que, doutro modo, desapareceriam com todos os problemas sociais inerentes).
> Infelizmente, os resultados da ligeireza do Estado no controlo da economia, com relevância para a 1ª economia mundial, onde tudo começou ... já nos batem à porta.
Um abraço,
AM
Kimmanel: há muitos anos que conheço essa "tese". Obrigado.
Entao sendo conhecida essa tese e os problmas vao persistindo sou da opiniao que o mesmo produto seja distribuido com uma certa marca de identidde mas conhecido no sistema da saude,poisas consequencias sao elvadas
Enviar um comentário