No "Notícias" de hoje: "Os confrontos que resultam da falta de chuvas em algumas regiões costeiras da província da Zambézia, nomeadamente Quelimane, Nicoadala e Namacurra já produziram três mortos, doze feridos, cinco dos quais agentes da corporação policial e um elevado número de desalojados que continuam ainda ao relento. As acusações de “amarrar chuva” em regiões como Quelimane, Maquival, Ionge, Namacata no distrito de Nicoadala e Macuse, Mixixine, Forquia, em Namacurra, não são novas, só que este ano a situação atingiu contornos criminais jamais vistos na história da província da Zambézia."
Comentário: prossegue na Zambézia, com efeitos cada vez mais dramáticos, a crença de que alguém amarra a chuva no céu. Eu queria propor aos nossos dirigentes do judiciário em Moçambique que tentassem ver este fenómeno bem para além do foro criminal. Peço, para isso, a especial atenção da ministra Benvinda Levi, do ministro José Pacheco e do procurador-geral da República Augusto Paulino. Podemos prender montes de instigadores da crença, mas não poderemos nunca prender a crença, crença que é antiga, bem antiga, e largamente partilhada a nível comunitário. Estamos perante uma crença objectivamente falsa, mas subjectivamente sentida como verdadeira. É vital saber quais as infra-estruturas sociais dessa crença. Essas infra-estruturas sociais são expressas através da crença na acção do que na Zambézia se chama okhwiri. Há tempos, o procurador Paulino levantou na Assembleia da República o problema da feitiçaria. Lembram-se? Pena eu não estar neste momento em Maputo. Bem, logo que puder prossigo neste diário a minha série com o título Ionge: populares acusam autoridades de prender a chuva no céu, a qual já começou a ser divulgada no semanário "Savana".
2 comentários:
Obviamente que métodos administrativos podem reduzir o fenómeno, mas não resolverão a questão de fundo: que passa por mais e mais instrução e melhoria dos níveis de bem estar.
A superstição /Crendice, representa a manutenção de um estado psíquico próprio da era pré-tecnológica,quando os seres humanos atribuíam aos elementos naturais,primeiro,e a divindades várias,depois,todo o poder e influência nos mais diversos aspectos da sua vida mundana:acasalamentos;colheitas;caça;mortes;estações do ano;nascimentos,para citar os mais significativos.
A superstição /crendice),surge precisamente da mundivisão característica do homem primitivo,na sua luta contra os aspectos negativos da sua vivência quotidiana,e da forma por si idealizada para os evitar ou para se sentir protegido em relação a azares vários.
Joana
1. Estou de acordo com a Joana.
2. Há muito que a antropologia e sociologia identificaram as causa do SUBDESENVOLVIMENTO = baixos níveis de instrução e de conhecimentos tecnológicos = baixa capacidade de produção = níveis baixos de renda = difícil acesso a factores de produção = conformismo /subjugação ao sobrenatural = subdesenvolvimento. Enfim, o bem conhecido “ciclo da pobreza”
3. As medidas administrativas “castram”, ou seja, podem impedir a reprodução, mas não eliminam a apetência para a sua prática ou instigação: isto é, na comunidade a crença prevalece enquanto o conhecimento não chegar. Responsáveis deste estado de coisas? o ESTADO !
4. MAS há um problema ADMINISTRATIVO que importa ver como resolver: o diário Notícias de hoje, refere que o cidadão Henrique Manuel, um jovem empreendedor que com o suor do seu rosto e inteligência montou seu próspero negócio, construiu casas cobertas a chapas de zinco para cada uma das suas duas esposas, viu as casas queimadas, a motorizada queimada, as mercadorias pilhadas.
5. PERGUNTA: Num Estado de Direito como o nosso, a quem compete garantir o cumprimento da Lei e garantir a ordem e segurança públicas? Este cidadão – bem como os familiares das vítimas mortais – devem ou não ser indemnizados pelo Estado pelos prejuízos sofridos?
O Ministério Público conhece os criminosos: (i) deve ou não actuar como instituição de um Estado de Direito, ou (ii) relegar estes assuntos para a justiça do “direito comunitário” uma espécie de “pequenos países” dentro do País.
Para a resolução de pequenos conflitos os órgãos comunitários são extremamente importantes nas sociedades rurais, mas não para crimes desta grandeza.
6. Tendemos a ser “tolerantes /marimbamo-nos” quando o mal bate à porta dos outros, como do Henrique Manuel. Confortamo-nos com o “Azar dos outros”.
Muito contribui para o nosso subdesenvolvimento a falta duma “cultura de exigência”, de responsabilização dos criminosos E DO Estado.
AM
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