23 novembro 2007

Joaquim Fumo - entrevista (3) (sobre os sociólogos) (continua)

Carlos Serra: o que significa ser sociólogo no nosso país hoje?
Joaquim Fumo: infelizmente, neste país ser sociólogo significa muitas coisas. Desde logo significa partilhar de um campo epistémico especializado e como tal partilharmos todos esta identidade. Por outro lado, significa uma atitude na vida, uma postura que é bastante marcada pelo campo simbólico binário das velhas e persistentes teorias da acção política: esquerda e direita.
De acordo com o nosso posicionamento no quadro binário, ser sociólogo assume um papel e uma identidade bastante diferente.
Os sociólogos de esquerda, com os quais perfilho a identidade, cumprem uma missão histórica, potencialmente subversiva. Aliás, é aí onde, no meu entender, reside a verdadeira sociologia: a subversão dos sentidos superficiais atribuídos à vida quotidiana. É verdade que está postura não é sempre fácil, porquanto se opõe a forças hercúleas, de ordem moral, política, religiosa, etc. Esta postura vincula moralmente o sociólogo à causa dos oprimidos. Infelizmente são poucos os sociólogos que assumem esta postura. Ser sociólogo de esquerda é ser sociólogo por vocação.
Por outro lado, existem os sociólogos de direita, que são os ideólogos do sistema, os que se preocupam com o status quo. São os lambe-botas do sistema. Sobre eles não preciso mais dissertar. São claros os prejuízos que trazem à imaginação sociológica e à dúvida radical.
Uma terceira categoria é a dos sociólogos mercenários. Esses são autênticos garimpeiros da sobrevivência.

14 comentários:

Patricio Langa disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Patricio Langa disse...

Sem comentários!

Patricio Langa disse...

Não resisto a tentação, pelo menos, para esclarecer algumas dúvidas.
Em que lugar do mundo ser sociólogo significa apenas uma coisa?
E porque é que a existência de diferentes concepções ( percepções) do que é ser sociólogo representa algo negativo? Porque é que em Moçambique tinha que ser diferente?
Sobre a "esquerda" e a "direita", não precisa esclarecer!

Aguiar disse...

Caro J. Fumo
Confesso haver lido este trecho de sua entrevista ontem, mas fiquei tao estupefacta que nao fui capaz de o comentar.

Mas, porque penso que um dos entraves ao desenvolvimento é, a nossa falta de pré-disponibilidade para o dialogo, e, porque penso, ainda, que, ser sociologo, no país, que é o seu, significa “partilhar de um campo epistémico especializado” que nasceu no contexto de profundas transformaçoes sociais na Europa do sec XIX. Por conseguinte, suponho que “a complexidade da realidade social africana é feita da relaçao ambígua que o continente tem com a modernidade (kane 1995) Esta ambiguidade contudo nao postula uma ciencia do social fundamentalmente diferente. Ela exige apenas maior sensibilidade na utilizaçao dos conceitos” (Macamo, 2001).

Acresce ao facto, que, ao expor as suas ideias num suporte fisico como a net, o J. Fumo, nao quer, obviamente, dirigir-se, exclusivamente aos moçambicanos. Por outro lado ha-de convir que, os demais internautas nao possuem a mesma sensibilidade na identificaçao dos conceitos.

Por isto, considerando que, ha cerca de duas décadas, a esquerda europeia, em nome da modernizaçao, nao cessa de transportar para os seus programas uma panoplia quase completa das politicas economicas e sociais da direita. Considerando ainda que um dos desafios que se colocam às “novas esquerdas” numa economia globalizada é o de assegurar a competitividade economica. Noutros termos, o desafio maior que se coloca às “novas esquerdas” é o de ganhar a “guerra economica” (aumentar o poder de compra dos ditos oprimidos, digamos). Assim nao se trata pois de “humanizar a sociedade” evitando-se a “guerra” mas sim, de “humanizar a guerra” inevitavel (compreendendo e manipulando os intrumentos economicos). Eu pedia-lhe, por favor, Caro J. Fumo, à luz das dinamicas de tranformaçoes sociais, globais e locais, nos nossos dias, que me esclarecesse, por favor, sobre a a sua concepçao de sociologo de esquerda e de sociologos de direita.

Assim, por exemplo, poderia esclarecer-me o “cumprem uma missão histórica, potencialmente subversiva”.? O que é um sociologo subversivo? Sera um sociologo revolucionario? E o que é um sociologo revolucionario? Sera que é um sociologo afeiçoado a revoluçoes politicas ou sera um grande renovador? O que é um sociologo renovador ? sera que é um reformador? Sera aquele que contibui a reformar o meio onde se insere? Se for o caso sera que tanto os seus sociologos de esquerda como os de direita e até mesmo aos que chama sociologos mercenarios nao contribuem todos a reformar o sistema? Assim sendo, nao serao todas as suas “tres categorias de sociologos” devotos as causas dos oprimidos? Ja agora porque é que a postura de “esquerda” é aquela que vincula moralmente o sociólogo à causa dos oprimidos? O que é um vinculo moral? A sociologia é uma ciencia moral, moralizante ou é uma tentativa de compreençao do social, sobre o social e um intrumento de intrervençao no social?

Porque serao os sociologos de direita enqto “ideólogos do sistema” percursores de “ prejuízos (...) à imaginação sociológica”? deixe-me contar-lhe uma peequena Historia Crozier é tido hoje como um dos grandes sociologos de referencia, mas no inicio de sua carreira foi conotado, como sociologo de direita. Por conseguinte, marginalizado e ostracisado. Crozier, nao se deixou intimidar, fechou-se sobre si mesmo, apenas pediu um laboratorio, e hooje a sua obra esta ai, venerada até, pelos ditos sociologos de esquerda. E mais nao digo. Por enqto.
Saudaçoes cordiais.

Patricio Langa disse...

Caro Aguiar.
Obrigado por teres conseguido exteriorizar estas questões.
Confesso, eu não sabia por onde começar a questionar de tão redutóra e pouco esclarecedora que é a classificação de Fumo. O Aguiar fê-lo bem. A primeira fraqueza desta classificação apressada de Fumo reside precisamente na falta de clareza dos termos que usa. Nem sequer os vou chamar de conceitos porque não são. Mesmo considerado no campo semântico da política, hoje em dia, não bastaria dizer “esquerda” e “direita”! Ficar por aí não passa de usar chavões sem ter noção da mudança de sentido ao qual as palavras estão sujeitas. Política e ideologicamente a esquerda e a direita, hoje, o que são efectivamente? O que as distingue? Nem preciso falar da 3ª via de Giddens como alternativa, uma tentativa de escapar a esses esquemas binários ultra redutores da realidade social. Penso que é por aí que Fumo devia ter começado até chegar a emprestar esse esquema classificatório a sociologia. Dos lugares previlêgiados para observar e dar conta da realidade nem preciso falar. É por isso que digo, e insito, há gente que anda a fazer politica ( activa e real) em nome da sociologia e depois acusam os outros de se esquivarem com o escudo da neutralidade axiologia ( mais uma interpretação errônea do que Weber queria se referir com “relação a valores”). Um último reparo. Para fazer um debate sério sobre este e outros assuntos penso que se devia optar por escrever textos em que o pensamento é a presentado de forma mais sistemática. De outra forma estaremos votados a jogos de suposições e advinhas em relação ao que se quer dizer. Esta maneira de fazer debate, enviado recados, não me parece a salutar para a própria sociólogia.

Xiluva/SARA disse...

Direita bíblica seus chavões e ainda o Senhor Langa com a sua sociologia de alguidar. O Evangelho de S.Marcos está precisando da vossa leitura.

Xiluva/SARA disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anónimo disse...

Aquele que enfaticamente proclama o anacronismo das noções de esquerda e direita "normalmente é da direita...
http://www.acessa.com/gramsci/?page=visualizar&id=432

Anónimo disse...

Sempre o marketing das novas figuras, mais baseado na afinidade ideológica do que no mérito. Esta parece ser uma das apostas de Carlos Serra.

Em todos os casos em que acciona a sua máquina de publicidade, notam-se nas tais novas figuras graves défices de argumentação, no mínimo.

Obed L. Khan

Xiluva/SARA disse...

Se a estupidez pagasse imposto vc estava todo carimbado.

Carlos Serra disse...

Desculpe, Sara, mas discordo em absoluto dos termos que usou. Sei bem do azedume que reina em certos comentários que entram neste diário, mas não posso aceitar os termos pelos quais se refere ao Sr. Obede. Abraço.

Anónimo disse...

Caros Sociólogos Patrício Langa e Aguiar


É com imensa satisfação que constanto que o excerto da minha entrevistra, quiça toda ela, gerou polémica ou controvérsia entre outros sociólogos que partilham de outros quadrantes hermenêuticos e/ou ideológicos.
A minha reflexão sobre o social assumiu sempre, o pressuposto do conflito de filosofia cujo motor é o desacordo, enquanto característica fundamental da interacção humana. Para Marx, quanto para mim, a contradição é a fonte e o conteúdo intrinseco de todo o desenvolvimento. Parafraseando a perspectiva weberiana não há uma sequência hermenêutica única e abrangente na História e toda a interpretação apontada para um determinado fenómeno será sempre uma entre múltiplas outras possíveis e igualmente acessíveis ao conhecimento científico (Cohen:1991)
Bem haja o desacordo!
Por conseguinte não me julgo iluminado muito menos dono da "verdade". Em boa fé não sei se ela existe. Acredito porém nos "fragmentos da verdade" que são acessíveis ao conhecimento científico através de um exercício hermenêutico. A sociologia é uma tentativa de compreensão.
No dia 23.11.07 pelas 15:20 Patrício Langa, pronunciando-se sobre a minha entrevista, pergunta-me se o pluralismo ideológico dos sociólogos - que faço alusão no texto- é negativo.
A minha resposta é dupla: sim e não. Não, porque ele alimenta o conflito hermenêutico bastante salutar nas ciências sociais. Sim porque as ciências sociais, tradicionalmente, assumiram um referencial de esquerda e como tal posicionaram-se na praxis política ao lado dos oprimidos. Como afirma Giddens "ninguém sociologicamente sofisticado pode ignorar as desigualdades existentes actualmente no mundo moderno, a falta de justiça social em muitas situações e as privações por que passam milhões de pessoas. Seria de estranhar que os sociólogos não tomassem partido em questões concreta, e seria ilógico, além de impraticável, impedí-los de se valerem da sua perícia sociológica para fazê-lo" (Guiddens:2000)
Aparentemente na observação de patrício, a ideia de pluralismo ideológico tem uma forte conotação normativa. Seja o que for que ela designe, é com certeza, algo positivo porque pluralista ou pelo menos é melhor do que aquilo que lhe for contraposto como não sendo pluralista.De acordo Com Sousa Santos " não há nada de intrinsecamente bom, progressista ou emancipatório no pluralismo". existem pluralismo (como é o caso do pluralismo jurídico da Àfrica do Sul no tempo do apartheid)bem reaccionário (Santos:2003)
No dia 24.11.07, na boleia da Aguiar, Langa imputa a minha análise um certo reducionismo confinado aos conceitos binários do cosmo político.
Os binarismos ou as dicotomias do ponto de vista analítico são um bom ponto de partida, porém não de chegada.
Naturalmente que do ponto de vista da praxis científica não fico indiferente à epistemologia do complexo e do hibridismo emblematicamente defendida pelo Dr. Serra no seu livro Conflito e Mestiçagem (Serra:2000)
A queda do murro de Berlim, em 1989, marcou uma nova página na História Universal. A emergência do capitalismo como modelo económico e global, por um lado,e a expansão da democracia liberal como forma de organização política dos Estados nacionais, por outro, veio sem dúvida, conferir novos sentidos às tradicionais disjunções entre a esquerda e a direita e desencadear novas configurações de luta política (Harnecker:2001)
Por último, referir-me que fica para breve a publicação do minha obra que esclarecerá, detalhadamente os meus posicionamentos quanto ao poapel do sociólogo.
No dia 24.11.07, Aguiar afirma em tom celebratório ao neoliberalismo, consubstanciando o "fim da história" (Fukuyama:1992)que, "há cerca de duas décadas, a esquerda europeia, em nome da modernização, não cessa de transportar para os seus programas uma panóplia quase completa das políticas económicas e sociais da direito"
O consenso de Washington é assumido pela esta última, como estando em perfeito equilíbrio.
Para refrescar a sua memória vou lembrar-lhe alguns acontecimentos históricos que abalam o neoliberalismo económico contestanto a sua legitimidade

1996 - Numerosos cronistas insistiram em assistir ao primeiro Encontro Intercontinetal pela Humanidade e Contra o Neoliberalismo, nas montanhas do méxico reuniram-se mais de 3000 pessoas

1997 - Europa- Ganharam impulso visibilidade as primeiras experiências de coordenação em escala continetal dos movimentos de desempregados por consequência das políticas da globalização neoliberal aprofundadas pelo acordo de Maastrich

1999- a Batalha de Seattle - 50 mil pessoas marcharam pelas ruas de Seattle fazendo fracassar a abertura da reunião da OMC e estimularam a eclosão de protestos dos representantes dos países do 3º mundo bem cmo crispação entre EUA e UE nas questoes comerciais

2001,2002,2003 Porto Alegre, Brasil - Fórúm Social e Mundial
Converg~encia de mais de 50 mil contestatários ao neo-liberalismo e proposta de um mundo alternativo.

etc.

TRata-se de lutas políticas não só Reformatórias mas também que procuram aprofundar a ilegitimidade do sistema neoliberal como um todo.

Relativamente á pergunta sobre a diferença entre o sociólogo de esquerda e de direita penso estar respondida. E as suas contribuições na reforma do sistema decorre da consequências óbvias da sua (in)accção.
Relativamente à sua última questão do que é um sociólogo "subversivo" responderia com outra pergunta: o que é um sociólogo sem "subversão"?

Um abraço a todos e bem haja o debate!

JF

Anónimo disse...

Oi Professor, não se preocupe comigo. Lido com as "Saras" com a serenidade que costumo notar em si.

Obed L. Khan

Aguiar disse...

Caro J. Fumo
Antes de mais gostaria de agradecer-lhe pela sua pronta resposta.

Entretanto, gostaria apenas que me explicasse a amalgama que faz, Caro J.Fumo, entre eloge do consensus de whasington e o eloge ao neoliberalismo, consubstanciando o "fim da história" (Fukuyama:1992)” atribuindo-me essas afirmaçoes. Entretanto informo-o que em parte alguma do texto do dia 24 de Novembro de 2007 a Aguiar, fez tal eloge. No dia em que quiser fazer faço-o. Se necessario for.

Ao aborda-lo à luz das dinamicas de transformaçoes sociais globais e locais, pensei na “modernizaçoa da democracia social” ou na 3ª via de Giddens e na ultima obra de BHL. Este ultimo filosofo, militante do partido socialista francês, fez campanha por Segolene Royal e foi dos poucos a rejeitar o convite de Sarkozy para intregrar um governo de direita.

As transformaçoes sociais estao aí,elas nao param, e por isto parafrazeando Giddens ninguém pode ignorar as desigualdades existentes actualmente no mundo moderno.Contudo, às desigualdades tradicionais, vieram juntar-se aquelas impostas pelas dinamicas economicas mundiais. Noutros termos as desigualdades tradicionais nao desapareceram das sociedades locais. Bem ao contrario, a circulaçao de ideias, bens e serviços vieram accentua-las.

O tempo nao é mais aquele em que a esquerda deveria contentar-se de ser a porta voz dos oprimidos num mundo injusto. Hoje a esquerda, esta a tentar redefenir ou deveria redefenir o que é uma sociedade justa. E para isto é necessario compreendê-la, quer queiramos quer nao tudo se joga no campo economico. O campo economico ele mesmo em mutaçao. Por isto “humanizar a guerra inevitavel” é nao mais do que compreender que a logica economica faz parte da reproduçao social.

Em minha opiniao, modesta seja ela, nao podemos desenvolver o social menosprezando a economia, como a esquerda tende a praticar, sempre que julga, poder desenvolver politicas sociais, negligenciando as condiçoes do seu finaciamento. Nao podemos desenvolver o social apenas fazendo eloge do economico, como a direita, insiste em pregar, porque a direita, pensa que, qdo a economia vai bem, tudo vai bem.
Deveriamos sim pensar “o social na econmia, i.é politicas sociais, que contribuam ao crescimento economico” (DSK, 2007) .

Penso, ainda, que o nosso futuro, depende da valorisaçao do capital humano. A protecçao contra os efeitos indesejaveis da mundializaçao passam por uma economia mais eficaz, onde os novos esquemas de organizaçoa social aí inseridos protejam o proprio cidadão. Para mim, neste momento, tentar compreender estes novos jogos esta acima do poscionamento antagonico esquerda/ direita. Pois trata-se de compreender para melhor agir.

Agora, Caro J. Fumo se isto é ser neoliberal Fkuiamista e defensora do consenso de Washington, entao, pergunto-me, se o Caro Amigo quer, de facto, dialogar, ou se quer apenas fazer o marketing do seu livro?

Desculpe-me Caro Fumo, com todo o respeito, tenho mtas dificuldades em acreditar que o Amigo nao comprenda os jogos do social no economico. Aceito que nao esteja de acordo com o caracter normativo destes novos jogos... até ai tudo bem, nao tem mal algum. Agora, é isto condiçoa suficiente para me imputar as afirmaçoes supracitadas? Noa creio.

Queira aceitar, Caro J. Fumo, as minhas saudaçoes cordiais.