"O capitalista, ao transformar o dinheiro em mercadorias que servem de elementos materiais de um novo produto, incorporando-lhes em seguida a força de trabalho vivo, transforma o valor - do trabalho anterior, morto, tornado coisa - em capital, em valor engrossado de valor, monstro animado que se põe a trabalhar como se tivesse o diabo no corpo" (Karl Marx em "O Capital")
Enquanto o semanário "O País" tem hoje como uma das suas manchetes os dados da Transparency International (baseados nas percepções de empresários e analistas locais) que nos colocam Moçambique entre "os mais corruptos do mundo" (obtivemos o 111.º lugar numa lista de 179) (p. 6), o suplemento "Economia e Negócios" do "Notícias" dedicou as suas centrais, com um gigantesco título garrafal e vermelho, à notícia de que o país subiu seis lugares no ranking "Doing Business 2008" do Banco Mundial (BM) (passámos do 140º lugar para o 134.º, com dados até Junho de 2007).
O "Notícias" mostra-se muito safisfeito, o empresário Salimo Abdula disse que é "um bom sinal" e o ministro do "Made in Mozambique", António Fernando, afirmou que a subida "era de esperar" face ao bom trabalho que o Governo tem feito. Num país de "renda baixa", o indicador que mais progressos registou foi o de "protecção de investidores" (lamentavelmente o jornal não nos mostra o que isso significa, certamente é tarefa do Banco Mundial, pp. 4-5).
Como sou pecaminosamente ignorante, não encontrei, claro, nenhuma referência a salários. Teria perversamente gostado de encontrar uma rubrica do género "protecção de salários". O que figura nos dados do BM reportados pelo "Notícias" é, por exemplo, uma rubrica chamada "contratação de funcionários", com indicadores como "índice de regidez de salários", "índice de dificuldade de demissão" (fantástico indicador este!), "índice de rigidez trabalhista", "custos extra-salariais" e "custos de demissão".
Lamentavelmente - por aquilo que o "Notícias" mostra -, os nossos índices são ainda elevados, ainda não aprendemos a salariar à maneira, a despedir rápido e a impedir custos de demissão.
Mas o ministro do "Made in Mozambique" tranquilizou os empresários através do "Notícias" afirmando que a nova Lei do Trabalho "introduziu uma série de facilidades, com destaque para a contratação da mão-de-obra, particularmente no que diz respeito à rescisão do contrato de trabalho e respectivas indeminizações" (p. 5). Por outras palavras, o que o ministro disse sem dizer dizendo é que a situação dos trabalhadores vai piorar. O Governo tem em curso - disse satisfeito António Fernando -um "vasto trabalho" para facilitar ainda mais o ambiente de negócios. Não tenho qualquer dúvida sobre isso.
Entretanto e ainda na sua edição de hoje, o "O País" dá conta da difícil vida dos trabalhadores nas construção civil, procurando sobreviver com magros salários (p. 11).
Sonhadores, os sociólogos sempre procuraram duas coisas: as leis do social e a reforma das sociedades. Cá por mim busco bem pouco: tirar a casca dos fenómenos e tentar perceber a alma dos gomos sociais sem esquecer que o mais difícil é compreender a casca. Aqui encontrareis um pouco de tudo: sociologia (em especial uma sociologia de intervenção rápida), filosofia, dia-a-dia, profundidade, superficialidade, ironia, poesia, fragilidade, força, mito, desnudamento de mitos, emoção e razão.
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