27 setembro 2007

A propósito dos preservativos europeus que matam africanos

Regressando às afirmações do arcebispo segundo a BBC e o Guardian: seria fascinante estudar a produção da crença (que é, também, o de uma lenda, de um rumor, de um mito ou de um boato) ao nível de muitos actores e grupos. Nem sempre a crença num rumor é produto da ignorância ou da falta de instrução. O rumor ou uma lenda contam uma história falsa para sublinhar um problema verdadeiro (por exemplo: HIV/Sida mata). Estudei e escrevi isso quando, há alguns anos atrás, investiguei o rumor de que o governo matava as pessoas de Nampula introduzindo cloro na água para provocar a cólera. E, regra geral, o rumor é produto de uma preocupação com a ordem moral, é exercício de medo, de receio da novidade técnica, do estrangeiro, da liberalização dos costumes, da mudança social, etc.
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Imagem extraída daqui. Mais uma pequena ideia: a exasperação emocional com o HIV/Sida pode ser ampliada com a ignorância sobre qual o significado do líquido que oleia o interior do preservativo. Ora, os líquidos são sempre um vector fundamental de crenças e de rumores. Com a peste negra na Europa, milhares de judeus foram chacinados no século XIV em França com o argumento de que eram os introdutores da doença através da água.

8 comentários:

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Mas qual o interesse dos europeus em matar africanos? Ou será que o bispo tenta não incentivar o uso do preservativo?

Carlos Serra disse...

Claro que não existe esse interesse. Por outro lado, a igreja católica tem incentivado a abstinência e de forma directa ou indirecta criticado o uso dos preservativos (as deslocações e os encadeamentos de ideias "reajustadas" podem facilmente nascer nesse meio). Longe de mim pensar que o cidadão Chimoio está a ser deliberadamente mal-intencionado. Quero até crer que ele acredita seriamente no que acredita. Tal como, afinal, todos aqueles que acreditavam nos anos 60, na França instruída, que os judeus raptavam europeias à noite para fins obscuros. Leia o sempre clássico trabalho de Edgar Morin e da sua equipa chamado "O rumor de Orléans". Hoje ainda compreendemos mal a sistémica dos rumores (que são, tb, não poucas vezes, intencionalmente provocados sobre em situações de guerra ou de combate político árduo). Já agora, procure aqui no diário uma postagem com o título "chupa-sanguismo".

Anónimo disse...

Boa pergunta Sousa, também não vejo nenhum interesse, os Arianos não conseguirar exterminar os judeus...que são menores que a totalidade de toda a população africana no continente e na diáspora...Sempre soube que a posição da igreja em relação ao uso do preservativo e particularmente sobre o SIDA nunca foi clara desde o início. Por isso não me espantam os pronunciamentos do bispo.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Não li essa obra de Morin, mas logo que tenha tempo vou lê-la. Obrigado pela sugestão. Outra obra interessante é a «sociologia das mentiras» (sociology of lying) de J.A. Barnes, bens como os ensaios de Hannah Arendt sobre verdade e mentira em política. Abraço

Carlos Serra disse...

Muito obrigado!

Anónimo disse...

Aló Carlos Serra . Já existe uma reacçao do Dom Chimoio. Nega as afirmaçoes que jornalista da BBC. Veja no Imensis as palavras do Dom Chimoio.
um abraço
Nhaca

Carlos Serra disse...

Muito obrigado!

Anónimo disse...

uma sugestao. podes publicar a reacçao para abrir um debate sobre as noticias mal escritas.
Nhaca