06 novembro 2008

Quem não é mulato? (5) (a propósito de Barack Obama)

Mais um pouco da série.
Apresentei-vos, no número anterior, um exemplo de racismo com raça, de "antipatia racial" nos termos do sociólogo que citei.
Mas pode também existir o racismo sem raça, melhor, a hostilidade racial sem raça.
Em 1999 dirigi uma equipa de jovens pesquisadores que procurou estudar o racismo e a etnicidade no nosso país. Nessa pesquisa usámos um questionário administrado a 523 pessoas, de várias profissões, nas cidades de Lichinga, Beira, Tete, Inhambane e Maputo (excluo aqui os pormenores da construção da amostra, do tipo não-probabilístico, bem como dos critérios de selecção dos actores-alvo).
Uma das frases-estímulo usada foi a seguinte: Os negros são racistas, para a qual esperávamos uma concordância nula e ausência de dúvida e de desconhecimento. A percentagem de concordância situou-se nos 22% (especialmente ao nível das mulheres). A discordância foi de 59%, a percentagem de dúvida de 11% e a do desconhecimento, de 8%. A concordância foi directamente proporcional à idade e inversamente proporcional à escolaridade. Professores e atletas federados foram os que mais discordaram (68 e 65%, respectivamente). Porém, os camponeses (muito em particular as camponesas das periferias urbanas de Beira e Tete, no Centro do país) foram, curiosamente, os que mais concordaram (37%) e os que menos dúvidas tiveram (3%). Interrogados sobre as razões de tão singular posição, eles (melhor dito: elas) disseram, regra geral, o seguinte: "Quando os pretos se apanham lá em cima, deixam de pensar em nós". Assim, camponeses consideraram racistas os negros que eram negros como eles. Essa atitude mostrou que o estrangeiro motivo de aversão não era apenas aquele que estava fora do grupo racial, mas aquele que estava dentro dele. A pesquisa mostrou evidências de que o estrangeiro não tinha, afinal, cor.
Sugestão: há nesta série dois extensos comentários do antropólogo Paulo Granjo, para os quais chamo a vossa atenção.

4 comentários:

Lisa disse...

O meu comentário de hoje sera curto, bréve e copiado..

Carlos Serra disse...
"As classificações de raças (que é uma coisa que se sabe não existir em termos biológicos e naturais) só têm razão de ser pela sua história e pelo consenso social que continua a existir acerca da sua importância." - o Paulo disse tudo e bem.


Faço minhas as palavras do Prof: Carlos concordando com o Sº paulo..

Fico-me por aqui sobre o tema de raças e racismo...
Lisa

Anónimo disse...

Lisa, não fique por aqui, porque o problema não está resolvido...

O Carlos Serra, o Paulo Granjo, com saber e paciência falaram-nos dessa coisa de "estrangeiro", mostraram-nos de como é que essa coisa do racismo funciona.

Agora, o que é que nós, os vulgares cidadãos brancos, monhés, pretos, mulatos, etc.) fazemos?

Qual é a solução? O que é que podemos fazer perante as elites negras que passam a vida a fabricar estrangeiros?

No jornal Savana, em "Espinhos da Micaia" o Fernando Lima a dado passo diz:

"Ironicamente, as elites do continente africano que exultam com a vitória de Obama, nos seus próprios países, criaram mecanismos legais, impeditivos de terem fenónemos Obama nos seus territórios. O background familiar, a origem dos seus pais seriam um impedimento para ser candidato a presidente em grande parte do continente africano. A começar por Moçambique, passando pela Zâmbia, onde, o primeiro presidente, o que está indelevemente associado à sua independência, foi impedido de se candidatar a um novo mandato... porque os pais eram do Malawi, antiga Niassalândia que, tal como a Rodésia do Norte, eram ambos territórios coloniais britânicos. Como se o nacionalismo fosse ditado pela cor do passaporte e pela regra e esquadro da Conferência de Berlim."

Lisa disse...

Anónimo

Eu sei que não está resolvido..Mas o que tenho lido desde "Quem não é mulato? (5) (a propósito de Barack Obama)" nos comentários , não aprendi nada sobre o que rácismo..Nós os brancos somos tratados por racistas se insultamos um negro...E há dois dias atrás houve um épisódio na " minha escola" muito triste e revoltante onde uma madrasta esfaqueou a enteada chamando-a de Preta sendo ela tb preta...

Vou lendo o que o prof: Serra vai escrevendo e tb os comentários mas eu por mim fico-me por aqui...

Agora só fico ansiosamente á espera dos comentários sobre o novo texto do Prf: Serra
"Obama é puro melting pot "

Acho que este post vai dar muito que falar...

E sobre as perguntas que faz...sinceramente não sei responder..
Se calhar até sei mas....

Lisa

Anónimo disse...

Gosto do estilo do Senador Obama e acredito que ele foi a melhor opção. Torço para que ele faça um excelente governo.