Linchamentos, eclipse do social e bodes expiatórios (2) (prossegue)

"O contrário é convergente e dos divergentes nasce a mais bela harmonia, e tudo segundo a discórdia" (Heráclito)

I

"(...) que depois, rios e fontes,/que eram claros e limpos,/em muitos lugares envenenaram,/e muitos suas vidas terminaram,/pois aqueles que deles usavam/logo repentinamente faleciam./(...) Pois todos os Judeus foram destruídos,/uns enforcados, outros queimados,/outros afogados, outros decapitados/pela cabeça com machado ou espada." (Guilhaume de Machaut, Julgamento do Rei de Navarra, século XIV, França; com a peste negra a ceifar milhares de pessoas, as comunidades reagiram matando Judeus, considerados culpados do envenamento das águas)
II

"Desde que se acende em um reino ou em uma república este fogo violento e impetuoso, vemos os magistrados aturdidos, as populações apavoradas, o governo político desarticulado. A justiça não é mais obedecida; os trabalhos param; as famílias perdem a sua coesão, e as ruas a sua animação. Tudo se reduz à extrema confusão. Tudo cai em ruínas. (...) recusa-se qualquer piedade pelos amigos, pois toda a piedade é perigosa (Francisco de Santa Maria, História de sagradas congregações..., século XVII)

III
"Nós aqui estamos a viver mal, os bandidos não nos largam, esses que vivem ali no cemitério..." (Moradora do Bairro Luís Cabral, periferia da cidade de Maputo, falando há dias para a STV a propósito do linchamento de dois supostos ladrões naquele bairro)

IV

"(Chimoio) Dona Maria Sete, suposta senhora "mágica" (...) tida como acolhedora dos bandidos (....) foi considerada mágica porque "quando ela levava porrada não sentia dores e era uma mulher temida pelos residentes, porque batia muitos homens, ninguém podia lutar contra ela. Quando a população começou a espancá-la, saiu uma cobra dela e a população matou-a" (Domingos Boaventura, População revolta-se contra a polícia, Magazine Independente, edição de 27/02/08, p. 11) (Maria Sete foi linchada nas violentas manifestações no Chimoio do dia 23)