07 fevereiro 2008

A espada de Dâmocles

Permitam-me deixar aqui algumas ideias canhestras.
Seja o que for que venha a decidir-se nas conversações entre o governo e a federação de transportadores, não se decidirá, certamente, aumentar as tarifas dos chapas. Por outras palavras: só poderá decidir-se nada se decidir em termos de aumento. O Estado está agora refém de uma má decisão, de uma precipitação, o de ter suposto que as pessoas aguentariam mais um peso à Sisífo: o seu destino é o de não aumentar as tarifas. Se o fizer, se as aumentar, se as deixar aumentar, expõe-se ao alargamento da zona sísmica social já existente em Maputo e à perda drástica de legimitidade nas margens das eleições. Naturalmente que os transportadores têm todo o interesse em incrementar os seus lucros e por isso estão em posição aparente de vantagem. Mas também eles são agora reféns do povo: se embarcam em aumentos, o povo embarca em terramotos sociais. Finalmente: o Estado, que aprendeu a tornar-se refém dos transportadores privados e que por isso tem que arcar com o ónus do problema, parece ainda não se ter lembrado de reactivar a empresa de transportes públicos, empresa cuja frota ainda não requisitou quando o povo vive dificuldades. Se o Estado abdica disso e se deixa tudo ao bom-senso de um acordo razoável com os transportadores, abdica do seu povo. Se abdica do seu povo, pagará uma cara factura política. Neste momento, de nada adianta estar a atribuir aos marginais, aos arruaceiros, as causas de um problema, de um sismo social que nada tem a ver com marginais. Ou melhor dito: tem a ver sim, tem a ver com os marginais, com os marginalizados do bem-estar, com os excluídos de um sistema social que os produz e reproduz diariamente.
Corrijam-me caso achem que penso erradamente.
1. ª adenda às 18.05: prometi que analisaria o sismo social de 5 de Fevereiro. E fá-lo-ei em altura devida. Mas com uma salvaguarda desde já: tenho para mim que não compete ao analista do social resolver problemas, mas, antes, criar problemas aos problemas para que eles possam ser menos problemáticos e resolvidos por quem é decisor. Acresce que não tenho competência para me substituir aos decisores e muito menos sou fadado para dissertações sobre a arte - quantas vezes nefelibata - de querer passar por bom mecânico de problemas.
2.ª adenda às 18:39: um leitor, na postagem com o título "Povo pacífico estragado pela mão externa", perguntou-me se é verdade que amanhã vai haver uma manifestação de chapistas. Resposta: não sei.
3.ª adenda às 18:44: o comentário de um leitor nesta postagem leva-me a colocar este problema: quais são os lucros médios diários dos chapistas na cidade de Maputo (por exemplo)? Está a pergunta mal feita? Se está mal feita, qual a pergunta bem feita a fazer? E há outras perguntas?
4.ª adenda às 19:10: a revolta popular de 5 deste mês é a manchete do semanário "Savana" desta semana, que vai incluir um filme dos acontecimentos e um relato do processo negocial entre o governo e a conferedação dos transportadores de semicolectivos. Ignoro, porém, a razão por que ainda não está na rua.

7 comentários:

micas disse...

Eheheheheheeh!

Então não chega já de problemas?quer pôr-me os olhos em bico ou os neurónios aos trambolhões?

...e deixe que lhe dia que é fadado para muita coisa e estes dias tem sido prova disso.

chapa100 disse...

interessantea tua analise professor! estou curioso sobre a solucao que o governo vai encontrar, estamos perante um cenario que vai ditar os niveis de responsabilidade politica do governo em relacao a politicas publicas. o economista chimbutane fez num dos seus comentarios no seu blog uma proposta valiosa de que como formular perguntas sobre como desenvolver o servico de transporte publico. ate agora a confederacao dos transportadores tem so a proposta do aumento do preco do chapa, parece-me que isto so resulta a curto prazo, nao vejo uma proposta mais elaborada e a longo prazo.
parece-me que a decisao final so podera sair ate domingo, ate vamos assistindo declaracoes de forca do dois lados.

o editorial do noticias foi muito infeliz. entre o comunicado do ministro do interior e a este editorial, nao vejo muita diferenca.

Anónimo disse...

Caros,

Tenho uma simples pergunta:
Alguém aqui conhece a percentagem dos custos de combustíveis dos custos totais operacionais dos serviços de transporte de passageiros. Com outras palavras, foi jamais publicado uma a consolidação de dados operacionais de todos membros da Federação Moçambicana dos Transportes Rodoviários (FEMATRO) ou dos transportadoras semi-colectivos? Se não, como sabemos se os aumentos das novas tarefas foram adequadas?

Oxalá

Dre@mer disse...

Professor, anda circulando este email. Passo para si, pode ser que ajuda nos estudos do efeito colateral da greve.[desconheco o autor]

COMPANHIA INTERCAPE NO SEU MELHOR

São de facto lamentaveis os ultimos acontecimentos ocorridos na cidade de
Maputo, devido á subida de preço do combustivel. As manifestações que
deveriam ser pacificas e tranquilas, levaram a uma serie de vandalismos e
bossalidades incalculaveis, que afectaram inumeros cidadãos tão vitimas,
como aqueles que participaram nas violentas manifestações.
Mais incrivel ainda, no meio de tanta tragédia, foi a falta de respeito, a
falta de humanidade dos nossos compatriotas da "respeitável" companhia
INTERCAPE, no dia 05 de Fevereiro de 2008. Na terça-feira, no referido dia,
ás 08:00 da manha, parte um autocarro da Intercape, de Johannesburg (do
Intercape office – Park City Transit Centre – JHB Station), para Maputo (
sede - Tropical Air Tours – AV. 24 de Julho nº909), conforme estava escrito
no bilhete por mim comprado um dia antes.
Depois de uma avaria, e de 2 horas de espera dentro do autocarro sem ar
acondicionado, quando chegámos a Nelspruit recebemos a noticia das
violentas manifestações que decorriam em Maputo, e que se alastravam até á
cidade da Matola.
Depois de alguns telefonemas, e de uma conversa com a tripulação de outro
autocarro, tambem da Intercape, que regressava vazio para a vizinha África
do Sul, a assistente de bordo informa-nos (passageiros) que o autocarro não
iria parar no seu terminal na cidade de Maputo como estava previsto, mas
sim na terminal da cidade da Matola, e que todos os passageiros teriam de
abandonar o autocarro juntamente com as suas bagagens, conforme ordens dos
seus superiores.
Ora aqui está uma atitude bonita, sim senhora!!!
Fomos abandonados de malas na mão, perto da zona de conflito (perto da
esquina do Shoprite da Matola), onde estavam estacionados outros autocarros
de outra companhias, que, como é óbvio, permaneceram com os seus
passageiros até que a situação acalmasse para que depois os pudessem levar
ao destino, e para que na medida do possivel os mantivessem em segurança.
Visto que o destino era Maputo, mais de metade dos passageiros não tinha
como se abrigar das balas, pedras e cidadãos enraivecidos que cada vez se
aproximavam mais do local onde fomos "despejados". Alguns tinham amigos ali
perto, que moram do outro lado da Matola, e que ainda podiam ser solidários
oferecendo boleia e abrigo durante a noite.
Este foi o meu caso e da amiga que viajava comigo. Graças á boa vontade de
um amigo que se arriscou ao nos ir foi buscar, e nos ofereceu a sua casa
para passarmos a noite, não ficámos ao relento correndo o risco de sermos
assaltadas, espancadas e sabe-se lá mais o quê!!!! Mas tenho pena das
pessoas que não tiveram a mesma sorte que nós, das quais provalvelmente,
não terei mais noticias, nem saberei se tiveram sorte e conseguiram escapar
dos malfeitores.
Ora, depois de pagar 230.00RANDS pela passagem, aturar uma avaria de 2
horas, um autocarro sem ar condicionado, e um abandono em plena "zona de
guerra", digam-me se não é de processar a companhia???!!!
São atitudes destas que não podem ficar impunes nem passar despercebidas.
Por favor, façam circular este e-mail para que toda a gente saiba como a
INTERCAPE trata "bem" os seus passageiros, para que as pessoas escolham
bem a companhia em que viajam, e para que situações como esta não
aconteçam.

Obrigada!
[desconheco o autor]

Carlos Serra disse...

Obrigado pelo envio. É um bom doc. para análise.

Anónimo disse...

Caro Professor

Acabei de receber um sms que diz o seguinte:
`Proprietarios, Motoristas, cobradores, filhos d pobres, povo d baixaescalao e simpatizantes dos T.Simi-colectivos estamos a sofrer. Filhos de Ministros, deputados e outros altos dignatarios nao andam de chapa, + sim d 4*4 k os s/pais roubam dos impostos k pagamos e os n/filhos tao a perder aulas. O chapeiro esta cada vez + a serem espezinhados e desconsiderados. No dia 8 (amanha)ninhum carro deve circular.Nem as pessoas`

Carlos Serra disse...

Fizeram-me um forward disso. Boato.