Nada custa zoologizar as etnias e dá-las, como substanciais e evidentes, prontas a consumir aos turistas ávidos de sensações (robustamente exóticas) quando visitam a África do Sul. Repare-se na seguinte descrição feita em 2003 por uma enviada especial da Folha de São Paulo: "Cadê as diferentes etnias sul-africanas?" podem perguntar alguns visitantes quando ficarem cansados de ver elefantes, antílopes, girafas e rinocerontes. Para saciar a curiosidade de alguns, foi construída, próxima à reserva Shamwari, uma vila multicultural da África do Sul. (...) Os tradicionais contadores de histórias africanos estão também na aldeia. (....) O mais divertido, no entanto, é reparar nos diferentes trajes das etnias, tirar uma foto com o carrancudo guerreiro zulu, conversar com os moradores de uma vilazinha - localizada atrás da aldeia - que fazem o show. Para finalizar, experimente os tambores africanos e caia na dança."
Sonhadores, os sociólogos sempre procuraram duas coisas: as leis do social e a reforma das sociedades. Cá por mim busco bem pouco: tirar a casca dos fenómenos e tentar perceber a alma dos gomos sociais sem esquecer que o mais difícil é compreender a casca. Aqui encontrareis um pouco de tudo: sociologia (em especial uma sociologia de intervenção rápida), filosofia, dia-a-dia, profundidade, superficialidade, ironia, poesia, fragilidade, força, mito, desnudamento de mitos, emoção e razão.
12 comentários:
Na verdade foram os europeus que começaram, consigo próprios e nos países escandinavos, na altura da invenção dos chamados "museus vivos".
Mas, pelo tom "pitoresco" da descrição da jornalista, depreendo que ela nunca foi cliente de uma dessas viagens organizadas no Rio de Janeiro, em que os turistas vão visitar as favelas dentro de blindados militares...
Isso, Paulo...Abraço!
Não será o título desta postagem tendencioso? Por que não chamá-los "museus vivos" ou "sítios túrísticos" por exemplo?
Abstraido-me dos "sítios" desse tipo sul-africanos, acho que empreendimentos do género, se por um lado podem ser demasiado "turísticos", superficiais e "business-oriented", por outro podem ser profundos e muito mais elucidativos, motivadores e com melores resultados instrutivos para muitos públicos do que textos e textos escritos ou falados dizendo o mesmo. Pode ser uma forma de divulgação como qualquer outra, tudo dependendo de como são concebidos e implementados. E quiçá as comunidades locais pudessem ter aí também postos de trabalho, mercado para o seus produtos e algum outro redimento.
Não haverá aí demasiado preconceito, Professor?
Bom dia!
Usei "o rato" para ler o artigo mencionado pelo professor e o encontrei sobre este título: "Aldeia dá uma pitada de cada etnia sul-africana".
Convido a todos que façam o mesmo.
A atividade turística, para mim é uma coisa mais ou menos insana. Cada vez que é anunciado um grande investimento turístico aqui, em Moçambique ou qualquer outro lugar onde o que se vende é cultura e recursos naturais, ligo imediatamente o sinal vermelho, sem passar pelo amarelo.
Professor Carlos Serra é um prazer acompanhar as discussões neste blog, sempre aprendo muito.
Um abraço,
Juraci
lá, Juraci, ainda bem que reapareceu! Escute: no trajecto Porto-Alegre/Pelotas e vice-versa, vi várias sinalizações do tipo “reserva nativa, conduza com cuidado”. Vi, tb, “’Indios”, vivendo em casebres, vendendo artesanato, vários deles circulando na berma da estrada. Sempre me coloquei esta questão: os “’Indios” não são Brasileiros? Por que são tratados como “nativos”, por exemplo?
Prosseguindo a minha linha e pensamento: E se em vez de turísticos os considerarmos locais culturais, de conhecimento mútuo, de lazer, de entretenimento?
Por que razão serão só turísticos? Conhecerão os maputenses casas típicas do Norte de Moçambique, ou as jovens as mil maneiras de amarrar o lenço das macuas, ou os macondes como se faz algo típico da Zambézia?
Não sei se o meu texto vai sair o efeito desejado, mas pelo que li no texto escrito pela jornalista achei-o de mau gosto.Faz-me lembrar um jardim zoológico "humano" só faltam as jaulas.E ela acha muito divertido.
Gostava de ver os filhos desses que se chamam de "turistas" e tb a familiá dessa jornalista nas mesmas condições, para divertirem os habitantes da África do Sul.
Desculpe Sª Professor mas este texto meteu-me nojo.E sinto pena que os humanos chegam a esses termos para poderem divertir gente sem escrúpulos.
Pode sempre retirar o meu comentário se o achar fora de propósito..
Lisa
...acho que se fôr uma actividade bem pensada,que respeite a dignidade dos intervenientes e afirme valores culturais,ancestrais desses mesmos povos ,que não terá nada de mal.
antes pelo contrário,será uma forma de mostrar outros hábitos e costumes a quem visita e também como disse um bloguista acima ,uma forma de ganhar alguma coisa legitimamente ,e orgulhosamente...
...pior é nada se fazer e gratuitamente oferecermos a quem nos visita ,o espectáculo de pobreza, miséria, crianças de nariz ranhoso e cheias de fome nos seus ventres inchados ,que é a imagem mais comum e representativa de Africa quando dela se fala.
...em todo o mundo se fazem espectáculos culturais deste género.
Boa noite, ainda por aqui.
Um pouco longa aí vai minha resposta.
Sim, somos todos brasileiros. É reconhecido como “indígena um grupo de pessoas que se identifica como coletividade distinta do conjunto da sociedade nacional em virtude de seus vínculos históricos com populações de origem pré-colombiana (antes que Cristóvão Colombo chegasse à América). Todo indivíduo que se reconhece como parte de um grupo com essas características e é pelo grupo reconhecido como tal pode ser considerado um índio”. http://www.socioambiental.org/
Ano retrasado, quando estive em Pelotas, também, esse fato me chamou atenção.
O Rio Grande do Sul possui 57 áreas de Terras Indígenas a maioria ocupada, mas não demarcada. Dos povos indígenas que existiam no estado hoje sobrevivem alguns Guarani, Guarani Ñndeva, Guarani Mbya (para estes a língua é o Tupy Guarani) e Kaigang cuja língua é Jê.
Para os Kaingang a luta pela terra tem sido a forma que encontraram para o enfrentamento do processo de pauperização crescente em que se encontram.
U m dos fenômenos que vêm chamando a atenção dos historiadores, antropólogos e das autoridades é a urbanização de indivíduos e famílias indígenas em todo o Brasil. A presença indígena nas cidades é um fenômeno tão antigo quanto o surgimento das primeiras vilas no país, mas somente agora vem adquirindo dimensões de caráter mais sociológico e político.
De locais de passagem rápida algumas cidades passaram a locais de habitação fixa para muitas famílias kaingang, como Porto Alegre(RS) e Chapecó(SC) onde os indígenas optaram por viver fora das aldeias. A primeira reserva indígena urbana com 5,8ha foi oficializada em Porto Alegre e abriga 45 famílias. A maioria, nesses casos, vira trabalhador braçal.
As razões para saírem das terras indígenas estão relacionadas a vários fatores como: falta de condições materiais de vida, conflitos internos entre facções, procura de melhores alternativas de trabalho, busca de liberdade, avanço da agricultura, projetos imobiliários e turísticos estes, principalmente no litoral.
Alguns jovens procuram as cidades para poderem concluir os estudos de segundo grau e universitário ou para trabalhar em empregos urbanos. A presença de famílias kaingang nas cidades acaba se tornando um importante ponto de passagem para parentes e afins que vivem nas aldeias.
No município de Camaquã, onde o senhor viu o acampamento estão localizadas quatro áreas de terras indígenas, em algumas áreas, depois de muitos e muitos anos de terem sido expulsos pela agricultura, a justiça autoriza o retorno, mas já é uma área que só serve para uma agricultura com insumos modernos. Lembra da paisagem?
Ali na beira da estrada estão algumas famílias que compõem os povos Guarany Mbya que andam em busca da yvy marãey, ‘terra sem mal’, como ainda não a encontraram estão ali para comercializar seus produtos e sobreviver.
Para o gaúcho (gentílico para o estado do RS) nativo é natural da terra. O gaúcho usa muito em suas poesias tradicionalistas a exaltação ao sentimento nativista. É muito comum dar nomes a restaurante de Sulnativo, Chão nativo. Mas essa exaltação vale muito para os CTGs (Centro de Tradições Gaúchas) e pouco para a população indígena.
Continua...
... continuação
“Em pleno século XXI a grande maioria dos brasileiros ignora a imensa diversidade de povos indígenas que vivem no país. (quem são). Estima-se que, na época da chegada dos europeus, fossem mais de 1.000 povos, somando entre 2 e 4 milhões de pessoas. Atualmente encontramos no território brasileiro 227 povos falantes de mais de 180 línguas diferentes. A maior parte dessa população distribui-se por milhares de aldeias, situadas no interior de 593 Terras Indígenas, de norte a sul do território nacional.
Para o ISA a população indígena no Brasil atual está estimada em 600 mil indivíduos, sendo que deste total cerca de 480.000 mil vivem em suas Terras Indígenas (e, em menor número, em áreas urbanas próximas a elas), enquanto outros 120.000 mil encontram-se residindo em diversas capitais do país.
Em meio a essa diversidade, apenas 11 línguas têm acima de cinco mil falantes: Baniwa, Guajajara, Kaingang, Kayapó, Makuxi, Sateré-mawé, Terena, Ticuna, Xavante, Yanomami e Guarani, estão sendo faladas por uma população de aproximadamente 30 mil pessoas. Em contrapartida, cerca de 110 línguas contam com menos de 400 falantes”.
Não lhe parece familiar essa realidade?
Essas e outras informações estão no site: http://www.socioambiental.org/
Uma curiosidade: O gaúcho não comemora 15 de novembro como data nacional da proclamação da república, sim 11 de setembro porque considera que nessa data em 1836 foi proclamada a República Rio-Grandense, durante a Revolução Farroupilha.
Mais ainda: Sob o lema “Movimento Pampa, Meu País” existente desde a década de 1980 defende a restauração da independência gaúcha. www.pampalivre.info/faq.htm
Exagerei! Desculpem-me.
Um abraço.
Juraci
Exagerou nada, Juraci, nada mesmo. Creia que muito aprendi e estou certo de que os muitos leitores deste blogue tb. Muito obrigado e escreva sempre!
Comeco a desconfiar da seriedade desse jornal. Faz um ano reportaram uma grosseira e estupida mentira sobre Mocambique, rebatida aqui: http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?msg=ok&cod=439FDS002
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