Entremos, agora, na casa das mulheres do sociólogo Alain Touraine, não menos francês, não menos conhecido.
O livro chama-se "O mundo das mulheres", saído o ano passado em Paris nas edições Fayard.
Qual a tese que passa em filigrana nesta obra do sociólogo do sujeito, do actor, da sociedade pós-industrial, da liberdade?
É a seguinte: a impotência, a falsa consciência e a total dependência das mulheres são afirmações desmentidas pelos factos. É necessário ouvi-las, em lugar de falar em seu nome.
Com efeito, de um estudo iniciado em 2004 com dezenas de entrevistas, individuais e colectivas, feitas a mulheres, incluindo muçulmanas, pode concluir-se que elas se definem como mulheres e não como vítimas, mesmo quando sofrem injustiças.
É a feminilidade, consciente e assumida, que está em causa, que é a razão de ser e de estar das mulheres.
O seu objectivo fundamental na vida - diz Touraine baseado nos testemunhos recolhidos - é o de se construírem enquanto mulheres. Não são obrigadas a sê-lo: é sua opção, consciente, livre.
E essa construção feminina passa, na maior parte dos casos, pela sexualidade. Este o campo vital onde as mulheres melhor podem vencer ou fracassar em sua feminilidade assumida.
Sempre vistas como não existentes, como despojadas de subjectividade, as mulheres são, afinal, sujeitos históricos activos não tanto, hoje, de um movimento social quanto de um movimento cultural. O movimento da afirmação da feminilidade.
O mundo das mulheres de Touraine é o mundo das suas vozes escutadas por Touraine e pela sua equipa - diz, veemente, o sociólogo -, não o mundo de Touraine atribuindo-lhes o que é de regra atribuir: a passividade e o silêncio. Porque, regra geral, é do silêncio das mulheres que falamos (nós, homens) e não do seu pensamento e das suas palavras.
As mulheres de Touraine não querem suprimir as mulheres. Querem apenas sê-lo, femininas sempre.
É a palavra das mulheres contra o discurso sobre as mulheres.
4 comentários:
Professor C.S!
Parabéns pela excelente e pertinente analise comparativa desses dois ícones da sociologia Francesa.
De Bourdieu leio tudo que me surge a frente. “A dominação masculina” é meu livro de cabeceira. Esse livro que Bourdieu teve ocasião de revisitá-lo e rever algumas de suas teses antes de partir desta para “melhor”. De Touraine para além da sua produção inicial sobre as “sociedade pos-industrial” explorei algumas de suas ideias sobre movimentos sociais. O retorno do Actor é, parece-me, uma proposta, decorrente da evolução do pensamento, consequente de quem viveu o suficiente para rever tudo quanto andou a escrever desde os anos 70. Ouvi pessoalmente Touraine falar da sua pesquisa mais recente. Foi no ano passado em Durban no Congresso Internacional de Sociologia. Não tive ocasião de ler ainda o “Mundo das Mulheres”! No entanto, parece-me mais uma resposta póstuma à Bourdieu. Lá onde um indivíduos condicionados pelos determinismos sociais, outro parece ver espaços ou actores em liberdade. É ou não é assim professor? Como não conheço melhor leitor dos dois autores é a si que me resta perguntar.
Sim, sim. Na sequência da série, tentarei entrar nesses dois grandes paradigmas (o do determinismo e o da liberdade, o do rolo compressor e o do ego)que marcaram e marcam a sociologia francesa, mas não só. Tentarei mostrar que a produção de Touraine tem diso construída em luta contra Bourdieu e Marx, tal como a produção de Weber foi construída em luta contra Marx. Abraço.
Recado para Yolanda Aguiar: oiça, recebi o seu e-mail, mas creio que não colocou o anexo sobre o casamento entre dois seres de idades muito desiguais. Cumprimentos.
Desculpe. tentarei de novo
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