21 julho 2007

Os mandarins da moral


Os mandarins da moral, de todos os azimutes, procedem, faz dias, a um linchamento mediático de Ivânia, a Dama do Bling.
Ela é linchada sob acusação de que fere gravemente a moral.
Os mandarins, os proprietários da fita métrica da moral infalível, chegam mesmo ao ponto de porem em causa o facto de Ivânia dançar grávida, chegam mesmo ao ponto de, de forma indirecta, implícita, a acusarem de pôr moralmente em cheque o filho que transporta no ventre.
Mas, afinal, os mandarins da moral são especialmente mandarins da bagatela. O que no fundo fazem é bagatelizar a vida.
Seria bem mais útil que se debruçassem sobre o sistema que produz os horrores capturados e medidos pela fita métrica da moral mandarinesca, sobre o sistema que tritura, que fagocita todas as regras de moral, incluindo as mandarinescas.
Como escreveram um dia Marx e Engels, efectivamente tudo o que é sólido esboroa-se.
Seria bem mais moral que, em lugar de lincharem Ivânia, os mandarins, os régulos da fita métrica perversa, analisassem o sistema social que dá origem, por exemplo (e, certamente, apenas exemplo modesto no mar dos exemplos-arranha-céus) à construção do futuro Maputo Private Hospital, SARL - sim, assim se vai chamar -, orçado em 18 milhões de dólares, tendo como presidente do conselho de administração um ex-membro do nosso Governo.

16 comentários:

Anónimo disse...

o autor deste blog nao será um dos mandarins de que fala?

Anónimo disse...

1. Na minha opinião a Dama de Bling aponhou-nos (nós homens) na curva. Ela está a atingir ou mesmo já atingiu o objectivo que teve nos seus espectáculos - provar que os homens comandam a vida das mulheres. São eles que definem como as mulheres se devem comportar. Daí que os seus críticos em todos sites/jornais/fóruns, são homens quase na totalidade.

2. É estranho e muito estranho que isto se trate de imoral ou de muito imoral, numa sociedade com muita coisa que deviamos considerar imoral, mas pq é praticada pelos homens, tudo se reduz a nada. Ora vejamos, para além de casos imorais alistados por alguns aqui, temos e são frequentes casos em que homens e até de altos postos no governo, nos partidos, nas empresas, no aparelho do estado, etc, que traiem às suas esposas e toda a família, que mantêm amantismo ou directamente dito, relacões sexuais com as que popularmente se chamam "quatorzinhas". Porém, por mais que sejam casos conhecidos, ninguém considera isto de imoral. Não me admiraria que se tivessemos muito cuidado, descobririamos que parte dos que escreveram artigos críticos à Dama do Bling esteja envolvida em actos de amantismo (com todas as suas consequência para as suas famílias) e talvez com "quatorzinhas".

3. Daí, a minha contribuicão em jeito de resposta ao que Aguiar se interrogou - porquê Dama do Bling, Ivanea é escândalo/imoral, mas não aquelas meninas a mostrarem na totalidade seus seios e as coxinhas - só posso pensar que onde não é escândalo (no segundo caso) é o homem (o réi) que decide. Ele é que vai escolher a quem sexualmente acha melhor de todas.

Carlos Serra disse...

Bem, avancemos então, parece que o quadro da segunda intervenção é, agora, mais lato. A moral em geral e a masculinização da crítica em particular.

JCTivane disse...

Ca por mim acho que essa Dama abusa. Tenho dito.

Anónimo disse...

abusa porquê Jctivane?

JCTivane disse...

Eu sou muito livre mas o problema dessa bling consiste em ofender a moral. A nossa moral africana deve ser respeitada. A moral nao se discute. Tenho dito.

Aguiar disse...

Bom, que os homens tentem comandar a vida das mulheres para mim nao é um problema. É sim uma soluçao antiquissima. O problema surge, a meu ver, qdo as mulheres, elas proprias, conferem o poder de decisao aos homens, submetendo-se indolentemente a esse mesmo poder, sujeitando-se e reproduzindo-o em todas as esferas da sociedade.

O problema nao esta na relaçao social de dois sexos em que um sexo subordina, ou tenta subordinar, o outro em nome da moral e dos bons costumes. O problema esta, suponho eu, no sujeitamento (ou submissao, tenho duvidas qto a traduçao penso aqui em “assujettisemment”) inconsciente e/ou consciente das mulheres aos principios de dominaçao masculina. Por vezes esse sujeitamento, manifesta-se simplesmente no “silencio cumplice”. Tenho por hipotse que este podera ser, um dos principais obstaculos às dinamicas de transformaçao sociais que fervilham em territorio moçambicano, no caso, personificadas pela dama do bling.

Entretanto seria interessante saber o que pensam as mulheres de todo este processo desencadeado pela dama do blingue? Seria igualmente interessante saber porque se calam as mulhres. Qual o significado deste “linchamento simbolico” para as mulheres? Sera que este “linchamento” em hasta publica convem às mulheres em geral ou a um determinado grupo de mulheres em particular?

Levanta-se aqui, creio eu, o caracter ambivalente do “sujeitamento” e as relaçoes de poder. As mulheres sujeitam-se para conquistar novas formas de poder? Ou sujeitam-se para perpetuar o poder adquirido, poder este incrustado em valores morais e de bons costumes, numa logica do “sempre foi assim”?

Carlos Serra disse...

Sim, o problema não está na "dominação masculina", para usar os termos de Bourdieu, mas na interiorização e na aceitação desse androcentrismo, como, finamente, Bourdieu demonstrou para o caso da Argélia.Quanto à intervenção feminina neste caso em debate, bem, aguardemos.

Carlos Serra disse...

Vc, caro Tivane, vai ter de explicar essa história da moral africana, está bem?

Anónimo disse...

Bom, neste debate aproveitamos alguma coisa. Por exemplo, procurarmos saber se a mulher não é conivente ao poder do homem, é muitíssimo interessante.

Mas será mesmo por conivência que ela confere muitas vezes o poder de control da sua vida ao homem? Ou é porque o seu espaco é muito restrito que se torna difícil em libertar-se. Lembro-me que um dos críticos da Dama do Bling no Notícias (não me lembro bem da dada) pediu à OMM para a sua intervencão contra a "imoralidade" (massacre às mulheres). Nem sei do porque aquele crítico recorreu a OMM quando ela é apenas uma das ligas de tantos partidos políticos - mas isto não é ainda problema. O problema é que nem ela, a OMM, nem outras organizacões femininas estão intervindo, pelo menos dar o seu ponto de vista, neste debate. Isto leva-me a suspeitar que não haja em Mocambique alguma organizacão feminina, no seu sentido real. O mesmo faco para com a juventude, pois para além de Ivânia ser mulher é tb jovem.

Carlos Serra disse...

É possível "ver" Ivânia (ou o que ela representa ou julgamos estar a representar)de muitas maneiras, de muitos ângulos. Mas tenho para mim que a questão central está no poder que queremos exercer no corpo dela, na repressão que desejamos fazer da sexualidade que ele tem, está na administração que imperativamente queremos ter daquilo que nesse corpo e nessa sexualidade é por nós permitido, autorizado. Trata-se de um verdadeiro bio-poder, de um verdadeiro sexo-poder.

Anónimo disse...

E de repente ja temos normas moralistas...Optimo.So que infelizmente estas normas estao na cabeca de cada um e sao interpretados conforme a conveniencia.

Outros ate invocaram A MORAL AFRICANA, algo que a mim me parece muito SUPREMO mas que so quem o invocou eh que conhece o seu conteudo. Talvz seja uma especia de CONSTITUICAO MORALISTA AFRICANA. Advinho que muitos terao extraido dessa constituicao a celebre frase EH NOSSA TRADICAO.

Dar uma tareia na mulher, eh nossa tradicao. Ser poligamo, eh nossa tradicao. Ser corrupto, deixando milhares sem pao por egoismo e ambicao desmedida, eh nossa tradicao.

Mas como disse num dos meus comentarios, poucos moralistas ousaram criticar o sistema que permite tanta imoralidade. Por outras palavras, independentemente do facto de Ivanea ter ou nao exagerado creio eu que deviamos questionar a existencia de normas relativas aos espectaculos publicos, principlamente quando temos criancas a assistirem estes mesmos espectaculos. A inexistencia destas normas, deixa ao criterio de cada um de nos a interpretacao do que nos eh apresentado, e muita das vezes essa interpretacao nao diexa de ser tendenciosa com a relacao ao sexo, raca origem do sujeito em causa.

SP

Carlos Serra disse...

Bem, devemos ter em absoluta atenção o que escreveu. Leia entretanto o "deixa-falar", há lá o início do diálogo a propósito.

Aguiar disse...

Ao projectarmos nosso olhar sobre bling estamos, nao mais, do que a confessar ou a tentar libertar nossas proprias sexualidades. Parafrazeando Foucault, ao fazer-se eventualmente, um discurso em funçao das normas de poder sobre a “verdade” sexual de cada um de nos, uma multiplicidade de identidades pessoais seriam reveladas; A “Repressao que (eventualmente) desejamos fazer da sexualidade da dama do bling”, depende daquilo que admitimos, serem nossas proprias sexualidades, nomeadamente, sexualidade confessada, sexualidade calada, sexualidade moral ou imoral ...
Ora Ivana, demonstra (aparentemente) estar identificada com a totalidade do seu corpo e da sua sexualidade. Pois, Ivana cria e recria atraves da dama do bling uma serie de personagens que se identificam com a sexualidade de Ivana: mulher sedutora e desejavel, mulher gravida procriadora e sedutora.

Ha alguma preversao no facto que alguem queira assumir em pleno a sua sexualidade? Nao creio. Entretanto, a reivençao e aceitaçao de novas praticas de sexualidade sim. Nao que eu assim o ache, obviamente. Mas porque a renuncia da identidade sexual ancestral de cada um e de cada outro pressupoe a afirmaçao de uma nova arte erotica, de uma nova arte de viver inédita, capaz de ligar o corpo ao prazer em todo o seu esplendor. E, em minha modesta opiniao, é isto que parece incomodar.
Libertinagem, dirao uns.
Nao, direi eu. É apenas a defesa da liberdade de ser, de agir e de pensar de cada um e de cada outro. Estou a ser anarquista? Nao. Apenas apologista da liberdade.

Liberdade, que se encontra, no antagonismo, da liberdade pratica e da nao-liberdade teorica, remetendo-nos a uma dicotomia entre a moral e a nao-moral. Dicotomia essa que vai se confluiur nas experiencias quotidianas da vida, la onde a moral e a nao-moral encontram, unissonas, o seu ponto de partida, no ritmo afinado dos acordes da vida, numa imagem real da realidade em movimento.

A liberdade por mim preconizada nao é, assim, uma fuga às normas reguladoras da sociedade, nao é marginal ao conjunto de normas que regulam os comportamentos individuais. Mas resulta sim, do jogo entre as normas reguladoras dos comportamentos individuais e dos comportamentos colectivos. i.é resulta do jogo entre a representaçao social em torno do corpo de Ivana, materializado numa das facetas de sua sexualidade, representada no personagem dama do bling e o desmonoramento dos orgaos de controle colectivo do corpo. Este jogo, per si, abre precedentes para a construçao de um espaço onde novas normas e regras acabarao por se impor, sendo assim regulamentadas, no interior do seu proprio sistema em desenvolvimento. o desenvolvimento historico das normas é fruto de jogos sociais, sem os quais nenhum poder se pode desenvolver, li isto em qualquer lado.

Foucault diz que “a sexualidade faz parte da nossa conduta. Ela faz parte da liberdade de que nos gozamos neste mundo. A sexualidade é qualquer coisa que nos criamos nos mesmos , ela é nossa propria criaçoa, mais do que a descoberta de um aspecto secreto do nosso proprio desejo. Nos devemos compreender que com os nossos desejos, e atraves deles se instauram novas formas de relaçao, novas formas de amor e novas formas de criaçao. O sexo nao é uma fatalidade ele é uma possibilidade de aceder a uma vida criativa”

Por isto penso que o processo dama do bling, moral ou nao-moral, nao mais é do que uma das facetas dos processos regularores da sociedade moçambicana em construçao.

Tenho em mim, que é absolutamente necessario tentar compreender,o proceso em causa, nas suas facetas aparentemente mais insignificantes, falar, debater, dialogar, concordar, discordar. Pois é justamente do dialogo entre moralistas e noa- moralistas, pros e contra o blinguismo e até mesmo dos indiferentes, que novas praticas sociais podem ser regulamentadas, com base nas dinamicas de transformaçoa decorrentes.

Carlos Serra disse...

Excelente, Yolanda! Excelente!

Anónimo disse...

flavio
existem tipo de danca para clubes nucturno, algumas das quais nao chegam a quele nivel de exposicao do corpo.
penso que a ofensa é o aparecimento daquele tipo de exibicao em ambientes de frequencia comum, nunca vi pessoa alguma a circular na estrada com aquele tipo de trage,
assisti aquele nudismo em minha casa ke culpa há em ter televisor ligado.

essa dama dá muito bem para discotecas de acesso restrito e voluntário. nao em minha casa como tem sido
tchau