07 julho 2009

Psicologia dos produtores da pátria (2)

Vamos lá então avançar um pouco neste complicado tema.
Permitam-me propor a seguinte hipótese ridiculamente banal: a intenção de criar uma pátria, de lhe dar um corpo e uma alma, não era nem é uma coisa fácil.
Aquelas pessoas que decidiram, pouco a pouco, em permanente conflito negocial, que Moçambique deveria ser uma pátria, que Moçambique deveria ser libertada da tutela estrangeira, essas pessoas eram audazes.
Cinco coisas, entre outras, era necessário fazer:
1. Produzir o grupo hegemónico
2. Produzir a teoria de luta
3. Produzir a história
4. Produzir o inimigo
5. Produzir a luta anti-colonial
Essas cinco coisas - colocadas como ficam sem que eu esteja certo da sua hierarquia, ainda que certo sobre a impossibilidade de separá-las - implicavam, como implicaram, muitas coisas difíceis, muitas escolhas, muitas lutas, muita severidade decisional, muita intolerância.
Nota: em qualquer momento posso alterar o que aqui deixo escrito. Se isso acontecer, surgirão a vermelho as partes alteradas e/ou acrescentadas. Seria muito bom que os leitores pudessem contribuir com outras coisas ou criticar as que aqui ficam propostas.
(continua)

5 comentários:

Anónimo disse...

Professor,
Assumindo as fases seguintes:
1ª – Nações Africanas x colonização.

 O território a que hoje chamamos Moçambique, era, antes do colonialismo, e é ainda hoje um somatório de Pátrias (Nações com, governo próprio, língua, história e culturas específicas);

 Essas Pátrias/Nações foram ocupadas e os seus cidadãos transformados em homens e mulheres oprimidos.

 As Pátrias ocupadas, ou suas parcelas (algumas foram divididas por fronteiras coloniais), por afinidades entre si, solidariedade de vizinhança, uniram-se na resistência ao invasor comum.

 A resistência ao ocupante sempre existiu, os meios é que eram desproporcionais, com vantagem para o ocupante: veja-se Ngungunhana , p.e.

2ª Surgimento de elites Africanas x Independência

 Nos territórios ocupados foram surgindo elites, resultantes de, numa 1ª fase, acesso a mais elevados níveis de formação técnico profissional e mais tarde, a níveis de escolaridade secundária, média e superior.

> Minorias com cada vez mais consciência política e cívica, para quem o valor supremo era a dignidade de ser-se livre na sua própria terra.

 Olhando para os últimos 45 anos da nossa História, vemos que a maior parte dos dirigentes da Frente de Libertação eram /são filhos de (i) pastores religiosos ; (ii) enfermeiros; (iii) professores; (iv) funcionários, ou seja: gente com uma visão mais ampla do mundo (maioritariamente do Sul, porque era no Sul que mais facilmente tinham acesso a esses niveis mais elevados de escolaridade).

 Mondlane, Marcelino, Samora, Chissano, Guebuza, Mocumbi e tantos outros, são exemplos concretos de que as grandes mudanças da História estão associadas AO DESENVOLVIMENTO INTELECTUAL DO HOMEM: “não há país desenvolvido, enquanto o Homem, ele próprio, permanecer subdesenvolvido”, sem conhecimento, fatalista, atribuindo a todos os fenómenos origem sobrenatural.

 Foi a partir deste grupo de Homens, com consciência política e cívica, que surgiu o NÚCLEO DURO do GRUPO HEGEMÓNICO que conduziu à conquista da Independência e criação do ESTADO NAÇÃO que hoje se chama MOÇAMBIQUE (somatório de várias Pátrias/Naçoes).

 O sucesso do Projecto que levou à criação do Estado MOÇAMBIQUE passou, certamente, por:

1. Identificacão do problema: ocupação/opressão/ e tudo que lhe estava associado;

2. Definição de objectivos: libertação da terra e do Homem;

3. Aglutinação:/ envolvimento dos cidadãos das Pátrias ocupadas

4. Procura de informação: para a definição de estratégias;

5. Análise de soluções alternativas;

6. Escolha da linha de actuação / Estratégia;

7. Implementação e controlo das decisões.

3º Fase – Da independência aos nossos dias

 O Estado Nação MOÇAMBIQUE adoptou a DEMOCRACIA PARLAMENTAR como sistema político.

> Periodicamente, os cidadãos, EM FUNÇÂO DAS SUAS LEGÍTIMAS EXPECTATIVAS – que não são estáticas – tem possibilidade de proceder aos ajustamentos que entenderem necessários, com civismo e elevação, na procura de uma PÁTRIA cada vez mais MÃE de todos.
___

Anónimo disse...

ao considerarmos os 5 pontos mencionados pelo professor, encontramos um problema- FACTOR TEMPO.

a Patria "criada" nao teve "up-dates" necessarios, uma vez conquistado o pricipal objectivo- INDEPENDENCIA NACIONAL.

deste modo:

1- PRODUZIR GRUPO HEGEMONICO- visava o objectivo INDEPENDENCIA (Udenamo-Manu-Unami). uma vez atingido o objectivo, apenas se previu um cenario-COMUNISMO e FRELIMO.

Nao se previu a queda da URSS nem se considerou outras opcoes de sistemas.

2-PRODUZIR A TEORIA DE LUTA- antes de 75 colonialismo, depois BANDIDOS ARMADOS.

3-PRODUZIR A HISTORIA-aqui tambem apenas se considerou e tenta-se considerar apenas a historia MONOPARTIDARIA, COMUNISTA, HEGEMONICA.

4-PRODUZIR O INIMIGO-antes COLONIALISMO e depois BANDIDOS ARMADOS

5-PRODUZIR LUTA ANTI-COLONIAL- antes da independencia.

Hoje, se considerarmos o FACTOR TEMPO, algumas questoes se levantam, que ao serem amplamente e intensamente discutidas , poderao levar-nos a ter denovo aspiracoes de PATRIA:

1- PRODUZIR GRUPO HEGEMONICO- sera apenas a FRELIMO? e os outros partidos? ja nao somos COMUNISTAS, viramos CAPITALISTAS! esse sistema sera o mais correcto para nos?

2-PRODUZIR TEORIA DE LUTA- luta armada? desarmada?etnica? racial? de ideias? criativa? ou destrutiva?

3-PRODUZIR HISTORIA-Historia sangrenta? massacres? pobreza? fome? vitoria? evoucao? desenvolvimento? sucesso? ou insucesso?

4-PRODUZIR INIMIGO- HIV? malaria? fome ? miseria? ou partidos politicos? FRELIMO? RENAMO? MDM? estrangeiros? interesses ocidentais? orientais?

5-PRODUZIR A LUTA ANTI COLONIAL- esta fora de questao. ja somos independentes. no entanto, havera sempre LUTA, em funcao do inimigo que escolhermos.

Respostas a essas seimples qustoes tambem poderao determinar se de facto somos ou nao PATRIOTICOS.

Cumprimentos
Abdul Karim

Carlos Serra disse...

Montes de questões, obrigado pelas observações pertinentes. Vamos a ver até onde poderei levar o barco.

Anónimo disse...

Peço desculpa pela minha incapacidade, mas não consigo entender o que pretende o Professor evidenciar com este tema.

Quando diz "Aquelas pessoas que decidiram, pouco a pouco, em permanente conflito negocial, que Moçambique deveria ser uma pátria, que Moçambique deveria ser libertada da tutela estrangeira, essas pessoas eram audazes.", parece estar a referir-se a situaçoes desde os primórdios dos movimentos de libertação até à Independência Nacional (Pátria).

Quando, em resposta a Abdul Karim, diz: "Montes de questões, obrigado pelas observações pertinentes. Vamos a ver até onde poderei levar o barco.", parece transportar-se para o pós-independência, como se de lá para cá não tivessemos tido pátria, ou como se necessitassemos de re-criar, construir uma nova pátria.

Qual destes dois cenários é que o Professor pretende analisar em a "psicologia dos produtores da pátria"?

Marcus

Carlos Serra disse...

Aguente, Sr. Marcus.