Cerca de dois anciãos são semanalmente linchados no distrito de Massinga, província de Inhambane, acusados de feitiçaria por seus próprios familiares e a mando dos curandeiros. Um oficial da polícia afirmou convicto que os mentores estavam a ser investigados pois são conhecidos. Afirmou ainda que ninguém pode fazer justiça por suas próprias mãos. Enquanto isso, uma mulher foi obrigada a enforcar-se na vila de Nova Mambone, na mesma província, acusada de ter sido magicamente responsável pela morte de uma pessoa num acidente de viação (Rádio Moçambique, noticiário das 6 horas).
Adenda: é muito possível que a crença na feitiçaria contribua para matar tanta ou mais gente do que a sinistralidade rodoviária ou o tão propalado conflito homem/fauna bravia. As medidas punitivas não irão nunca eliminar o problema. Nem elas nem lições de moral em comícios. O problema é bem mais complexo e diz respeito a todo um sistema estruturado de crenças, sistema que não é combatível com acções-aspirina. O que é isso? Nas palavras de Paulo Freire, são aquelas acções “cujo pressuposto fundamental é a ilusão de que é possível transformar o coração dos homens e das mulheres deixando intactas as estruturas sociais dentro das quais o coração não pode ter “saúde".
Adenda 2 às 6:41: a propósito do tema, trabalha-se para que seja lançado em Setembro o segundo livro da série Linchamentos em Moçambique, sob minha direcção, com o subtítulo "Um okhwiri que apela à purificação".
1 comentário:
O título do livro me convida.
Mas será que realmente discutimos com seriedade a problemática de acusacão à feiticaria com todas as suas consequências? É bom possível, mas parece-me deixarmos de fazer o essencial com o Prof. Serra sugere. Entretanto, também me parece ninguém dizer o que é o essencial nesta questão.
Por exemplo, o Prof Serra fala de estruturas sociais, mas eu posso confessar que não estou certo que entendo o que ele refere. Não seria bom dizer isso directamente, antes que os juristas pensem que o que quer é que os linchadores não sejam punidos, como uma vez me pareceu que assim foi interpretado?
Também, não tenho certeza que lhe entendemos quando vezes sem conta traz os anúncios dos “Doutores Abdulas”, os cura-tudo, nos jornais da praça. Tenho em mim que lemos e discutimos tudo isto superficialmente, senão como um simples papo. Estarei enganado?
Portanto, não há relação entre curandeirismo e feitiçaria? Quem e quantos entre nós os leitores deste diário não acredita no crandeirismo e feitiçaria? Quantos governantes e políticos não acreditam nos ambos fenómenos? Quantos polícias ou juristas?
Pela ocasião das eleições de 28 de Outrubro não estão muitos dos nossos políticos em contacto com curandeiros? A mim já asseguraram que a Frelimo ganha porque recorre a um curandeiro de Namapa, em Nampula, até dizem quem é a lança. No pior é que quem assim conta não são pessoas analfabetas, mas sim pessoas instruidas...
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