10 fevereiro 2008

Alguém ainda se lembra de Samora?


"É evidente que por maioria de razão não se pode tolerar que um representante nosso possua meios de produção ou explore o trabalho de outrem."
Quando da tomada de posse do governo de transição, em 1974, o então presidente da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), Samora Moisés Machel, fez um discurso do qual recordo as seguintes passagens:
“A acção do nosso governo deve ser em primeiro lugar dirigida pela nossa política. Nunca devemos sobrepor a técnica à política. Isto significa concretamente que em cada unidade produtiva, em cada ministério, em cada serviço público, através de todo o nosso país, o nosso esforço principal deve ser o de desenvolver a consciência do povo no seu destino, a consciência de que a construção de Moçambique, a liberdade, significa trabalho, liquidação da preguiça e da miséria. Queremos chamar atenção ainda sobre um aspecto fundamental: a necessidade de os dirigentes viverem de acordo com a política da Frelimo, a exigência de no seu comportamento representarem os sacrifícios consentidos pelas massas. O poder, as facilidades que rodeiam os governantes podem corromper o homem mais firme. Por isso queremos que vivam modestamente com o povo, não façam da tarefa recebida um privilégio e um meio de acumular bens ou distribuir favores. A corrupção material, moral e ideológica, o suborno, a busca do conforto, as cunhas, o nepotismo, isto é, os favores na base de amizade, e em particular dar preferência nos empregos aos seus familiares, amigos ou a gente da sua região fazem parte do sistema de vida que estamos a destruir. O tribalismo, o regionalismo, o racismo, as alianças sem princípios constituem atentados graves contra a nossa linha e dividem as massas. Porque o poder pertence ao povo, quem o exerce é servidor do povo. Quem desviar assim a nossa linha não encontrara qualquer tolerância da nossa parte. Seremos intransigentes nesta questão, como o fomos durante os duros anos de guerra. Não hesitaremos nunca em expor perante as massas as acções cometidas contra elas. Os desvios da linha suscitam as contradições, as brechas por onde penetra o inimigo, o imperialismo e as forças reaccionárias. Para que se mantenha a austeridade necessária a nossa vida de militante e assim se guarde no sentido do povo e dos seus sacrifícios, todos os militantes da Frelimo que receberam tarefas de governação do Estado tal como no passado deve renunciar as preocupações materiais, nomeadamente aos vencimentos. É evidente que por maioria de razão não se pode tolerar que um representante nosso possua meios de produção ou explore o trabalho de outrem. Combatemos durante dez anos sem qualquer preocupação de ordem financeira individual, empenhados apenas em consagrar toda a nossa energia ao serviço do povo. Está é a característica do militante, do quadro, dos dirigentes da Frelimo. Como o fizemos sempre, de acordo com as nossas possibilidades, procuramos assegurar ao militante que cumpra uma tarefa, o mínimo de condições materiais indispensáveis ao seu trabalho, ao seu sustento e da sua família. Mas também não nos devemos esquecer que muitas vezes combatemos e vencemos descalços, esfarrapados e com fome. Sublinhamos ainda que, assim como fizemos guerra sem horário de trabalho, sem dias de descanso, nos devemos empenhar com o mesmo espírito na batalha da reconstrução nacional”.
Samora morreu em 1986. Recorde aqui.

7 comentários:

Xiluva/SARA disse...

Imagino quantos camaradões não festejaram logo no dia da sua morte. E imagino quantos desses não são agora os grandes capitalistas do Estado. Não devia estar bom agora o estado da Nação?

Anónimo disse...

e os "camaradões" devem ter esgotado o champagne no país...
JDF

Anónimo disse...

Manos espírito de Samora nem hoje está descansado. Quizumba festeja com carne de morto.

AGRY disse...

Sobre Samora Machel não pode haver meio termo. Ou se ama, ou se odeia.
Não tenho capacidqde de síntese para me permitir, num breve comentário, caracterizar o
primeiro presidente de Moçambique.
Inventariar as suas virtudes e defeitos é um risco que não me atrevo a ensaiar.
Talvez possa arriscar alguns simulacros de comentários, coisas desgarradas, ambíguas(?)
Ocorre-me, agora, uma ideia que me persegue há anos. Refiro-me ao conjunto das grandes e polémicas decisões tomadas logo a seguir à independência.
Sobretudo após a sua morte, os detractores surgiram e multiplicaram-se como cogumelos! Para estes, as grandes opções que acompanharam a fase inicial da pós-independência, foi um período negro caracterizado por decisões que hipotecaram o desenvolvimento e a credibilidade de Moçambique.
À distância de três décadas, muitos de nós podem condenar algumas daquelas decisões.
Importa, desde já, que saibamos dividir-nos em dois grandes grupos: o primeiro constituído por cidadãos que sonham, que aspiram, a substituir-se ao colono; um segundo grupo, mais arejado, mais aberto, mais tolerante, apostado em construir uma sociedade radicalmente diferente da que foi arquitectada pelo opressor.
Bem, regresso às grandes decisões com uma pergunta:
Será que quando se nacionalizou a medicina, por exemplo, a adesão dos moçambicanos, a esta medida, não foi total e espontânea? Então por razões de coerência e de ética não se deveria reconhecer que, se houve erro, são inúmeros os cidadãos co-responsáveis, ao invés de se diabolizar Samora Machel atribuindo-lhe o ónus da desgraça?
Em síntese e regressando ao inicio deste comentário. É possível e desejável evocar-se o período inicial da governação de Moçambique. Penso, no entanto, que qualquer tentativa séria, politica e eticamente isenta, deve obedecer a princípios geralmente consensuais: situar os factos no tempo histórico e eliminar, ao máximo, as cargas subjectivas que estas tarefas geralmente transportam

Anónimo disse...

Quando Samora morreu, eu ainda estava na escola primaria. Como entravamos por volta das 6:30h, lembro-me de ter ido a escola apesar da radio ter ja anunciado o acidente de aviacao, mas sem que ainda se soubesse o seu desfecho. Claro que nao tivemos aulas pois ja se sabia que o nosso Presidente tinha perecido e quando regressei a casa, vi minha mae chorar! Eu era miudo mas pude perceber, naquele momento, que apesar das dificuldades que todos nos passavamos (lembro-me perfeitamente das autenticas batalhas diarias para comprar pao na cooperativa, em que eu pequenino tinha q disputar "taco a taco" nas longas filas com empregados matuloes e arruaceiros) havia uma ligacao "intima", cerebral e muito espiritual, entre Samora e o seu povo! Esse nao e' um exercicio meramente "fonetico", mas envolve partilha de ideais, principios, procedimentos e muito fundamentalmente, todos eles consolidados com a PRATICA e o EXEMPLO! O povo, mesmo analfabeto como o nosso, percebe "isso" com tanta clareza como se fosse distinguir a agua do vinho! Mesmo se, a Samora e sua governacao, podem ser atribuidos varios erros, e as dificuldades que todos no's vivemos na altura, o porque' de olharmos para aquele periodo com saudade e comparamdo-o com o actual (inclusive sem guerra) acabamos percebendo que estamos pior?? O que difere esses dois periodos e os seus respectivos governos (do mesmo partido)?? Nao sera' esse distanciamento governo-povo?? Fonetica avulsa, completamente dispersa da atitude, pratica e exemplo?? Governo que nao inspira o seu povo para dar o seu maximo na reconstrucao coordenada da nossa nacao?? A Frelimo deve pensar seriamente e questionar-se a si propria, se a libertacao do pais e a salvaguarda da nossa soberania se resume apenas em garantir a participacao dos seus mais altos membros nos mega-empreendimentos que vao proliferando pelo pais, mas q pouco ou nada acrescentam ao bolso do seu pacato cidadao?? ESTE POVO E' TRABALHADOR...INSPIREM-NO E MOBILIZEM-NO A CONSTRUIR ESTE PAIS!!

Anónimo disse...

Sim lembramos
.... fomos convidados à casa do Camrada Presidente Samora e da Camarada Josina em Dar-es-Salaam em 1970. Samora era um homem com muita carisma e encanto, muito autoritário e com muito carinho para com o povo.
Bosse H

Anónimo disse...

lembro-me do Presidente Samora, num Comissio popular, eu era ainda criança, assistia aquele comissio atentamente, era uma coisa maravilhosa ver o presidente Samora a falar, aqueles seu discursos que enchiam as esperanças de milhares de moçambicanos, menos os mais ambiciosos