18 agosto 2007

Criminalidade: os problemas dos problemas (2) (fim)

Não estou certo de que a criminalidade tenha aumentado em Maputo (apenas da capital aqui escreverei, porque o problema é bem mais complicado se quisermos analisar o fenómeno a nível nacional) em termos absolutos (tentei mostrar isso há dias em debate na STV), mas estou certo de que aumentou em termos relativos.
A nossa memória é curta e certamente já nos esquecemos dos picos criminais nos anos 8o, especialmente em 1981 e 1982, na margem da Operação Produção.
Mas é evidente que a criminalidade específica aumentou e reveste aspectos muito especiais desde 2006. Falo designadamente (1) dos assaltos a instituições e estabelecimentos onde o dinheiro existe (e onde, provavelmente, existe numa quantidade previamente sabida através de canais de informação secretos) e (2) dos assassinatos selectivos de um certo tipo de polícias (com excepção do polícia de trânsito há tempos assassinado, tenho em conta um agente da segurança do Estado, os agentes da ex-brigada mambas e, agora, os três agentes da Polícia de Investigação Criminal).
Aqui há dois pormenores a considerar: em primeiro lugar os assaltos estão a ser conduzidos quando a polícia (incluindo a militar e a de trânsito) está em peso nas ruas, num aparato de exposição e de revista singular na cidade de Maputo; em segundo lugar, os assassinatos parecem estar a ser conduzidos especialmente contra polícias que trajam à civil -digamos detectives -, o que significa, por hipótese, que estes são conhecidos pelo que fazem em áreas sensíveis de pesquisa criminal.
Esses dois aspectos apontam, por hipótese, por um lado para eventuais infiltrações (incluindo o acesso a informação sigilosa) de redes criminais na informação mais confidencial da polícia e, por outro, para conivências sistemáticas. É como se o cenário fosse este: assalta-se um local com o apadrinhamento de um determinado sector policial e matam-se depois aqueles que investigam o assalto e a conivência (ou que poderiam investigar).
De qualquer das formas, o aparato policial que existe neste momento na cidade de Maputo é apenas isso: um aparato. Melhor: é uma acção-aspirina, uma acção que tem em vista atenuar a febre de um corpo na ignorância de que se está perante uma doença complicada que requer tratamento médico adequado.
Por isso é difícil saber em que se baseou o ministro do Interior quando há dias afirmou que o crime violento iria ser controlado até Dezembro.
Provavelmente o ministro não controla os sectores sensíveis da sua polícia. Assim sendo, não controla sectores fundamentais do Estado eventualmente já minados por redes criminais poderosas, em processos subterrâneos de aliança e ajuste de contas.
Já não se trata de um mero problema criminal. Trata-se do problema da segurança do Estado (provavelmente já com outros tentáculos de natureza desconhecida), da sua impermeabilização, especialmente nesta Maputo importante e apetecida por ser: (1) porta de entrada para programas de cooperação e ajuda internacional; (2) ponto de cristalização dos investimentos estrangeiros; e (3) saída portuária estratégica para o Gauteng, coração geográfico sul-africano.

11 comentários:

Anónimo disse...

o que tem a ver a porta de entrada com os programas de cooperaçao,e a criminalidade em Moçambique?

Anónimo disse...

O aumento da criminalidade é proporcional as desigualdades economicas? se assim fosse o mundo seria um faroeste global!

Carlos Serra disse...

Acha que não? O que tem a ver um braço com o coração?

Reflectindo disse...

Há horas atrás depois de eu ter lido a notícias dos três polícias mortos no Notícias rabisquei algo no meu blog ainda a contar com todos e não menos com Prof. Serra.

Com a minha fraca e fraquíssima maneira de pensar, penso que a solucão não passa pelo que alguem disse que Guebuza devia declarar guerra contra o bandistimo armado, porque mesmo no exemplo dado do Machel, o resultado não foi efectivo, e, porquê?

Para mim, parece que tudo está a voltar para algum tempo e os que decidem nunca olham pelas consequências enquanto que os oportunistas aproveitam isto como os ricos de hoje aproveitaram a transicão da economia planificada para a economia do mercado livre.

Reflictamos mais!

Carlos Serra disse...

Estamos perante um problema de grande complexidade. E devo confessar a minha ignorância em perceber a coluna vertebral dessa complexidade.

João Feijó disse...

Uma teia muito complexa que já vinha a ser investigada ainda por Carlos Cardoso, mas que agora parece ainda mais complexa... Só acrescento uma achega: Presumo que o índice salarial das forças de segurança seja claramente tão inferior ao de outros grupos que a tentação para os levar a vender informações relacionadas com a investigação é enorme.

mozinovador disse...

Quem disse "Guebuza deve declarar guerra ao banditismo armado" fui eu algures neste blog.

Nao creio que essa declaracao deva ser explicita ou materializada por uma accao unica, como o foi a operacao producao.Nem que esta declaracao se traduza por um aumento de policias nas ruas, como hoje se verifica. Plagiando o autor deste blog..solucoes aspirina nao. A dor de cabeca, por ser resultado de algo mais complexo.

E pra mim, esta onde de criminalidade eh algo muito complexo, com varias origens e eh parte de um fenomeno ciclico. A solucao nao passa apenas por accoes isoladas, passa por um conjunto de medidadas integradas. Medidas multidisciplinares.

E quando digo declarar guerra, digo juntar meios, tomar medidas, implementar accoes tendentes nao so a estancar a actual progrssao do crime, mas tambem eliminar os males que alimentam este surgimento de criminosos.

Anónimo disse...

os programas de cooperaçao, digo a ajuda ao desenvolvimento agora sao pau para toda a obra, à semelhança da luta contra a pobreza...

Carlos Serra disse...

E também, claro, não é nada fácil investigar o que se passa.

Reflectindo disse...

Para mim, parece que os que o problema é complexo, os que não sabem a origem, os inquietados, os espantados, sejam os que podem procurar solucões melhores que aqueles que já nos prometeram que até Dezembro tudo estará resolvido.

Carlos Serra disse...

Leiam a última entrada sobre a fuga de informação.