Fui ontem entrevistado pela STV sobre racismo em Moçambique. Recordei-me, depois, do problema da distribuição das quotas regionais nos cargos do Governo Provincial do Niassa. Achei bem, então, propor-vos a leitura do livro cuja capa figura na imagem, editado pela Livraria Universitária da Universidade Eduardo Mondlane em 2000.
Sonhadores, os sociólogos sempre procuraram duas coisas: as leis do social e a reforma das sociedades. Cá por mim busco bem pouco: tirar a casca dos fenómenos e tentar perceber a alma dos gomos sociais sem esquecer que o mais difícil é compreender a casca. Aqui encontrareis um pouco de tudo: sociologia (em especial uma sociologia de intervenção rápida), filosofia, dia-a-dia, profundidade, superficialidade, ironia, poesia, fragilidade, força, mito, desnudamento de mitos, emoção e razão.
3 comentários:
Professor,
Citação do filósofo e escritor norte-americano O.S.Marden:
“Todos os seres humanos, desde o mais rude selvagem ao sábio mais culto, têm idêntica natureza espiritual, são essencialmente iguais e possuem as mesmas potências e faculdades e os mesmos meios ou instrumentos de manifestação e expressão.”
“ A desigualdade entre seres humanos não é de essência, mas de grau de evolução. No sábio, as potências mentais, no santo, as morais e no atleta, as físicas, desenvolveram-se com bastante vigor para ultrapassar em alto grau a média comum da humanidade, ao passo que no ignorante, no malvado e no fraco estão latentes e à espera de desenvolvimento, como a semente que, no embrião, contém todas as partes da futura planta”.
Assumindo racismo como:“doutrina que preconiza a supremacia e superioridade de uma(s) raça(s) sobre outra(s)” importa saber se, entre nós, no relacionamento entre cidadãos de diferentes raças há comportamentos que evidenciem situações em que os de uma raça, de forma aberta ou camuflada, revelam sentimentos de superioridade ou inferioridade perante a outra.
No meu entender – embora a experiência colonial tenha deixado vestígios de racismo –, entre Moçambicanos negros e brancos, bem como entre Moçambicanos (negros ou brancos) e as comunidades estrangeiras que permaneceram em Moçambique no pós independência, o racismo foi razoavelmente ultrapassado, não constituindo hoje problema preocupante: aceitam-se e respeitam-se as diferenças (nem melhores nem piores: diferentes).
Porém, no caso dos “vientes”, novos residentes estrangeiros, maioritariamente de raça não negra (brancos, chinas, indianos, árabes) observamos frequentes casos de comportamento francamente racista: é notória uma mentalidade de tipo neocolonialista: de apropriação/exploração fácil dos recursos do país (económicos, financeiros, humanos). Não raras vezes, ao estatuto de “patrão = poder económico” está ligado um sentimento de pretensa supremacia racial.
Há exemplos eloquentes pelo país fora dum acumular de situações indignas no relacionamento entres alguns “vientes” e a população, em diversos sectores de actividade económica. O sector do Turismo é paradigmático, assiste-se a uma forte pressão dos “vientes” no sentido do reencaminhamento do Moçambicano para a situação de “estrangeiro” na sua própria terra.
> O Ministro Sumbana tem de olhar para o que se está a fazer ao longo da nossa Costa: investimento estrangeiro Sim, mas com regras: não basta ter Leis, é preciso aplicá-las.
Um Abraço,
Florêncio
Obrigado pelos comentários, mas creio que o racis mo é uma coisa bem mais completa. Especialmente se pensarmos no racismo sem raça...
Racismo sem raça? O racismo resulta da percepção e crença de que uma raça é superior a outra. Como poderia haver racismo sem raça? Podem, sim haver outros fenómenos similares, como por exemplo, a percepção e a crença de que uma tribo (ou etnia) é superior a outras. Aqui designamos isso por tribalismos. Ou a crença de que um Professor universitário é essencialmente superior a um operário. A isso chamamos elitismo.
Professor, o que seria racismo sem raça?
Creio que é importante estarmos atentos ao racismo como ele é percebido aqui em Moçambique e no mundo inteiro. É um fenómeno que não desapareceu. Está bem presente no dia a dia das nossas vidas. Claro que, hoje, resulta raro e anacrónico alguém vir proclamar que é superior por pertencer a uma raça. Mas muitos estereotipos, muitos estigmas, resultam precisamente do racismo. Um exemplo: em Moçambique está-se mais disposto a conviver com a abastança, o bem-estar ou a riqueza de um branco. No entanto, a riqueza de um negro gera sempre desconfiança. Quando se fala de corrupção aqui, tem-se em vista um negro. No geral, as pessoas não estão à espera que se acuse um branco pela prática da corrupção. Um branco constroi uma bela casa? pois, isso é normal. Um negro constroi algo similar? Torce-se o nariz e começam as indagações sobre onde esse negro poderá ter encontrado o dinheiro. Insunua-se algo sobre a sua honestidades e a reputação desse indivíduo foi-se... Para mim as práticas de racismo assumem estes contornos, algo camuflados.
Issa Mamade
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