11 janeiro 2007

Corrupção e enriquecimento elitário em Moçambique

A análise da Global Integrity salienta o seguinte em relação a Moçambique:

"Corruption in Mozambique is made possible by the very nature of the Mozambican state, where the power of the ruling party overlaps with the state machinery. Despite massive fraud, especially in the privatization process, no senior government representative has ever been convicted, so corruption continues with impunity. In this small African country, pledges to strengthen transparency and integrity are easier said than done.The history of how Mozambique's political elites have enriched themselves has been amply documented. It essentially resulted from the country's calamitous privatization projects and the squandering of bank resources. More than 10.4 trillion meticais (US$400 million) disappeared from the banking system in the 1990s. The state was forced to repay the money."

Quero crer que vozes haverá aqui que escolherão, agora, um dos cinco comentários seguintes (ou deles farão combinações proteicas): (1) o país não está preparado para discutir a corrupção; (2) os critérios de avaliação são vagos; (3) há coisas mais importantes do que discutir corrupção; (4) eles deviam antes preocupar-se com a corrupção dos chamados países desenvolvidos; (5) corrupção é sintoma de desenvolvimento.

14 comentários:

Anónimo disse...

6. small african country?

Carlos Serra disse...

"small" africain corruption...

Anónimo disse...

Corrupção e corrupção. Não há nem grande, nem pequena. A propósito, eu que nasci depois da independência pergunto aos mais velhos, TERÁ HAVIDO UM MOMENTO DA HISTORIA DE MOÇAMBIQUE EM QUE este pais foi livre da corrupção? Como eram esses tempos?

Anónimo disse...

Desculpem-me a insistência, mas acho que a única coisa que mudou desde aqueles tempos e a democracia.
Por que o resto continua na mesma.
Falta para muitos escolas, hospitais, comida; com a mínima diferença do facto desta carência ser em tempos de paz. Porque se fosse naqueles momentos, diriam-nos "quando estamos em guerra, a prioridade e guerra" e tudo se justificaria.
Sem ser muito pessimista, há outros aspectos que mudaram: os que nos encorajavam a não roubar, hoje são os patrões indiscutíveis.

Carlos Serra disse...

Está para breve a divulgação de um trabalho sobre a corrupção nas escolas.Aguardemos.

Carlos Serra disse...

O trabalho do CIP sobre a corrupção na Educação já está disponível no seu portal e aqui no meu.

11/1/07 7:26 PM

Anónimo disse...

Caro Professor,

Permita-me um breve comentário, elaborado tendo em conta as limitações de um blog. Confesso que simpatizo muito pouco com este tipo de relatórios. Nem lhes encontro mérito.

Aliás, como é que esses missionários que nos querem moralizer à força constroem os seus índices de corrupção? É com base em casos de corrupção julgados? Não! (são tão poucos por aqui). É com base em denúncias fundamentadas que deram entrada na procuradoria, independentemente do seu desfecho? Também não! (que por cá não abundam as denúncias fundamentadas). No geral, é com base em respostas de executivos de empresas internacionais que operam no país, baseadas nas suas percepções, e que respondem a um questionário que lhes é submetido. Se atendermos à ideia generalizada de que a corrupção afecta o mundo dos negócios, o que é que essas empresas fazem em Moçambique? Será por amor a África ou por pena aos pobrezinhos dos africanos? Os resultados financeiros dessas empresas (a começar pelos bancos) recusariam esta resposta. São tão gordos!

Então, das duas uma. Ou a corrupção não é tão alta assim, de outro modo, os seus resultados não seriam assim tão famosos. Ou então, os custos da corrupção estão institucionalizados no nosso país e, assim, eles se constituem em factor de previsibilidade, aparecendo neste contexto incorporados no processo de tomada de decisão por parte dos empresários. Os actos de corrupção são repetitivos, estruturados, constituindo assim um código tarifário e de conduta não escrito que ajuda os agentes sociais a tomarem decisões com elevado grau de previsibilidade. Isto significa, talvez, que pelo facto de o país estar a construir o seu Estado, com todas as suas instituições (Justiça, Administração Pública, Polícia, Capacidade de investigar crimes, Sistemas financeiros, etc.) a corrupção não aparece devido a um desvio moral específico dos moçambicanos ou da sua classe dirigente. Estou a tentar dizer que, talvez, a corrupção esteja ligada à fraqueza institucional generalizada do país. Claro que me dirão que os políticos é que tornam as instituições fracas de propósito. Só que o grau de fraqueza institucional de que padecemos é tão grave que, a ser provocada por humanos, esses tinham que ser verdadeiros génios ou, então, tinham que estar dotados de força hercúlea. A minha suspeita é que, não sendo estúpidos, os executivos das empresas sabem disso. Então porque mostrar um país onde é quase impossível fazer negócios?

Suspeito que é por matreirice! querem afastar concorrentes. Outros empresários, crédulos, terão receio de lhes vir fazer concorrência. Juro que não encontro outra explicação.

Gabriel S. Muthisse

Anónimo disse...

O Gabriel Muthise pode ter razão.
Todavia, gostaria de o encaminhar para um elo/link onde poderá saber quem são as pessoas que fazem a primeira avaliação destes relatórios, a forma como os dados são colhidos, etc. Para os que não tiverem tempo, adianto que a Global Integrity tem uma equipa cá em Moçambique constituída por

1 Reportes principal que faz a recolha de informação e rediz a primeira versão do relatório
1 Cientista Social principal que compila os primeiros scores (pontos, em português mal traduzido)e indicadores de integridade
2 a 6 leitores nacionais constituído por pessoas que vivem em moçambique, não importando que sejam necessariamente todos moçambicanos
que, "cegamente (sic)fazem as leituras e dão os seus pareceres sobre o assunto.
Pior de tudo isso e que nos não sabemos quem são estas pessoas.
A propósito veja: http://www.globalintegrity.org/documents/2006methodology.pdf

Com isso não quero dizer que o relatório e bom ou mau.
Eles fizeram a sua pare e por isso vão continuar.

Carlos Serra disse...

Interessantes as posições de Muthisse e de Egídio. Oiça, ó Muthisse: você tem escrito sobre a corrupção. Quer escrever um texto problematizador para eu aqui publicar com destaque? Abraços a ambos.

Carlos Serra disse...

Muthisse: já leu o relatório sobre a "pequena" corrupção do CIP? Como sabe, é o Marcelo Mosse quem dirige o centro. O texto, de 41 pp., está disponível aqui no meu portal.

Anónimo disse...

Caro Professor,

Sem compromisso quanto a prazos (esta palavra começa a meter-me medo dada a frequência com que me é repetida) vou tentar escrever um texto sobre esta matéria. Já vi que os textos do Professor são muito curtos. Só não sei se conseguirei imita-lo no que se refere a poder de síntese.

Não Tinha lido ainda o relatório do CIP. Como disse antes, simpatizo pouco com a metodologia empregue para se produzirem os relatórios sobre a corrupção que, muito frequentemente, nos´são dados a consumir. No entanto, irei faze-lo desta vez.

Muitos cumprimentos Professor.

Gabriel S. Muthisse

Anónimo disse...

O sr.muthisse, faz uma análise interessante, parte da desqualificação da metodologia usada para esta pesquisa sobre corrupção e sumariamente encontra explicação ou justificação no deixa andar da corrupção em teorias conspiratórias. A minha experiencia nesta área de pesquisa sobre fenómenos sociais como corrupção, muito dos relatórios escondem dois aspectos: 1- os pesquisadores têm problemas em transformar os objectivos ou research problems em perguntas respondíveis (devido a complexidade do problema), 2- dificuldades em encontrar pessoas ou população afectada pelo problema (vitima versus transgressor/agressor)

Em muitas instituições em Maputo notamos que muitas das decisões feitas são na base de um relatório de planos de actividades e não um relatório de uma pesquisa. Confundir este dois documentos, esta institucionalizado em Moçambique, pior nas instituições do governo.

Esta cultura de negar o que outros pesquisam sobre nos, negar legitimidade de uma pesquisa porque foi elaborada por outros, justifica esta falta de cultura para analisar e dar importância a pesquisa na procura de soluções. Social research tem um valor inestimável não só no funcionamento institucional mas também na maneira como queremos que os outros nos chamem profissionais.

Anónimo disse...

Professor, permita-me tecer um mui longo comentário ao “Estudo” do CIP, que acabei de ler. Este estudo, nas suas conclusões, destaca cinco aspectos. Desses cinco gostaria de me centrar em dois deles, nomeadamente os que referem que, (i) ao nível político, a corrupção na Educação distorce a alocação de recursos para os orçamentos do sector, fazendo com que ele seja no geral mal financiado e que isso decorre do facto de os decisores políticos preferirem investimentos pesados (procurement de grandes projectos de construção) em detrimento de investimentos leves (como os custos diários da gestão das escolas, por exemplo), dado que nos primeiros investimentos há mais oportunidades para a corrupção que nos segundos e (ii) a nível ministerial, a corrupção envolve o desvio de fundos associados ao procurement, construção e os fundos destinados a serem alocados nos níveis inferiores do sistema e que os fundos para o sector da Educação podem ser desviados nos níveis administrativos e políticos por administradores corruptos, funcionários públicos e políticos mesmo antes de os mesmos chegarem às escolas.

Podemos acreditar nestes resultado? Para responder a esta pergunta podemos ir muito mais longe ainda, começando por avaliar a correlação entre os objectivos da pesquisa e os instrumentos chamados a dar resposta a esses objectivos. A credibilidade dos resultados de uma pesquisa depende de os seus objectivos científicos não estarem muito para além daquilo que os instrumentos podem dar. Avalizar se é verdade ou não que a corrupção distorce a alocação de recursos para os orçamentos do sector depende do exame dos instrumentos de pesquisa usados e a sua correlação com os objectivos científicos proclamados.

Um dos objectivos específicos do “estudo” é elaborar uma compreensão crítica e prática sobre a dimensão e manifestações da corrupção no sector da Educação em Moçambique. Este é um objectivo político geral e não um objectivo científico. Um objectivo científico é aquele que pode ser alcançado através do uso de instrumentos científicos. O objectivo científico deve ser definido de maneira a traduzir o âmbito do estudo e os seus instrumentos.

Por exemplo, Compreender os mecanismos da corrupção no sector da Educação em Moçambique pressupõe-se que esteja no âmbito de estudo de percepções, cujos instrumentos pertencem à sociologia, antropologia ou psicologia. Avaliar como a corrupção penaliza o funcionamento do sector da educação (terceiro objectivo específico) pressupõe o âmbito de estudos de eficiência e/ou eficácia, cujos instrumentos pertencem às ciências de administração.

Estes objectivos resultam em diferentes objectos de pesquisa, critérios de medição, instrumentos e amostras. Será importante realçar aqui que não se deve colocar objectivos científicos para a pesquisa que estão para além do que os instrumentos podem dar. Um erro comum em pesquisa tem sido dar respostas a muitas perguntas com instrumentos limitados. O resultado é a descredibilização da pesquisa. Nestas circunstâncias, a pesquisa pode ser entendida como tendo sido instrumentalizada para servir fins políticos. Para evitar este tipo de interpretação seria importante ter a certeza que não são propostos objectivos científicos para além do potencial científico dos instrumentos.

O pesquisador informa-nos que, numa primeira fase, realizou entrevistas exploratórias a informadores privilegiados seleccionados na base do seu envolvimento reconhecido no sector da Educação, sejam eles médicos, enfermeiros, técnicos de medicina, serventes, técnicos de farmácias, (Como assim?), oficiais de procurement, dirigentes do Estado. Em termos de metodologia de pesquisa, o relatório não se alonga por aí além. Não sabemos por exemplo com que base foram seleccionadas as pessoas a entrevistar e desconhecemos também o tipo de perguntas que foram colocadas nas entrevistas.

No entanto, numa das passagens do relatório somos informados que “o estudo concentrou-se na pequena corrupção. Isto quer dizer que aspectos importantes desta área como o procurement e a execução orçamental, que estão dentro do que se convencionou chamar de “grande corrupção” foram postas de lado, podendo ser objecto de pesquisa futura. Assim, o quadro que traçamos fica incompleto, muito embora, ao longo da pesquisa, fomos recebendo pistas, sinais e percepções de que, tanto ao nível do procurement como ao nível da execução orçamental, existem práticas de corrupção sedimentadas em Moçambique.” Teremos, assim, que aquelas pesadas conclusões, a que me referi acima, foram baseadas apenas nas tais “pistas, sinais e percepções”? Não será que estas conclusões estão baseadas nos preconceitos do pesquisador?.

Note-se que não estou a negar que aqueles factos ocorram em Moçambique. O que estou a dizer é que esta pesquisa não possui potencial para chegar àquelas conclusões.

Gabriel S. Muthisse

Carlos Serra disse...

Meu caro Muthisse, acabo de ler o seu comentário. Eu agradeço e quero crer que os vários leitores deste espaço tb agradecerão. Tenho para mim que fez uma leitura atenta do relatório do CIP e que o comentou de forma honesta. Espero que alguém do CIP possa aqui responder, com suficiente conhecimento de como o edifício da pesquisa foi efectuado. Vamos, assim, aguardar a possível sequência do debate. Um abraço.