Sonhadores, os sociólogos sempre procuraram duas coisas: as leis do social e a reforma das sociedades. Cá por mim busco bem pouco: tirar a casca dos fenómenos e tentar perceber a alma dos gomos sociais sem esquecer que o mais difícil é compreender a casca. Aqui encontrareis um pouco de tudo: sociologia (em especial uma sociologia de intervenção rápida), filosofia, dia-a-dia, profundidade, superficialidade, ironia, poesia, fragilidade, força, mito, desnudamento de mitos, emoção e razão.
31 dezembro 2009
O preço da tirania
No "Savana", sobre o Zimbabwe e com o título em epígrafe: "Enquanto o país vive na pobreza e continua no caminho do colapso acompanhado do desemprego, desabrigo e desespero, uma pequena minoria que está no poder desde 1980, tornou-se tão rica para além de qualquer imaginação. Fazem compras em Dubai e Joanesburgo, e passam férias nas ladeiras de neve da Europa. Os seus filhos vão para as mais refinadas universidades e escolas do mundo. Muitos têm no Zimbabwe mansões que seriam de invejar no Ocidente."Tribuna do editor Fernando Gonçalves
Da Tribuna do Editor do semanário "Savana" desta semana, assinado por Fernando Gonçalves: "Tornou-se recorrente nos dias que correm, entre alguns analistas, tentar fazer passar a ideia de que existe uma conspiração ocidental para derrubar os governos africanos representados por partidos que tenham ascendido ao poder pela via da luta armada. Muito francamente, penso que nada disso estará tão distante da verdade. Esse discurso é muito conveniente para aqueles que pretendem furtar-se à responsabilidade de primar pelos princípios da boa governação, prestação de contas e de respeito pelos seus povos. É também um discurso que pretende transmitir a ideia de que os governos surgidos dos movimentos de libertação têm o direito natural de governar os seus países para a eternidade, e de fazerem tudo o que quiserem, mesmo quando tal não corresponde aos interesses nacionais. Confunde-se o interesse nacional com o interesse do partido libertador em se manter no poder a todo o custo."Dimas Marrôa e MDM figuras do ano no "Savana"

Atenção edil Simango de Maputo
(154) 31/12/09

30 dezembro 2009
Sintam (Nancy nasceu em Moçambique)
Adenda: uma vez mais obrigado ao Ricardo, meu dedicado correspondente em Paris, por chamar a minha atenção para esta bela voz cabo verdeana e para o país onde nasceu. Para o país de nascimento de Nancy, conferir aqui.
Dhlakama: o texto e o intertexto (2)
Mais um pouquinho desta série.Um pouco por todo o lado, Dhkalama tem sido apresentado como fala-barato, como inconsequente, como louco, como tendo perdido o juízo. Esse quadro quase clínico, quase patológico, é propício a esconder aquilo que nele é actividade política, mesmo que ela desgoste e irrite certos quadrantes.
Por hipótese, o presidente da Renamo busca exactamente surgir como perseguido pelo partido no poder, como combatente da liberdade e da democracia, como vítima da repressão policial. Estar com residência vigiada pode ser uma coisa boa, politicamente falando. Mas não só.
A "ordem da natureza"
Um casal de homosexuais está detido no Malawi acusado de atentado ao pudor ao realizar pela primeira na história do país um casamento simbólico. Uma jurista disse que o casamento era ilegal e que o código penal protegia o que chamou "ordem da natureza". Confira a notícia em inglês no The Daily Times do Malawi (que usou a expressão "gay lovebirds") e em português na Angop.Observação: fascinante expressão essa, a da "ordem da natureza". Entretanto, saiba do estigma e da penalização que recaem sobre a homosexualidade aqui. A minha posição encontra-se aqui e aqui.
O que é fraude eleitoral?
Tendo como referência as eleições de 28 de Outubro (mas também poderíamos referir eleições anteriores), usam-se, a vários níveis de opinião, palavras e expressões do género "irregularidades", "problemas"", "fraude" e "ilícitos eleitorais". No acórdão do Conselho Constitucional n.°30/2009 de 27 de Dezembro que valida e proclama os resultados das eleições presidenciais, legislativas e provinciais de 28 de Outubro, o termo fraude está omisso.O que é fraude eleitoral? Socorramo-nos de uma definição existente na internet, a saber: "Uma fraude eleitoral é a intervenção deliberada numa eleição com o propósito de impedir, anular ou modificar os resultados reais, favorecendo ou prejudicando algum candidato, partido ou coligação."
O rumor de Marínguè
Lenda urbana, boato ou rumor é "um relato anónimo, breve, com múltiplas variantes, de conteúdo surpreendente, contado como verdadeiro e recente num meio social do qual exprime de maneira simbólica os medos e as aspirações" (in Renard, Jean-Bruno, Rumeurs et légendes urbaines. Paris: PUF, 2006, 3.e éd, p.6).Dhlakama: o texto e o intertexto (1)
Há indicadores de que os movimentos do presidente da Renamo, Afonso Dhlakama, estão a ser cerradamente vigiados. E, provavelmente também, os de figuras séniores desse partido.Tendo anunciado manifestações de protesto contra os resultados eleitorais de 28 de Outubro, inicialmente em tom violento, situando-as depois na lei e no pacifismo, Dhlakama viu virar-se contra si e contra a Renamo toda a máquina policial preventiva do Estado. A esse nível, Nampula - onde Dhlakama está a residir - viu reforçado o seu dispositivo policial.
Formalmente, Dhlakama parece ser vítima da sua "natureza violenta" (expressão do agrado de certos sectores), parece não ter tido em conta a musculada resposta adversária, parece ter-se citadinamente esquecido de que foi comandante de guerrilha, parece ser agora prisioneiro de um erro táctico na sua estratégia manifestacional.
Porém, pode acontecer que o que se está a passar tenha sido deliberadamente previsto por ele, pode acontecer que estejamos perante um percurso táctico rigoroso numa estratégia política bem mais ampla do que pensam certos quadrantes.
O afropessimismo de Salah Sheikh
(153) 30/12/09
Também o "Notícias" referiu as muitas iregularidades do processo eleitoral assinaladas pelo Conselho Constitucional, aqui (confira também o "O País" aqui). Entretanto, os novos deputados tomarão posse no dia 12 de Janeiro do próximo ano. Todavia, o presidente da Renamo, Afonso Dhlakama, asseverou há dias que os deputados do seu partido não tomariam posse. Enquanto isso, não há ainda indicação de quando esse partido organizará manifestações que prometeu fazer a nível nacional como protesto contra os resultados eleitorais, que considera fraudulentos.Adenda 2 às 7:46: preste atenção a artigos de opinião do seguinte género laudatório, aqui.
29 dezembro 2009
Sintam
Adenda: obrigado ao Ricardo, meu dedicado correspondente em Paris, por me ter sugerido aqui recordar o maliano Salif Keita, um dos mais populares cantores do mundo.
Para onde vai o Irão?

Salomão Moyana

Deviz e Mambas no "Magazine Independente"

O semanário "Magazine Independente" desta semana elegeu Deviz Simango (presidente do Movimento Democrático de Moçambique) e a selecção nacional de futebol Mambas, como figuras do ano. Em texto de Lourenço Jossias e da redacção, o jovem edil do município da Beira é extensamente descrito, analisado e elogiado - "(...) que se levantou e escolheu um caminho: o caminho de fazer política a sério" - na p. 3 do jornal.(152) 29/12/09
Após a validação e proclamação dos resultados eleitorais pelo Conselho Constitucional, o porta-voz da Renamo, Saimone Macuiane, já veio a público dizer que o seu partido não aceita esses resultados e que liderará "manifestações pacíficas à escala nacional, em nome da democracia, da paz e da liberdade." Isto, enquanto os militantes do partido dado como vencedor, a Frelimo, festejam a vitória.28 dezembro 2009
(151) 28/12/09
A Rádio Moçambique tem estado a fazer uma cobertura nacional a partir da validação e proclamação hoje dos resultados das eleições de 28 de Outubro pelo Conselho Constitucional. O presidente reeleito, Armando Guebuza, estava satisfeito e falou em vitória "retumbante", "esmagadora" (sic) da Frelimo e dele, fez questão de afirmar que isso era uma clara vitória do povo moçambicano. Militantes da Frelimo têm surgido a dizer que não faz sentido a Renamo fazer agora manifestações. Escuta colectiva através de telas gigantes e festa da Frelimo. A ideia passada é a de que a Frelimo é o povo moçambicano. Enquanto isso, a mesma rádio reportou com grande destaque que "alguns residentes da vila sede de Marínguè estão a abandonar as suas casas devido a movimentações de homens armados supostamente da Renamo" (sic) (noticiário das 19:30, em grande medida dedicado à Frelimo). Ponto de situação

Quantas línguas existem em Moçambique?

(150) 28/12/09
O "Notícias" online escreve que "pompa e circunstância" deverão marcar hoje a proclamação e validação pelo Conselho Constitucional dos resultados das eleições de 28 de Outubro, em cerimónia a realizar no Centro Internacional de Conferências Joaquim Chissano, enquanto a Frelimo festejará a vitória no país. Por outro lado,aguarda-se saber se e quando a Renamo organizará não festas, mas manifestações de repúdio dos resultados eleitorais, tal como prometeu.27 dezembro 2009
Beto Cadilhe

Interesseiro, aproveito recordar o banner que ele gentilmente fez para apoiar o meu diário no concurso The Bobs2009/2010, logo abaixo:
Fungula maso, muna madhindi mazindgi munseiu!
Tradução livre do ShiNhungwe (língua falada em Tete, minha terra natal): abra os olhos, cuidado há muitos buracos na estrada! Olhem, Bairro da Polana, cidade de Maputo: no cruzamento da Rua Nkunya Kilido com a Avenida Friedrich Engels, estais a ver uma caixa da EDM vandalizada (primeira foto a contar de cima) e se, em viatura não 4x4 e fascinados com o vandalismo da Engels, não tendes cuidado na Kilido, a oficina vos espera tragicamente (segunda foto); depois, visitada a cidade e querendo vós ir da baixa para a alta da cidade, na rua que sobe da marginal (junto ao Clube Naval) para a Julius Nyerere, tereis de enfrentar o mesmo dilema buracal como mostra a terceira foto. Que os espíritos 4x4 vos protejam!
Samora
A mais potente arma

De que raça é a tua cor? (5)
Avancemos mais um pouco nesta série de título bizarro, mas de conteúdo real e quotidiano.(149) 27/12/09
O Conselho Constitucional deverá validar e proclamar amanhã, dia 28, os resultados das eleições de 28 de Outubro, em cerimónia pública a realizar-se no Centro de Conferências Joaquim Chissano, cidade de Maputo.O problema central
Algumas pessoas mostram-se inquietas no tocante ao futuro do multipartidarismo, como se a democracia pudesse ser apenas isso. Ou principalmente isso.Creio que o problema central está menos aí do que nas pequenas coisas do dia-a-dia que, estranguladas pelos caciquismos locais, podem ganhar a espessura de grandes e dramáticas coisas.
O problema central não está na quantidade de partidos em si, mas nos perigos da redução sistemática das coisas mais banais da vida a fórmulas políticas oportunistas e carcerais emocional e cultualmente deduzidas dos discursos do topo.
O problema central não está nas declarações formalmente democráticas, mas nos actos informais e antidemocráticos do dia-a-dia que colocam grades nas opiniões, suspeitam de mãos externas em todo o lado e atribuem intenções políticos perigosas mesmo aos pirilampos e às suas lanternas biológicas.
O problema central não está na vitória esmagadora do Uno, mas na sua aceitação esmagadoramente passiva.
26 dezembro 2009
Identidade africana não existe como substância
Do cientista camaronês Achille Mbembe num texto divulgado em português em 2001: "Tentativas de definir a identidade africana de forma simples e clara têm ao longo do tempo geralmente falhado. Outras tentativas parecem estar tendo o mesmo fim, já que a crítica das imaginações africanas sobre o self e o mundo permanece presa dentro de uma concepção de tempo como espaço e de identidade como geografia. (...) Para ser exato, não há nenhuma identidade africana que possa ser designada por um único termo, ou que possa ser nomeada por uma única palavra; ou que possa ser subsumida a uma única categoria. A identidade africana não existe como substância. Ela é constituída, de variantes formas, através de uma série de práticas, notavelmente as práticas do self (...)"Sanusi Lamido

Questionário
Tal como prometi, podereis encontrar no lado direito deste diário, junto ao local de recados, um novo questionário, que substitui o que lá estava e que foi encerrado. Seu título: "Governo de transição exigido por Afonso Dhlakama". Participem, votem!Cartun angolano de 1994
(148) 26/12/09
De político fracassado desde que envederou pela carreira política, o jurista Carlos Jeque transformou-se em analista político, com lugar garantido na "Rádio Moçambique" e no "Notícias" e especialização na detecção das falhas dos partidos da oposição. Antigo membro da oposição, é hoje um seu crítico sistemático e um apoiante entusiástico do partido no poder. Candidato presidencial e autárquico vencido, é hoje um crítico severo dos vencidos. Definitivamente ganhou a mesma visibilidade que o Homo Sibindycus. No "Notícias" de hoje, o jurista surge a exibir a sua grande sabedoria em grande entrevista, a mostrar quanto a oposição está uma desgraça. É especialmente eficiente a responder a questões perspicazes do género "NOT. – Comparativamente a 2004, estas eleições foram mais participativas…" ou "NOT. – Mas também é obrigação dos partidos, principalmente dos concorrentes, saberem o que a Lei diz. Não acha?" A conferir aqui.Ranking web mundial das universidades: UEM 46.° em África, 5395.° no mundo

25 dezembro 2009
Perseguir o ladrão violando a lei ou deixar-se roubar em nome do patriotismo?

Atribuir ou não importância a um acontecimento
Jovens e elegantes
Questionário
Tal como prometi, podereis encontrar no lado direito deste diário, junto ao local de recados, um novo questionário, que substitui o que lá estava e que foi encerrado. Seu título: "Governo de transição exigido por Afonso Dhlakama".







