07 outubro 2008

O "assassinato" do português em Moçambique (1)

“O português está muito assassinado em Moçambique, por exemplo, dizem descamisados para tirar a camisa, descabelar para cortar o cabelo, conflitar para entrar em conflito ou eu vou ali comprar umas jenessis, uma jeans"- afirmou, citada pelo Canal de Moçambique na sua edição online de hoje, a linguista moçambicana Edma Sata em Bragança, Portugal, onde está a decorrer o Colóquio Anual da Lusofonia. Aguardem a continuidade de uma curta série.

14 comentários:

Anónimo disse...

Assasinato nada,apenas nossa maneira de dizer as coisas.

Nyabetse, Tatinguwaku disse...

Hahaha, não me levem a mal, mas eu acho que esta "batalha da lingua" está perdida. A lingua não é estática, mesmo a que foi escrita por Camões sofreu transformacoes, e mudancas, e hoje em dia ninguém escreve "hontem"... (Veja este link http://pt.wikisource.org/wiki/Primeiro_Tratado_de_Santo_Ildefonso).

O nosso português é resultado, naturalmente do portugues e do (muito e variado mocambicano)!

PS: Aliás, professor, o uso da palavra "dialecto" para referir linguas africanas não eh um erro crasso?

Nyabetse, Tatinguwaku disse...

Hahaha, não me levem a mal, mas eu acho que esta "batalha da lingua" está perdida. A lingua não é estática, mesmo a que foi escrita por Camões sofreu transformacoes, e mudancas, e hoje em dia ninguém escreve "hontem"... (Veja este link http://pt.wikisource.org/wiki/Primeiro_Tratado_de_Santo_Ildefonso).

O nosso português é resultado, naturalmente do intercambio entre o portugues e do (muito e variado) mocambicano! Assassinato nada!

PS: Aliás, o uso da palavra "dialecto" para referir linguas africanas não eh um erro crasso?

Carlos Serra disse...

Lá tentarei chegar, Melita...

Anónimo disse...

meu caros,

dialecto, foi um termo usado pelos colonialistas, para designar de forma pejorativa as linguas das colonias. No entanto, em ciencia, pode-se fazer a distincao entre lingas e varientes, de onde se podem encontrar dialectos.

Nao concordo com a ideia de que usar o termo descamisar (e outros), seja assassinar a lingua portuguesa, pq a lingua evolui e pode acolher vocabulos novos (neologismos), por que nao?

Um abraco em todos, obrigada, prof, por nos trazer assuntos interessantissimos...so aprendemos.
SJ

Carlos Serra disse...

Sim, um termo que vem do colonialismo. Muitos de nós, hoje ainda, o temos por natural e...por justo: "é dialecto", a gente fala nosso dialecto". Por outras palavras: interiorizámos um princípio que não tem a ver com as variantes de uma língua, mas com a catologação desqualificante de outras línguas face ao português.

umBhalane disse...

Não sou linguista, nem perito na matéria.

Às vezes cria-se uma certa urticária, penso, que sem razão.

Vejamos:

"O termo dialecto é utilizado para variedades que definem uma zona relativamente abrangente. Neste sentido, há vários dialectos/dialetos em Portugal (continental e ilhas). Apresenta-se, de seguida, o conjunto dos mais importantes:
Grupo dos dialectos/dialectos setentrionais:
– dialectos/dialetos transmontanos e alto-minhotos;
– dialectos/dialetos baixo-minhotos, durienses e beirões.
Grupo dos dialectos/dialetos centro-meridionais:
– dialectos/dialetos do Centro-Litoral (estremenho-beirões);
– dialectos/dialetos do Centro-Interior (ribatejano-baixo-beirão-alentejano-algarvios).
Dialectos/dialetos insulares:
– Açores: Micaelense, dialecto Sã Miguel;
– Madeira: madeirense.
Dialectos/dialetos asturo-leoneses em território português:
– Concelho de Bragança: Rionorês, Guadramilês;
– Concelho de Miranda do Douro: Mirandês."

O Macua, Sena, Ronga, etc não são dialectos do Português, pura e simplesmente, porque não são Português.

Sei que há vários dialectos Macuas, e de muitas outras Línguas de Moçambique.

Dialectos, de forma simplificada, são variantes de uma mesma língua, tão só.

Como dizem os Brasileiros, não precisa esquentar, não.

Os Colonos, e alguns muito poucos colonialistas, coisas diferentes, também diziam, e passaram, que havia jacarés, perdizes, javalis (crocodilos, francolins e facocéros), e outros em Moçambique.

Confiram, e digam alguma coisa.

Este é um pequeno exemplo, e muito pacífico, eu acho.

Não precisa esquentar, não.

Carlos Serra disse...

Isso, Umbhalane, nada de esquentamentos. Obrigado pela informação. Veremos a continuidade da série. Abraço a todos.

Anónimo disse...

Boas! Estive presente no evento e uma das coisas mais importantes que ali foi dita, a meu ver, foi o facto da língua portuguesa estar em constante evolução, pelo que, é normal que certas palavras tenham significados diferentes em locais diferentes. Por isso, a organização vai lançar um dicionário com esses termos.
Penso que foi também importante o facto dos linguistas terem destacado que a língua portuguesa, ao longo da história, enriqueceu pela permeabilidade que tem. Como sabem, na Galiza, província de Espanha, foi considerado que os habitantes falavam português, embora se chame galego à sua forma de expressão, da mesma forma se diz que os brasileiros falam brasileiro, quando na verdade é português. E é tudo isto que faz a Língua Portuguesa tão rica.
Já agora, convido-os a visitar o meu cantinho, destinado a divulgar o Nordeste Transmontano.
Cumprimentos,
India

Carlos Serra disse...

Muito obrigado!Vsitarei, estou certo de que outros visitarão.

Anónimo disse...

umbhalane,

existem dialectos, sim. O resumo que nos apresentou esta correcto e eh exemplo disso.

No entanto..eh importante lembrar que os colonialistas usaram o termo dialecto (nas colonias) para criar um sentimento de subalternidade das linguas locais, relativamente ao portugues...foi uma lavagem cerebral e isso funcionou...

Agora... de facto nao vale a pena esquentar. O importante eh que aprendamos a conviver com o termo cientificamente e que cuidemos de colaborar com os que ainda pensam que nao devem falar as suas linguas maternas por serem dialectos.

A proposito disso, convido os a uma mesa redonda sobre o valor das linguas maternas em mocambique. Sera realizado no CREISPU (Universidade Politecnica) e contara com autores de tres dicionariuos de linguas bantu. Sexta feira, as 18 horas.

Um abracos, ate la...
Prof. desculpa me por usar o seu espaco para divulgacao de um evento, mas sei que entendera pq o saber partilhado, so nos engradece.

SJ

Carlos Serra disse...

Força, estou certo de que muitos lerão o comentário.

umBhalane disse...

Para sossego de muitas almas, e com um pedido de desulpas pela ocupação de tanto espaço, transcrevo um artigo de PEPETELA, escritor Angolano:

Uma língua que aceita brincadeiras

Quando pensamos numa língua muitas vezes a vemos da forma sisuda que na escola nos ensinaram a encará-la, com aquelas regras chatíssimas de gramática que parecem talhar um fato apertado que a sufoca. Afinal essas regras podem não ser tão antigas assim e dependem das brincadeiras que fazemos com a língua. E as influências que estão por trás de muitas modificações nem sempre são conhecidas de todos os utentes.

Vou exemplificar apenas com algumas palavras que a maior parte dos falantes do Português nem desconfiam nem nunca se perguntaram de onde vêm.

Será que o pescador de fim de semana que na praia de Carcavelos, em Portugal, enfia uma minhoca no anzol para servir de isca, pensará que essa palavra minhoca afinal quer dizer cobra pequena e derivou do Kimbundu de Angola?
Será que o brasileiro que xinga outro pensará que a acção que realiza se designa assim por causa da palavra kuxinga do mesmo Kimbundu que quer dizer exactamente a mesma coisa?

Os estudiosos conhecem as centenas de palavras que do árabe derivaram para o Português, as que vieram de línguas da Índia, de Moçambique ou dos dialectos do Brasil.

Mas os utilizadores comuns da língua desconhecem que esses vocábulos, hoje reconhecidos como fazendo parte do Português, algum dia nele entraram porque havia pessoas que gostavam de brincar com palavras de outros idiomas que lhes pareciam mais adequados para exprimir qualquer coisa.

Por exemplo, António de Oliveira Cadornega, autor do livro "História Geral das Guerras Angolanas", de 1680, farta-se de pegar em palavras kimbundu ou kikongo e declina-as em português, introduzindo-as sem aspas nem itálico no discurso.
Muitas dessas declinações não ficaram na língua que hoje usamos. Mas não teriam ficado se o livro dele fosse publicado no século XVII e não apenas neste? Diríamos talvez canzar e arimar em vez de saquear e cultivar, só para pegar em algumas palavras que ele muitas vezes utilizou.

Bendita língua que aceita brincadeiras!"

07/03/1997

micas disse...

Não existe morte de uma língua, quando com ela se brinca( Obrigada Umbhalane por nos ter trazido este belíssimo texto de Pepetela), ou quando se introduzem novos vocábulos de um dialecto ou de uma língua local.Neste caso a língua evolui e enriquece.
O assassinato de uma língua seja ela a Portuguesa ou outra dá-se por deficiência no ensino da mesma.

Que se descabele uma língua...pode até ser maravilhoso!Veja-se os magníficos exemplos do Professor Carlos Serra e de Mia Couto.
Mas por favor não "depilemos" a mesma!