Tudo começou com uma entrevista dada a 15 de Março pelo escritor angolano José Eduardo Agualusa (na segunda foto) ao jornal Angolense e tudo começou especialmente a partir desta posição: "Uma pessoa que ache que Agostinho Neto (na primeira foto), por exemplo, foi um extraodinário poeta é porque não conhece rigorosamente nada de poesia. Agostinho Neto foi um poeta medíocre. O mesmo se pode dizer de António Cardoso ou António Jacinto."
E assim começou o problema - um problema verdadeiramente problemático -, o Jornal de Angolaonline manifestou profundo desagrado com o que o escritor disse - siga algo aqui -. Então Agualusa não atacou figuras emblemáticas, não atacou heróis, não atacou sobretudo o herói Agostinho Neto? Heróis são atacáveis? Não estão acima dos terrenos? Pode pôr-se em causa o conjunto de virtudes de Agostinho Neto, o primeiro presidente de Angola, e sua natureza de "intérprete das divindades aquáticas do Kwanza"? Um jurista e professor universitário, João Pinto, veio a terreiro e numa escrita dura, escreveu o seguinte: "A escrita não pode servir para humilhar, banalizar, diabolizar os ícones, heróis, mitos, deuses ou divindades; Neto é Kilamba, kituta, kiximbi sendo-o é intérprete das divindades aquáticas do Kwanza, é o antropónino de crianças que nascem com poderes especiais, segundo o antropólogo Virgílio Coelho (1989)." E duro, definitivo, juiz implacável, Pinto propôs: "Acho mesmo que, deve haver responsabilidade criminal e civil por estarem reunidos todos requisitos do ultraje à moral pública (ofendeu a moral cultural ou intelectual dos angolanos), previsto e punido no Artigo 420º do Código Penal. É preciso moralizar, sob pena de banalizar a figura mais importância da nossa memória colectiva contemporânea. Eles (Neto, Jacinto e Cardoso), foram os transmissores da nossa razão de sermos livres, não se pode deixar isto, sob pena de ridicularizar a razão da angolanidade, desrespeito pela dignidade e liberdade cultural, impondo-se uma identidade que com a qual não nos identificanos ex vi artigo 5º da Carta Cultural Africana, aprovada pela Resolução da Assembleia do Povo Nº 8/84, de 18 de Julho. A liberdade, termina aí onde começa a memória colectiva, que a razão suprema de toda liberdade angolana. Honra, respeito e dignidade aos heróis..."
Entretanto, leia também aqui.
1.ª adenda às 18: 23: O escritor Sousa Jamba coloca estas questões: "O senhor Artur Queiroz afirma que Agostinho Neto é universalmente reconhecido como grande poeta. Tenho dado aulas e feito conferências de e sobre Literatura Africana em várias partes do mundo. Muitos dos meus alunos e participantes dessas conferências nunca ouviram falar de Agostinho Neto. Da África Lusófona só há dois escritores de que se fala muito: o moçambicano Mia Couto e o angolano... José Eduardo Agualusa. Será que isto é justo? Mia Couto e Agualusa chegaram «lá» por mérito próprio ou, como muitos escritores negros dizem em privado, ambos são promovidos por fundações portuguesas, porque é neles que muitos lusos se revêem?"
2.ª adenda às 18:27: O Sr. Artur Queirós respondeu e terminou uma carta de leitor escrevendo o seguinte: "O Savimbi deixou estes manganos de cabeça avariada".
3.ª adenda às 18:31: o leitor encontra na internet muitos portais dedicados a analisar o poliédrico mundo que se seguiu ao que disse Agualusa.
4 comentários:
Interesante polémica. Interessante demais Professor. Li e com grande interesse, grande parte dos portais relacionados, comentários às postagens e artigos enfim. Tenho cá por mim que acabou-se bem longe donde se começou.
Agualusa disse oque disse a saber "Neto foi um poeta medíocre" como uma avaliação crítica do Neto poeta e muitos não conseguíram separar o Neto poeta que Agualusa acha medíocre, do Neto herói, figura histórica. Oque ele diz devia ser considerado uma opinião e não uma verdade absoluta. O factor comparativo parece estar na origem de tudo. Neto é medíocre em relação à algo que se subentende. Tenho que manter firme que oque Agualusa disse, seja lá quais foram os motivos e critérios de avaliação não passa duma opnião pessoal. Neto não se torna um poeta medíocre só porque Agualusa assim o acha. É dar-lhe autoridade demais. Agualusa tem seus pontos de vistas, seus critérios de avaliação, seus argumentos mas independentemente do seu tamanho no mundo literário, não tem a última palavra sobre nada, muito menos sobre Agostinho Neto. Penso que ele exagera ao dizer que quem acha Neto um grande poeta, não entende nada de poesia, mas mesmo nesse exagero continuaria a olhar essa afirmação exagerada como uma opinião pessoal. Não é o padrão de Agualusa que determina quem entende ou não algo da poesia.
Algumas reacções, as mais azedas foram feitas cobertas de razões bem distantes das letras. Houve penso eu que se irritou com a "ousadia" de Agualusa. Quem pensa que não se deve questionar um homem do tamanho de Agostinho Neto. Há quem pensou que Neto, pelo que foi como herói tem de ser inquestionável em todas as outras dimensões. Deve ser a cultura do "yes and Amém" a luta pelo concenso, combate contra pensamentos contrários.
Sem se quer me importar em Agostinho Neto aproveitei ver mais uma vez como o homem é pequeno apesar de toda à grandeza que se lhe atribui. Como o homem pode descer às profundezas da irracionalidade quando "lhe pisam os calos". Me lembrei da "animalidade" que de vez em quando transparece na nossa blogosfera. Vezes em que se recorre aos grandes saberes para "empequenar" os que se nos opõe no pensar. Me lembrei de como os "pecados recentes" são forçosamente cobertos ou cobardemente ignorados firmando os olhares para "os grandes" feitos anteriores. Enfim, vi o paradoxo humano. Essa perpétua dualidade que é nossa natureza.
Perpétua dualidade,sim...Eu ainda estudo o fenómeno.
Aos leitores: acrescentei uma 4.ª adenda com poesia de Agostinho Neto.
Quitandeira me ficou gravado na memória. Foi texto de um exame de língua portuguesa que fiz nos anos bem idos da década de 90. Na altura não entendia nada de poesia como Agualusa me acharia, não entendia nada do que o texto dizia. Me safei no exame porque me dei bem no outro lado, o da prosa ou texto narrativo como "primitivamente" chamávamos. Não entendia a beleza das palavras. A liberdade que elas tomam na palma do poeta que suavemente empunha a pena. Me questionava até porque é que um texto tinha que ser tão complicado de entender? Enfim coisas de um tempo que se foi.
Quanto a dualidade professor, ter constante consciência dela, tem sido um factor muito importante. Me ajuda a manter-se dentro dos "limites da humanidade", em outras palavras(mais humanas) me providencia a dosagem exacta da humildade que me permite desfrutar a grandeza da humanidade sem contudo me iludir, sem se esquecer da nossa infeliz pequenez.
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