Décimo e último número da série. Termino o último ponto do sumário proposto aqui, a saber: 5. Espectáculo, euforia e compensação. Escreveu um dia o antropólogo Georges Balandier: "O poder estabelecido unicamente sobre a força ou sobre a violência não controlada teria uma existência constantemente ameaçada; o poder exposto debaixo da iluminação exclusiva da razão teria pouca credibilidade. Ele não consegue manter-se nem pelo domínio brutal, nem pela justificação racional. Ele só se realiza e se conserva pela transposição, pela produção de imagens, pela manipulação de símbolos e sua organização num quadro cerimonial." [Balandier, Georges, Le pouvoir sur scènes. Paris: Balland, 1980, pp.15-16]. É exactamente aí que habita o espectáculo que o comício representa. Não importa de onde venha o candidato presidencial, ele é havido como vindo de fora, o candidato é aquele que traz a boa nova, aquele que quer mudar o mundo e a vida, aquele que transporta a diferença, o novo, o espantoso. Quando mais pequenas as terras, quanto menos povoadas de espectáculos, mais gente aflui aos comícios, lá onde o candidato se multiplica na produção de palavras, de promessas, de gestos e de símbolos, num quadro cerimonial feérico. Saídas do espectáculo de um candidato, as sequiosas gentes logo passam a outro, sempre transversais, rodando de candidato em candidato, de espectáculo em espectáculo, das camisetes de um aos bonés de outro, dos sacos plásticos de um aos blocos de apontamentos de outro. Na verdade, Nyusi, Dhlakama e Simango têm sido puro espectáculo, produtores de esperança e euforia, todos eles têm sido, afinal, um mecanismo compensatório para a mesmice e os horizontes tacanhos. E sendo isso, eles-próprios se sentem outros em seu messianismo, em suas promessas de parusia terrena, eles-próprios acreditam no que tentam fazer acreditar, eles-próprios se sentem multidão. Por isso acreditam que vencerão as eleições, entendem não precisar de votos para nutrir e justificar a crença (imagem reproduzida daqui).
Sonhadores, os sociólogos sempre procuraram duas coisas: as leis do social e a reforma das sociedades. Cá por mim busco bem pouco: tirar a casca dos fenómenos e tentar perceber a alma dos gomos sociais sem esquecer que o mais difícil é compreender a casca. Aqui encontrareis um pouco de tudo: sociologia (em especial uma sociologia de intervenção rápida), filosofia, dia-a-dia, profundidade, superficialidade, ironia, poesia, fragilidade, força, mito, desnudamento de mitos, emoção e razão.
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