Blanche/Malema: o roteiro de Jano (3)

Mais um pouco desta série.
Escreveu um dia Karl Marx que "os homens fazem a sua própria história, mas não a fazem arbitrariamente, em condições por eles escolhidas, mas em condições directamente dadas e herdadas do passado. A tradição de todas as gerações mortas pesa fortemente no cérebro dos vivos" (in "O 18 de Brumário de Luís Bonaparte").
O que se está a passar na África do Sul é, creio, uma ilustração disso.
Ontem, no funeral do líder neonazi Terre'Blanche, membros do AWB - partido da extrema direita sul-africana - afirmaram estarem a armar-se para se defenderem, acrescendo que ressurgiu a ideia de um Estado autónomo, boer. Enquanto isso, o líder juvenil do ANC, Julius Malema (que ouviu cantar no Zimbabwe a velha canção do ANC com a frase "mata o boer"), expulsou de uma sala onde decorria uma conferência de imprensa um jornalista da BBC, apelidando-o de "agente maldito" (aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui).
Como que meros cordelinhos, como que meros ilustradores de uma história de muitos séculos, como que representantes das gerações passadas, Blance e Malema - um morto, o outro vivo - fazem exumar os carris pelos quais muita da história sul-africana circulou (e, afinal, circula), os carris dos guetos, os carris da luta por recursos de poder, os carris da intolerância, os carris do ódio.

Estamos confrontados com as duas cabeças racializantes de Jano.

Aguardem a continuidade da série.

(continua)

Convite às 8:21: renovo o convite aos leitores para participarem nesta série de tema delicado, comentando.