13 dezembro 2009

Resolver problemas (5)

Mais um pouco desta série.
estamos numa fase de intensa massificação do ensino, não importa o nível.
Estou em crer que muitos de nós prezamos essa massificação, independentemente da qualidade e, em particular, do espírito crítico.
Todos os anos temos centenas de jovens que terminaram um determinado grau de ensino, temos grandiosas cerimónias de outorga de certificados.
(continua)

4 comentários:

Anónimo disse...

O período que estamos a atravessar na educação, caracterizado pela massificação do ensino e decréscimo acelerado da qualidade da educação, acarretará profundas consequências negativas para as próximas gerações e para o futuro do país. Só quem não o quer reconhecer pode defender essa massificação do ensino a qualquer preço. Degradando-se a semente, sem que haja um terreno mais fértil, meios ou procedimentos relativamente eficazes para a melhorar, jamais se conseguirão boas colheitas ou melhores espécies. Qualquer camponês, mesmo analfabeto, sabe disso.

Falamos da necessidade de melhorar a qualidade, mas as medidas que tomamos parecem caminhar no sentido inverso. É reduzindo o tempo de formação dos professores que se alcança melhor qualidade, sabendo-se que os graduados dos níveis primário e secundário estão cada vez mais debilitados? É com a necessidade de admitir aceleradamente professores que se obterão entre aqueles graduados novos formandos ou professores sem formação de melhor qualidade? É com exames de escolha múltipla (onde até com resposta aleatória já se obtêm cerca 25% de aprovações) que se chega lá? É com a multiplicação de funções no Ministério da Educação - já de si tão limitado - concretizada com a fusão de três ministérios e a agravar-se com o ensino bilingue que se pretende expandir brevemente às zonas rurais de todo o país? É com professores que mal sabem escrever na sua língua materna a ensinar nas escolas primárias do ensino bilingue nos moldes em que está concebido? É com sonhos gigantescos sem termos minimamente recursos materiais e humanos e terreno para os concretizar?

Falamos cada vez mais dos direitos da criança, de justiça, equidade e inclusão. Oferecendo a muitas crianças um ensino primário (7 classes!!!) de que muitas saem praticamente sem saber ler, escrever e realizar operações aritméticas básicas estaremos a dar-lhes os seus direitos? É com a simples presença na escola que esses direitos são materializados? E é com sectores – o público e o privado – cada vez mais distanciados em termos de qualidade nos níveis primário e secundário que temos um ensino e uma sociedade mais justos e inclusivos?

Os “apóstolos da graça” que me perdoem, mas não resisto a manifestar (uma vez mais) a percepção de que estamos na fase da construção e enchimento de escolas com escangalhamento do conhecimento e aumento da exclusão social. Espero que a recente reunião realizada em Maputo se tenha debruçado seriamente sobre estas questões e que de alguma forma se consiga mudar o rumo do actual estado de coisas.

Por um futuro melhor!
Fátima Ribeiro

ricardo disse...

Em posts anteriores havia proposto algumas estatísticas para melhor perceber a dimensão do desastre. Será que os "apóstolos da graça" tomaram nota?

Continuo a espera de reacções que ainda não cairam (nem sob anonimato) no livre.pensador.moz@gmail.com.

Mas já prevejo que os resultados dos exames da 2ª Epoca sejam inversamente proporcionais aos da 1ª. Podem crer.

Reflectindo disse...

Tenho dito que o deprimente em Moçambique é o facto da recusa de escuta ou pelo menos um debate sério sobre os grandes problemas do nosso país. É isto no governo, nos partidos políticos, nas organizações da sociedade civil...
Embora vagamente, conheci a Fátima Ribeiro lá em Nampula como uma cidadã que se preocupa pela educação. Nos últimos anos, tenho lido com frequência os seus comentários na blogosfera sobre o sector e ela toca na questão desde à base, cresche ou escolinha, línguas maternas. Alguns dos seus pontos de reflexão foram publicados no defunto blog de Machado da Graça e Zambezia online e neste Diário de um sociólogo tem ela vindo com eles. Infelizmente, nunca senti que alguma vez houve interesse em capitalizar as reflexões desta professora de longa experiência. Pode ser a minha ilusão e oxalá que assim seja. Mas quando ela escreve que espera que a recente reunião realizada em Maputo se tenha debruçado seriamente sobre estas questões e que de alguma forma se consiga mudar o rumo do actual estado de coisas, entendo logo que ela não foi convidada a esse encontro. Isto pelo menos a mim deprime.

Nas postagens recentes sobre a educação neste blog, foi a vez do Ricardo a dar excelente contributo para um debate sério sobre alguns problemas no sector de educação. Fez um convite, mas houve interesse por parte daqueles que podem decidir ou influenciar nas decisões? Njet.

Digo que não é um problema apenas do governo e de um único partido, mas um pouco generalizado. Receio que aos seminários se convidam só (ou pelo menos na sua maioria) aos que vão engordar os seus salários pelo “per diem” e são simples “yes man”, os com interesses estomacais. Os voluntários? Os que gastam tanto tempo reflectindo sobre os problemas do país?

Mesmo alguns deputados de todos os partidos, ao invés de se preocuparem por insultos na Assembleia da República não podiam capitalizar as ideias gratuitas destes e de outros cidadãos? Não há comissão da Assembleia da República que se dedique pelos assuntos de educação???
Enfim, como Domingos Bihale escreveu aqui, subiram ontem ao Monte Sinai. Prontos.

Abraço

Anónimo disse...

Estimado Professor,

Eu estimo muito a opinião da Sra Fatima Ribeiro, mas permito-me comentar alguns pontos por ela colocados.

Quanto aos professores eu acho que o que o MEC não fez a completa reforma da formação.

O MEC tinha até 2006, dois tipos de formação de professores para o ensino primário: 6a+3 anos de formação pedagógica nos CFPP (instituições geralmente pobres e degradadas, sobretudo nos distritos) e 10a+2 anos de formação pedagógica - nos IMAPs (geralmente melhor apetrechados e equipados, localizados nas cidades ou proximo delas). Em todos eles as bibliotecas são pobres.

Ora o que o MEC fez foi unificar a formação dos professores do ensino primário e formar a todos com 10a classe mais um ano de formação pedagógica. O que eu acho positivo.

Até 2006 o MEC admitia todos os professores formados nos dois tipos de cursos e ainda aceitava professores sem formação pedagógica com apenas a 10a classe. Hoje o MEC contrata todos com a 10a mais um ano de formação.

Em minha opinião, o MEC fez uma boa reforma, mas poderia ir mais adiante. Porque o MEC poderia utilizar melhor o ano lectivo ou seja aumentar o tempo em que os alunos passam a aprender das 650/700 horas para as 1000/1100 horas ano e focalizar melhor a formação.
Um ano pode ser muito melhor aproveitado!!! E isto é que é o essencial. Porque não usar os sabados, aulas à tarde, entre outras estratégias (trabalhos individuais) por exemplo, já que a maioria dos alunos estão internados? A redução do tempo de formação permite fazer poupanças que deveriam ser usada para melhorar os equipamentos, as bibliotecas, etc...

Mas um ano certamente que será pouco se continuarmos a fazer as coisas como antes! E isto é que temos que mudar.

Ai está o ponto que gostaria de colocar em relação à formação de professores primários.

Mas acredito que o sistema não tem que parar por aqui. Ademais disto deveria-se fazer o trabalho adicional de apoio ao professor através de um sistema de formação continua, reciclagens. Melhorar o sistema de progressoes, entre outros. O Sistema tem que ser visto como um todo e deve também responder a estas questões.

A mudança não é facil, mas é possivel!

Quanto aos exames de escolha multipla dizer que se forem bem elaborados são um sistema eficaz de testar a qualidade da formação dos alunos. Muitos paises têm sistemas similares e nem por isso têm fraca qualidade de medição da aprendizagem (nem fraca qualidade de ensino). O exame de escolha multipla tem muitas exigencias tanto para os elaboradores como para aqueles que os têm que realizar.

Acho o ensino em linguas maternas (prefiro esta designação) essencial no ensino primário. Mas isto é uma questão de opinião. Eu pessoalmente estudei na minha lingua materna o Portugues. Porque outros não podem estudar nas suas linguas maternas - changana, macua, etc? Mas como bem diz há que ter professores preparados.
Manuel Lobo