04 outubro 2010

Causas e características das manifestações em Maputo e Matola (22)

Do rio que tudo arrasta se diz violento, porém ninguém diz violentas as margens que o comprimem" (Bertolt Brecht)
-"Esta cintura compacta, composta por casas pequenas e frágeis, feitas de caniço, madeira e zinco e, ultimamente (depois da independência), de cimento, quase que não tem quintais, ruas, água e luz em todo o sítio (...) Nestes subúrbios não se vive, sobrevive-se. Eles estão apinhados de gente: os suburbanos." (carta de um leitor do “Notícias” publicada a 25/09/2010 com o título “A cidade e o mega-subúrbio de Maputo”)
Mais um pouco da série (para actualizar o sumário, confira aqui).
4.2. Emissão de representações e de causas a cargo do centro; o pronto-a-pensar (continuação). Um ponto sistemático nas representações oficiais foi a conversão das manifestações em caos absoluto. Tal como já tive ocasião de referir, os manifestantes foram extraídos de relações sociais concretas e simplesmente transformados em arruaceiros e malfeitores. A imagem generalizada que deles se criou foi a de um bando atípico exterior à sociedade, possuindo nele mesmo a causa da violência. Em lugar de análise, o pronto-a-pensar e a simples condenação.
4.3. Subalternização das representações e das causas emitidas pelos manifestantes das periferias. As representações dos actores das periferias sobre o que se passou, sobre as causas do que se passou, foram regra geral ignoradas. Aqui e acolá, uma ou outra estação televisiva registou manifestantes a dizerem que a vida estava cada vez mais cara, que os preços das coisas básicas os afligiam e que desejavam justiça. Mas isso não foi a regra, foi a excepção, atribuímos causas aos seus actos sem os ouvir. A regra foi o desenrolar de um filme de destruição e de pneus a arder a cargo daqueles a quem o leitor de um jornal chamou "suburbanos", como se a maldade e a violência (repito o que escrevi anteriormente) lhes fossem intrínsecas (foto reproduzida daqui).
(continua)
Adenda às 1:44: no "Notícias" online de hoje, uma notícia e uma carta de leitor: a notícia tem o título Banco Mundial injecta 143 milhões USD: Governo pode atender melhor áreas sociais; a carta de leitor tem por título É preciso acelerar o combate à pobreza.

1 comentário:

ricardo disse...

De boas intencoes esta o inferno cheio. Este injectar deve ser entendido como uma das muitas promessas que Mocambique recebe a cada ano. Do valor concreto, ou nao chega nunca, ou atrasa, ou vem a conta-gotas. E bom que se fique bem claro.

E como e evidente, ha muitas outras necessidades duma Governacao "Mojo Jojoy" que com o tempo se tornam exauridas de recursos, logo, estes financiamentos do social, serao justificadamente aplicados em outras coisas inesperadas. Foi assim que vimos projectos educacionais a transformarem-se justificadamente programas de melhoria das condicoes prisionais, etc. Afinal tudo e social, nao e?

Para o Banco Mundial, o que importa e o relatorio final de execucao. Se as estatisticas forem do agrado de todos, entao ninguem se zanga...

Porque destes pacotes do Banco Mundial, eu ja tenho barba e cabelo brancos. Desde o Capacity Building dos anos 80, ate aos ROCS das estradas. Todos com o objectivo soberano de alavancar Mocambique para outro ranking. E alavancaram?!

E assim, no pais da Marrabenta!