Deixem-me voltar ao fascinante tema da chuva presa no céu.
O Zambézia online escreveu, a esse propósito, na pena de Maximum Consult (evidentemente um pseudónimo excessivo), o seguinte, no tocante à Zambézia: "Há neste momento uma crença bastante forte nas comunidades de que é possível que alguém dotado de poderes mágicos possa impedir a chuva. Esta maneira de pensar é própria de comunidades que continuam ainda amarradas ao obscurantismo e bruxaria. É como se essas comunidades não tivessem evoluído e continuam a pensar de uma forma arcaica."
E aqui está o problema não apenas de Maximum, mas de muitos outros: atribuírem ao primitivismo aquilo que a sua preguiça não quer estudar e analisar, aquilo que é, afinal, profundamente moderno em sua expressão alegórica. A propósito dos mais variados fenómenos de intranquilidade social que ocorrem no país, é frequente aparecerem catalogadores de expressões 4x4 com etiquetas do género : "campanha de desinformação", "desinformação da oposição", "manifestações atípicas", "incitação à violência", "deitar achas na fogueira", etc. Por vezes, lamentavelmente poucas vezes, aparece alguém capaz de propor coisas sensatas, do género: estudem.
Estamos cheios de críticos, de samaritanos e de criminalizadores, mas magros de reais estudiosos. Frequentemente, o obscurantismo está em nós, na nossa incapacidade de pensar quer formas diferentes da nossa, quer o que se esconde por baixo de formas aparentemente aberrantes de pensar a vida, de lhe dar um sentido, especialmente quando esse pensar tem índole política.
Entretanto, aguardem que eu prossiga a minha série com o título Ionge: populares acusam autoridades de prender a chuva no céu.
O Zambézia online escreveu, a esse propósito, na pena de Maximum Consult (evidentemente um pseudónimo excessivo), o seguinte, no tocante à Zambézia: "Há neste momento uma crença bastante forte nas comunidades de que é possível que alguém dotado de poderes mágicos possa impedir a chuva. Esta maneira de pensar é própria de comunidades que continuam ainda amarradas ao obscurantismo e bruxaria. É como se essas comunidades não tivessem evoluído e continuam a pensar de uma forma arcaica."
E aqui está o problema não apenas de Maximum, mas de muitos outros: atribuírem ao primitivismo aquilo que a sua preguiça não quer estudar e analisar, aquilo que é, afinal, profundamente moderno em sua expressão alegórica. A propósito dos mais variados fenómenos de intranquilidade social que ocorrem no país, é frequente aparecerem catalogadores de expressões 4x4 com etiquetas do género : "campanha de desinformação", "desinformação da oposição", "manifestações atípicas", "incitação à violência", "deitar achas na fogueira", etc. Por vezes, lamentavelmente poucas vezes, aparece alguém capaz de propor coisas sensatas, do género: estudem.
Estamos cheios de críticos, de samaritanos e de criminalizadores, mas magros de reais estudiosos. Frequentemente, o obscurantismo está em nós, na nossa incapacidade de pensar quer formas diferentes da nossa, quer o que se esconde por baixo de formas aparentemente aberrantes de pensar a vida, de lhe dar um sentido, especialmente quando esse pensar tem índole política.
Entretanto, aguardem que eu prossiga a minha série com o título Ionge: populares acusam autoridades de prender a chuva no céu.
12 comentários:
Vou responder à sua interrogação, Prof..
Eu sou Zambeziano, com muito orgulho, mesmo, demais.
O "meu" Povo, o Povo da Zambézia não é arcaico, mesmo.
Um Povo que gosta de se divertir, um Povo mestiçado, cultural, etnicamente e outros, um Povo altamente resistente a todos os invasores, e ao mesmo tempo que tão bem os absorvia, incorporava no seu seio, um Povo desta envergadura, o Povo Zambezeano não é arcaico, NÃO.
NÃO!
Arcaicos não somos!
É necessario compreender as infraestruras sociais. Nao ficar pela rotulacao e discursos normativos que nao nos leva a nada.
Por mim basta de discursos evlucionista. Vamos analisae e depois compreender as particularidades e contextos de cada povo. "O estranho é o que ainda nao é conhecido"
Prezado Professor,
Permita-me juntar a minha voz a do UmBhalane! Nao somos arcaicos! E muita pena que um jovem com formacao universitaria (Maximum consultant) pense tao 'arcaicamente' sobre o seu proprio povo! 'Nao saber e mau, nao aprender e mau'! Dizia um slogan da era da masificacao da educacao nos anos 1980!
E imperioso que levemos o 'desafio de Ionge' para as catedras da Sociologia, Psicologia, Antropologia, Psicologia Social, Direito, Filosofia do direito, Economia etc! Domestiquemos a ciencia ao mesmo tempo que internacionalizamos a nosa realidade social! Usemos os conceitos da ciencia para estudar a nossa cultura e nao para estigmatiza-la ou vilipindia-la! os nossos intelectuais devem usar as suas ferramentas para ajudar aqueles que nao as possuem a compreender os fenomenos sociais! E os que nao sabem que tenham a humildade de reconhecer que nao sabem e preocupem-se em aprender! 'Nao saber que nao sabe' e o pior opio! O Professor Serra tem sido um exemplo e uma fonte de inspiracao na tentativa de questionar a realidade social sem complexos de superioridade!! Estive recentemente em Berlin e encontrei-me com muitos cidadaos de Ionge, Maquival etc que me confirmaram que esta crenca esta enraizada na cultura de que fazem parte e que desde 'miudos' conviveram e acompanharam o evoluir desta crenca! Onde andam A Politecnica, delegacao de Quelimane, a Universidade Pedagogica, a UEM, o Centro de Estudos Mocambicanos (CEA), Instituto de Estudos Sociais e Economicos (IESE), o Centro de Estudos Mocambicanos e Internacionais (CEMO)?
Professor que tal uma viagem a Ionge? Aqui fica o convite!
Manuel de Araujo
Ok Professor, paremos de criminalizar os individuos que acreditam que existem pessoas capazes de amarrar a chuva. No lugar da criminalizacao partamos para a pesquisa.
O que fazer quando essa crenca redunda na morte de inocentes? Irmos apenas dizer aos parentes dos massacrados que estamos a estudar? Levar os assassinos a responder pelos seus crimes nao seria tambem, uma maneira pedagogica de ensinar as comunidades que que a vida humana e sagrada?
As pessoas que estaoa ser assassinadas na base dessas crendices, tal como todos nos, tinham familia, tinham namorados/as, tinham filhos a educar, tinham sonhos...
Que a ciencia cumpra o seu papel. Nisso parece estarmos todos de acordo. Mas quando a crenca redunda no assassinato deinocentes a policia nao se pode eximir de cumprir seu papel.
Saudacoes
Luis Almeida, de Quelimane
Caro Adelino: evidentemente que alguém deve ser punido quando tira a vida a outrem. Mas o meu problema não é esse. O meu problema é estudar as raízes mais profundas de crenças como as aqui em causa ou de crenças como as vigentes em Inhassunge (para só dar um exemplo)que levam aos linchamentos por acusaçcão de feitiçaria de que o Jocas Achar tem dado conta. A crença não é de uma ou de duas pessoas. Depois teremos de ver como reduzir se não eliminar o "vector" que leva à crença. Ora, aqui começa outro problema: muitas vezes uma acção bem intencionada (o esclarecimento, por exemplo) pode gerar a recrudescência do "vector". Se fui educado a acreditar que a causa de uma morte em Gonhane é devida ao okwhiri de uma tia que mora a 100 metros de mim, diga-me lá então como vou "combater"as práticas dos muitos adultos que nisso acreditam...Naturalmente que todo um enorme e multifacetado esforço deve ser feito quer no sentido de conhecer com profundidade as imputações causais em curso, quer os mecanismos de restrição ou de eliminação dos "vectores". E isso, como sabe, não é nada fácil. Muitas vezes quem deve "combater" os vectores é, ele ou ela-própria, um gestor das imputações referidas, gestor que entender ser natural acusar uma tia de ser mukhwiri. Veja lá agora quanto trabalho a ter nas nossas escolas...Por agora fico-me na necessidade do estudo. Faço finca-pé nisso.
As vezes parece que quanto mais as pessoas estudam, ou seja, quanto mais educadas elas são, mais ignorantes se tornam!
concordo plenamente com o professor, as pessoas são magras em estudos!
somos culturalmente diferentes e temos crenças diferentes, e por isso, devemos saber respeitar a estas mesmas diferenças, uma coisa é criticar o que as pessoas fizeram, outra totalmente diferente é dizer que o povo da zambézia pensa de forma arcaica!!
por acaso, sou zambeziana, mas o ignorante é aquele que escreveu a citação acima!
http://www.lutacontraignorancia.blogspot.com/
ais uma nota: estamos preocupados (e legitimamente) com os efeitos terminais e trágicos da crença de que alguém amarrou a chuva no céu (otomola...); estamos tb preocupados com os efeitos terminais e trágicos da acção linchatória, seja sobre ladrões ou supostos ladrões, seja sobre acusados de feitiçaria. Pedimos penas para os que agridem e matam. Legitimamente. Mas não prestamos atenção ao facto de que muita gente crê que os abastados prendem a chuva no céu e ao facto de que muitas das nossas crianças concordam com o linchamento. Aqui está, então, o problema: por onde começar? Porque, queiramos ou não, tudo habita a jusante e não a montante, tudo habita na produção e na reprodução diária de determinadas relações sociais e no imaginário social que construímos para as homologar ou impugnar.
Sugiro a leitura da minha última postagem.
O Povo é Sábio, meus Amigos.
A chuva está presa no céu? Sim, está concerteza, porque não chove. E se não chove, há seca. E se há seca, não há agricultura. E se não há agricultura, não há alimentos. E se não há alimentos, há fome. E se há fome, esperamos ajuda do nosso governo. E se a ajuda tarda ou é inexistente, "marchamos" contra o governante. Porque morremos de fome e vemos morrer os nossos filhos.
Eu mesma, se no fim do mês, o meu patrão não conseguir pagar o meu salário, não vou poder comer e alimentar a minha família. Vou ficar em muito má situação.
Qual é a primeira coisa em que pensamos, quando acordamos? Em comer, meus Amigos. Precisamos de alimento.
Nos anos 30 do séc XX, a Europa passou por uma crise tão grave, que mandou para o desemprego milhares de pessoas que morreram à fome. Não tinham o que comer. Desses tempos, os mais velhos dizem: "Eramos muito meninos, e quando raiava o dia, saíamos à procura de qualquer coisa que nos matasse a fome. Andavamos tanto, caminhavamos muito, sempre à procura. Laranjas, havia laranjas. Era o que tinhamos."
Por causa dessa crise, Hitler subiu ao poder, levando-nos a uma guerra tão dura e cruel, onde se praticaram actos impensáveis, de tão crueis que foram. Ainda hoje carregamos o peso de tamanha vergonha.
Veio ajuda, reconstruiu-se, outras crises vieram, foram superadas. Os nossos países em guerra, sofreram muito com a crise energética dos anos 70. Muita fome, tanta carência, ficamos arrasados física e mentalmente.
Actualmente, vivemos nova crise, as nossa empresas e indústrias estão à beira de fecharem. Os nossos governos fazem esforços no sentido de acudirem a todos.
Novamente os nossos países em situação difícil. Por serem pobres, por terem saído recentemente de uma guerra, por precisarem ainda do auxílio dos mais ricos, ficarão numa situação muito complicada.
O que fazer então?
Vamos concerteza superar mais esta crise, estamos mais fortes, mais capacitados, estamos munidos de outras ferramentas que não possuíamos no passado.
Para já é urgente alimentar as nossas populações. E estudar muito sim, estudar constantemente.
Estudar os nossos solos, o nosso clima, as nossa regiões, conhecermos bem o nosso território. Só assim será possível prevenirmo-nos contra as calamidades.
Só estamos com fome, meus Amigos,estamos famintos e doentes, ajudem-nos por favor. É somente isto o que o nosso Povo Sábio nos quer dizer.
Abraços Amigos
Correcção no comentário anterior: tudo habita a montante e não a jusante...
Eu tenho uma opinião contrária. Acho que Arcáicos são os Maputenses que pensam que estão em melhores condições de opinar sobre outros.
XANA
Beira
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