05 maio 2007

Os caçadores locais das feiticeiras de Salém (9) (fim)


"A chefe do posto administrativo de Covo, distrito de Nacala-a-Velha, na província de Nampula, Ana Sabonete, queixou-se ao governador Felismino Tocoli, de ser constantemente ameaçada de morte, por exploradores ilegais de madeira daquele ponto do país sob a sua jurisdição administrativa."
Analisando os conteúdos dos números anteriores deste série é possível verificar seis coisas:
1. Recusa primária em aceitar que existem ilegalidades na exploração comercial das nossas florestas;
2. Impugnação (ou olvido) dos trabalhos de pesquisa e dos testemunhos da imprensa que têm sistematicamente mostrado essas ilegalidades;
3. Atribuição aos que dizem o contrário de uma intenção obscura que visa favorecer certos tipos de estrangeiros em detrimento de outros;
4. Racialização velada da autoria dos críticos das ilegalidades;
5. Outorga aos ambientalistas de intenções perversas;
6. Confiança cega nas posições e nas estatísticas oficiais.
Tenho para mim que é importante analisar quer as ilegalidades e a corrupção que grassam na exploração comercial das nossas florestas quer a recusa primária em admitir isso.
Julgo que haverá no futuro espaço para regressaremos a ambas as coisas.

2 comentários:

Anónimo disse...

1. Há uma certa tendência de rotular os movimentos ambientalistas como sendo teóricos e “fundamentalistas”. Um amigo dizia-me há anos, referindo-se aos “VERDES” e movimentos afins: “vais ver, quando AMADURECEREM mudam de ideias”. De facto, não raras vezes, há uma certa generosidade nestes movimentos, maioritariamente de jovens, com uma certa intelectualidade. Porém, a intelectualidade e o espírito crítico que em regra lhe está associado é fundamental para o desenvolvimento de qualquer país. É saudável, imprescindível! A posição do governo, de intolerância à crítica, de cegueira, de fingir não ver o que está ESCANCARADO, é típica da MEDIOCRIDADE que, globalmente, o caracteriza.

2. A “racialização”, mediante: (i) insinuação da liderança reivindicativa ter uma forte componente de minorias privilegiadas, intelectuais ou pseudo intelectuais, não conhecedoras da realidade nacional (que no entender de alguns é monopólio dos que apelidam de “genuinamente moçambicanos); (ii) insinuação dum certo sentimento anti-chinês por parte das tais minorias. Fingem ignorar que a relevância dada à forma de actuação de Agentes de origem chinesa, resulta, pura e simplesmente do facto de tais indivíduos/empresas estarem associados a empresários nacionais, figuras de destaque, históricos e outros do partido Frelimo, que a coberto desta condição, de intocáveis, usam e abusam da sua influência para atropelar tudo e todos.

3. Um desafio: sugira-se ao governo que aceite a constituição de uma equipa técnica formada por 1 jurista + 1 engº florestal + 1 gestor/economista da sociedade civil, e igual nº de elementos com igual qualificação do governo, para realizar uma rápida avaliação/ auditoria, aos aspectos seguintes:

A. Sobre as Concessões: Nº de concessões autorizadas por Província, indicando: (i) nome dos titulares; (ii) data de autorização, (iii) confirmar, na base dum check-list simples, se os processos se encontram completos, em conformidade com a legislação vigente; (iv) confirmar se os estudos técnicos exigidos por lei (inventário florestal, programa de maneio, etc.,) foram elaborados por “pessoa competente” e comprovadamente resultantes de trabalhos de campo; (v) confirmar se os concessionários apresentam dentro da periodicidade estipulada na lei, os relatórios com a informação exigida; (vi) confirmar se o pagamento das taxas exigidas por lei está em ordem; (vii) confirmar os metros cúbicos autorizados e os efectivamente cortados em cada ano, dentro das áreas licenciadas; (viii) confirmar o destino da produção: (a) exportação directa; (b) venda interna a exportadores (chineses e outros); (c) entrega à industria de transformação nacional; (ix) Confirmar se há pedidos de concessão em processo de análise, incompletos, ou com emissão de títulos pendente do pagamento das taxas, cujos requerentes estejam a operar no terreno como se tudo estivesse em ordem; (x) outros aspectos que o grupo de trabalho entenda relevantes.
B. Sobre licenças de corte: Elaborar um check-list do que se entender relevante, e auditar 10% do nº de licenças em cada Província.
C. Sobre os compradores /exportadores: Elaborar um check-list do que se entender relevante auditar.

Florêncio

PS: 1. Olho para a floresta como um património cultural (pelas espécies vegetais e animais que nela vivem), mas também como um bem económico que deve ser explorado com racionalidade, dentro de normas técnicas e científicas a que qualquer governo hoje pode ter acesso. É com base nesse conhecimento que cada país elabora as leis e regulamentos que permitem a exploração económica desses recursos de forma sustentada.
2. No nosso caso, duma maneira geral, o quadro legal sobre esta área é adequado. O problema reside no não cumprimento da legislação em vigor, por vários motivos, entre os quais, com peso muito, muito relevante o TRAFEGO DE INFLUÊNCIAS e outras formas de CORRUPÇÃO exercidas por empresários com profundas ligações ao partido no poder.
3. Importa pois que os governantes assumam que: (i) há um quadro legal que não está a ser cumprido, logo, há IRREGULARIDADES NO SECTOR; (ii) há quem beneficie financeiramente com as irregularidades, logo, há CORRUPÇÃO.

Carlos Serra disse...

Excelente texto, excelente proposta. Mas tenho para mim que se fecha cada vez mais qualquer hipótese de serem tomadas em conta sugestões como as feitas ou a fazer. Abraço.