26 outubro 2006

É perto mas não é perto

Sempre me fascinou uma coisa, desde a minha meninice, lá na minha terra, vasta, que é Tete: o oxímoro.
Em várias ocasiões, por motivos diversos, em vários dos distritos da província, por vezes em sítios recôndidos, perdido muitas vezes, sem qualquer sentido de orientação geográfica, tive de perguntar a camponeses onde ficava o sítio xis.
E a resposta era, invariavelmente, a mesma: um dedo apontando a estrada e um breve "Ali, siô". E, não menos invariavelmente, eu perguntava: "É longe?"
Uma vez mais, invariavelmente, a resposta era: "É perto mas não é perto" (ni pafupi koma pafupi). E, aqui e acolá, o acréscimo: "Não precisa pressa, há-de de chegar ao destino. Obrigado" (Bzinfunika lini kankulumize uti ufike ulendo bwako. Ndatenda).
O que representa o oxímoro "É perto mas não é perto"? Uma contradição? A falta de um relógio? Uma contabilidade temporal distinta?
É possível dar uma resposta pronta-a-vestir a cada uma dessas perguntas. Mas, ao fim destes anos todos, cheguei a uma conclusão por via da alma: "É perto mas não é perto" é uma forma de nos cumprimentar, de nos saudar, de nos suavizar as agruras das viagens, de trazer o longe para perto e o tornar familiar.
Mesmo que não aceitem a minha conclusão, nada podereis fazer contra a minha alma, porque ela é a minha emoção contra a vossa razão, a emoção que os embondeiros de Tete ensinam.

6 comentários:

Anónimo disse...

Eu aceito e emociono-me.

Egidio Vaz disse...

Ha quem diga que o tempo africano nao existe. Ele faz-se.
Portanto, a distancia e longa enquanto nao caminha-la.
Ela e curta depois de percorre-la.
Que belo relogio africano!

Carlos Serra disse...

Espero que ganhem o Benfica e o Chingale da minha terra...

Carlos Serra disse...

Ah, é verdade, obrigado pelo elogio, fico feliz em saber que os estudantes vão criando blogs. Parabéns.

Anónimo disse...

Aqui em Minas Gerais, interior do Brasil, recebemos a seguinte resposta à essa pergunta: "Fica a um 'tirinho' daqui". Depois de léguas caminhadas, passamos a estranhar a potência do tiro. A resposta delicada parece ter o mesmo objetivo: não nos deixar esmorecer!
Tens uma sensibilidade inebriante, professor!

Carlos Serra disse...

Sem dúvida, Fátima!