16 janeiro 2010

Da Vila Algarve




Passam os anos e não há meio de ver a Vila Algarve (em plena Polana, cidade de Maputo, próximo do Palácio dos Casamentos) arranjada e com proprietário. Obra de grande valor arquitectónico, pertence ao património urbano ainda não destruído, foi terminada em 1934 (sendo proprietário José dos Santos Rufino), alterada em 1936 e ampliada em 1950. Tida como sede da polícia política portuguesa (PIDE, Polícia Internacional de Defesa do Estado). Em 2008 foi divulgado que o edifício passaria a ser a sede da Ordem dos Advogados de Moçambique, fez-se uma protecção, os jovens sem abrigo que lá moravam foram desalojados. Mas hoje tudo continua desabitado e os jovens sem abrigo voltaram a ter abrigo lá. Tenho para mim que este é um edifício que deveria servir de museu. Finalmente: se quer ter uma ideia dos edifícios e quiosques que já desapareceram da cidade de Maputo, bem como dos que ainda existem, confira aqui. Fotos tiradas por mim esta manhã.

5 comentários:

ricardo disse...

Pelo andar da carruagem, temos um guesthouse de luxo em vista ou, no minimo, um edificio de escritorios (para advogados!!!), como "fonte" de rendimento da propria Ordem dos Advogados, que fazendo jus a sua profissao, veste uma pele diferente a cada nova direccao. E sempre com o mesmo refrao: NOS VAMOS REABILITAR...e patati patata.

Melhor do que isto, so a lenda de D. Sebastiao.

Nem razoes morais poderao invocadas se atendermos que a Sede da PIDE, na rua Antonio Maria Cardoso, tambem e, hoje, um guesthouse de luxo!

Houve protestos e passeatas. Mas quem la foi? A edilidade para reafirmar que a traca seria mantida...

Mas ainda temos o Predio Pott, cujo destino nem me atrevo a imaginar.

AGRY disse...

A propósito da Vila Algarve, o jornal O SOL, noticiou em Maio de 2008 que a Ordem dos Advogados quer transformar edifício da PIDE em «sede dos direitos e dignidade humanas» e citava declarações de Gilberto Correia, Bastonário da OA: «A memória dos moçambicanos associa aquele sítio à violência macabra praticada pela PIDE contra a legítima oposição à repressão, mas se para lá efectivamente passar a Ordem, terá o simbolismo de que esse período sombrio é passado »
Em resposta, produzi, na altura este comentário que me parece manter toda a actualidade
“A recuperação da Vila Algarve cabe, em primeiro lugar ao Estado moçambicano. Esta transferência de responsabilidades não conduziu a lado nenhum. Aguardo, com entusiasmo moderado, que seja desta que se deite mão à obra.
Entretanto convém recordar, para que Não se Apague a Memória, que por decisão de Vitor Crespo, foi destruída, em Moçambique, toda a documentação que se encontrava na Vila Algarve.
Não faço a mínima ideia quem teria investido este senhor de poderes para se permitir decidir destruir o património politico, cultural, histórico que aqueles documentos representavam!
Tenho uma enorme dificuldade em perceber a impunidade de alguém que resolve branquear o passado em nome de uma " transição pacífica" ! O argumento é demasiado parolo e fascizante para que seja ignorado.
Não foram apenas os Pides ,que ainda hoje se sorriem, os beneficiados da "ingenuidade politico-juridica" de alguns iluminados!
Recordo, aqui, Kundera: "A luta do homem contra o poder é a luta da memória contra o esquecimento"
Espero bem que a amnésia histórica não se sobreponha a valores que importa preservar. A hipocrisia nojenta que passa ao lado de situações como estas, não nos pode deixar indiferentes.
Não foi George Santayana que escreveu que aqueles que esquecem o passado estão condenados a repeti-lo?”
Agry White

Viriato Dias disse...

“Não há reforma na área do património que resista a críticas.” Foram estas as palavras do Dr. João Carlos Brigola, meu docente da disciplina de Reabilitação, Conservação e Valorização do Património Cultural na Universidade de Évora , e destacado político do PS. Vem-me à memória a frase do especialista Dr. Brigola a propósito da destruição do Cinema Kudeca (pariu uma parte das minhas lembranças de infância, que jamais o tempo conseguirá destruir) sobre a qual me atrelo em acordo. Por incrível que pareça, estou inteiramente de acordo com a edilidade por DUAS razões:
A primeira é a natureza do edifício, os fins para os quais foi construído. O Kudeca (não me lembro se chegou a ter alguma classificação) foi construído com fins lucrativos, e apesar de todo o seu requinte histórico que eu respeito, entrou em alto estado de usura, deixou de satisfazer as reais necessidades pelas quais foi construído, numa altura em que a televisão era um aparelho de segregação racial em Tete e no país em geral. Manter um edifício às moscas, sem nenhum retorno ao investimento gasto, para além de constituir perigo aos seus utentes, sem duvida que o desuso seria o caminho em que o cine iria atingir.
O segundo motivo tem a ver com a questão espacial. O Kudeca, não tendo nos tempos actuais qualquer “integração” na sociedade tetense, a edilidade achou por bem que aquele espaço, ao invés de ser reestruturado e enquadrado nos moldes actuais, tinha que ser demolido. Uma atitude justa, até porque a estrutura do edifício não daria para grandes ideias que não passasse mesmo pela sua destruição. Além de que (salvo o erro) o empreendimento nunca chegou a ser classificado, em nenhuma escala, a património público nacional ou em zona de protecção como manda a lei. Um hotel seria, quanto a mim, justo.
O Kudeca não é caso único de um “empreendimento histórico” (para uns, para outros não passava de uma mera relíquia em usura) a ser destruído no país e no mundo. Recentemente a China destruiu um bairro inteiro de construção portuguesa; na Bélgica presencie recentemente a destruição de casas de valor histórico para, em seu lugar, erguerem-se zonas / empreendimentos de luxo adequados aos moldes actuais. Concordo que nem todos terão acesso a esses empreendimentos, mas há que ter em conta o estado dos edifícios, a rentabilidade, e outros factores de natureza social.
Defendi há um trabalho sobre a conservação da Ilha de Moçambique. Nele coloquei como recomendação a criação de instituições de apoio ao património, nem que a essas instituições fossem concedidas a “lei de mecenato.” Creio que só assim é que grande parte do nosso espolio teria outro aspecto digno de valor. Temos que respeitar a cidade dos mortos, mas não podemos nos agarrar ao passado sob pena de ficarmos permanentemente estáticos, concluiu o Dr. Brigola.
Termino por aqui com votos de boas entradas a todos. Até breve.

AGRY disse...

Não resisti e decidi fazer uma postagem breve, sobre este tema e tomei a liberdade de lhe "sacar" a imagem que acompanha o texto
http://agrywhite.blogspot.com/2010/01/sem-memoria-nao-ha-futuro.html

Anónimo disse...

Aquilo vai ser pra INSITEC/BCI é só esperar pra vêr