"A categorização dos povos africanos em “tribos” remonta ao período da colonização e ainda hoje pode ser lida nas páginas dos jornais, pois os conflitos africanos chegam às salas de redação do mundo todo com manchetes prontas, geralmente provenientes das agências de notícias norte-americanas ou européias.” Aqui.
Oitavo número da série. Prossigo a série sempre com hipóteses. Escrevi no número anterior algumas linhas sobre o mundo das diferenças sociais. Linhas que são regra geral esquecidas quando discutimos etnicidade. Consideremos a etnicidade estratégica. O princípio da etnicidade estratégica, politicamente estratégica, nada tem a ver com a etnicidade popular, aquela identidade do dia-a-dia, instintiva, de fácil consumo. Não é porque há diferenças étnicas que há indício de poder contestador: é porque há indício de poder contestador que há diferenças étnicas. Não houve nem há problemas étnicos gerais em Moçambique. São sobretudo elites marginalizadas no usufruto de recursos de poder e prestígio que criam o discurso étnico, que criam a ideologia étnica. A etnicidade produzida em Moçambique e que é traduzida nos discursos de alguns líderes políticos, nada tem a ver com tribalismo, com conservadorismo cultural, ela não é a continuação das consciências étnicas do passado, não é um produto directo de uma "guerra étnica". Essa etnicidade é estratégica, é politizada, é política: é um recurso, entre outros, nas estratégias ganhantes postas em campo. Ela implica uma reinvenção e uma reutilização estratégica de símbolos considerados tradicionais e surge historicamente quer quando grupos sociais em ascensão ou impedidos de ascender são confrontados com a desigual distribuição de recursos de poder e prestígio, quer quando grupos que gerem o poder-Estado, por exemplo, se sentem ameaçados. A etnicidade estratégica não é uma herança do passado: é uma arma política moderna, contemporânea.
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