14 outubro 2010

Cesta básica

5 comentários:

(Paulo Granjo) disse...

Parecemos regressados ao séc. XIX, e à definição de valor da força de trabalho por Marx...

Mas seria interessante (e útil) analisar à luz da economia política essa prática de pagar muito menos, não só do que o valor justo, mas também do que o valor necessário para reproduzir a capacidade de trabalhar.

Claro que, para isso, os empregadores estão a contar que toda a família do trabalhador se multiplique em todo o tipo de actividades precárias e quase necessariamente "informais", para poderem completar o dinheiro necessário.

O caso não é exclusivo de Moçambique, nem de outros países africanos.
Por exemplo, o modelo da baixos salários da indústria textil portuguesa contava com o facto de os operários serem ex-camponeses recentes, que saíam da fábrica para as suas pequenas machambas, onde cultivavam garnde parte dos vegetais para a alimentação familiar.

Hoje, a indústria textil portuguesa está quase toda falida.


PS: tenho tentado comentar outros posts mas, nas últimas duas semanas, não me têm aparecido as letras necessárias `"verificação de palavras". Estará o problema definitivamente resolvido?

Carlos Serra disse...

Obrigado pelo comentário. Sempre reflicto marxianamente neste caso, reproduçcão imediata do trabalhador e reprodução da família. Quanto aos comentários, bem, não tenho notado nada de especial, mas a coisa voltara acontecer tente um outro motos de busca, há muito que não uso o IE. Abraço.

ricardo disse...

A cesta basica parece-me um bom principio de discussao, mas apenas se nos limitarmos ao controlo dos factores endogenos e exogenos que concorrem para a especulacao do preco dos seus componentes...

Porque centrarmos a discussao no valor medio da cesta basica, segundo os preceitos do mercado, pode levar os srs. sindicalistas para o mato sem cao. Vejamos o exemplo do tomate, que sofreu uma variacao de 800 para 80 mt o saco em menos de 15 dias. Isto implicaria que o salario minimo tambem deveria acompanhar esta tendencia. Isto e, ou baixava (na pratica e isso que acontece), ou congelava. E veja-se tambem que nao ha preceito legal que impeca isso de acontecer.

Logo, o Governo e os Patroes saiem sempre a ganhar.

Disse

Anónimo disse...

Carlos:

Temo que, com a preocupação de não ser demasiado directo e duro, não tenha sido claro.
Permita-me que tente de novo.

Se os salários são tão baixos que o seu valor fica muito longe do necessário para que os trabalhadores comprem a reposição da sua capacidade de trabalhar e a criação de novos trabalhadores (o tal "valor da força de trabalho", de Marx), bases de negociação e reivindicação como a "cesta básica" são necessárias, desejáveis e facilmente compreensíveis por toda a gente.

Afinal, mesmo o mais iníquo de todos os sistemas económicos (o esclavagismo) assegurava aos seus trabalhadores o nível essencial de alimentação, vestuário, alojamento e cuidados de saúde - pela boa razão, para os senhores de escravos, de que se não o fizessem ficavam sem ninguém para trabalhar.

Mas sugiro também, para reflexão e debate, que a prática de pagar salários muito abaixo da "cesta básica" é extraordinariamente imoral (mesmo pelos critérios capitalistas), socialmente abusiva e economicamente ineficaz.

Lembremo-nos que, para Marx, a exploração é a apropriação pelo patrão da "mais-valia", ou seja, daquilo que vai do valor da "cesta básica" (que Marx pressupõe seja, no mínimo, pago aos trabalhadores pelo seu trabalho) até ao valor realmente produzido pelo trabalhador durante o seu horário de trabalho.

A ser assim, quando um patrão da indústria textil portuguesa pagava aos seus trabalhadores abaixo da "cesta básica" (o que ele sabia ser possível porque eles iam trabalhar para as suas machambas depois do horário laboral), estava a explorá-los dentro e fora da fábrica, no seu horário de trabalho e fora dele.
Quando um patrão moçambicano paga abaixo da "cesta básica" (o que sabe ser possível porque o trabalhador e a sua família se vão mobilizar para exercerem actividades, normalmente "informais", que permitam completar a tal "cesta"), está a explorar toda a família do trabalhador, embora só com ele tenha contrato.

Para além disso, não são (como se vê no caso dos texteis portugueses) os salários baixos que garantem a boa saúde das empresas.
No caso moçambicano, acresce a isso que a prática de salários muito abaixo da "cesta básica" estimula a (ou obriga à) economia "paralela" e "informal", fragilizando as empresas "formais", as receitas fiscais e capacidade de intervenção do Estado, e arcaizando a vida económica - embora seja isso que mantém o país a funcionar e permite que as famílias urbanas comam.

Talvez estas questões sejam úteis para a argumentação de quem concorde com elas - ou de quem discorde de que os trabalhadores sejam tratados, em termos económicos, pior do que os escravos.

PAULO GRANJO

Carlos Serra disse...

Obrigado, Paulo, irei fazer uma postagem especial com o seu texto.