26 dezembro 2006

10 mandamentos venais na arte de confusionar o adversário

Seguem-se 10 mandamentos venais na arte de confusionar, de pôr o adversário em dificuldade. Eles foram construídos tendo em conta o espírito cáustico (mas apenas isso, pois as ideias e a estrutura são minhas) de Schopenhauer (recorde a entrada precedente).

(1) SIMULAÇÃO: você convenceu-se de que tudo sabe, de que é um papa do conhecimento e de que os outros estão penosamente no rés-do-chão da sua sabedoria. Mas você, naturalmente, quer mostrar que é humilde, que está no mesmo andar que o adversário. Eis como dirá ou escreverá: "Sabe, devo confessar que desconheço por completo o tema, que para ele, portanto, não tenho respostas. Porém, fazer perguntas é uma forma de chegarmos os dois ao conhecimento. Ora, como você sabe..." Etc.
(2) DIABOLIZAÇÃO: você lida com um adversário que não suporta. Se você é aqui do Sul e ele do Norte, evidentemente que o tem por chingondo; se ele é "branco", evidentemente que você dele faz um "moçambicano não originário" que ignora a cultura africana (ou se você é "branco", achará certamente que ele, "negro", até escreve bem); se ele é indiano, evidentemente que dele faz um ladrão; se é misto, dele fará um ser dúbio, sem pátria, porque, assim acredita você, ele não é nem café nem leite, nem azeite nem vinagre: os seres híbridos o incomodam; se você sabe bem a língua portuguesa mas quer mostrar que é nativo puro, usará termos da sua língua natal para mostrar a pureza original, ao mesmo tempo que fará uma veemente crítica da língua portuguesa colonizadora. Este mandamento tem um estreito laço com o o 8.º.
(3) PROFECIA: pode desnortear o adversário dando-lhe a entender que o conhece bem e que sabe mesmo qual será a sua resposta ao que você analisou ou disse. Então, dirá algo como: "Já sei o que você irá responder, conheço-o bem!".
(4) MISERICÓRDIA: uma forma de colocar o adversário em dificuldade, consiste em mostrar quanta pena ele nos inspira, coisa que, naturalmente, incomoda. "Sabe, o senhor mete-me pena, lamento que possa pensar como está a pensar, a sua competência poderia ser melhor dirigida, na vida precisamos de ser mais prudentes".
(5) AUTORIDADE: existem múltiplas formas de tornar mais sólido, mais divino o que se escreve ou se diz, com um potente lastro de autoridade canónica, por exemplo socorrendo-se de textos religiosos, de afirmações de conhecidas autoridades religiosas ou científicas. "Segundo o versículo.....", "de acordo com L..., em seu livro...." Este mandamento tem estreita ligação com o 9.º.
(6) IRONIA: uma maneira clássica de colocar o adversário em dificuldade consiste em não levar a sério seja o que for que ele diga e escreva, por mais sério que seja. "Sabe, o senhor faz-me rir com todo esse estendal de lugares-comuns!". Ou, então, pode dizer-lhe que aquilo que ele disse ou escreveu é incompreensível, hermético, falso, enfatuado. Em última análise, dir-lhe-a que ele ofende o povo. E lhe fará ver que você, você sim, você vem do Povo, da humildade rural, mesmo que hoje habite um mansão de luxo e tenha quatro 4/4.
(7) COMPLOT: quando o adversário é forte e se sente que as suas ideias são sólidas, uma boa forma de o colocar na defensiva consiste em mostrar que aquilo que ele defende é produto de uma força externa, que ele, adversário, mais não é do que um executor, uma marioneta de uma força absoluta. Isto funciona bem a nível de luta política, tem efeitos dissolventes terríveis.
(8) SUBSTANCIALISMO: um mecanismo eficaz de luta consiste em fazer da vida um conjunto de acções regidas por substâncias inaltáveis, organizadas especialmente pelo presente do indicativo. Ou de provérbios simples. "Sabe, nós os.....somos assim", "Oiça, meu Amigo, não há fogo sem fumo", "Pode crer, quem come uma coisa quer outra", "O comunismo da Frelimo é sempre o mesmo!", "A Renamo foi e é sempre a desordem!", etc.
(9) SANTIDADE: exibir o nosso brazão, os nossos títulos, os nossos atributos nobiliárquicos, profissionais, académicos, a nossa força iconal, tudo isso dá muitas vezes um resultado aparatoso, circense. Quanto mais estranhos e vertidos em língua estrangeira, melhor. Usar expressões latinas (mesmo se fora do contexto; aliás, quanto mais for do contexto melhor), recorrer a anglicismos ("A mulher será tema de um workshop"), tudo isso é vital na luta com o adversário.
(10) PROVOCAÇÃO: o décimo mandamento pode ser o aglutinado de todos os outros, uma espécie de síntese de todos os outros. Pode resumir-se à provocação deliberada do outro, a levá-lo a irritar-se, a sentir úlceras gástricas, a segregar anti-corpos, a sentir-se seriamente ofendido. Bastam apenas alguns motes: "Sabe, o senhor jamais mudará na sua estupidez de convencido!" E tudo pode terminar com uma frase de ouro, sacrossanta, de régulo, do género: "Tenho dito!"
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Pode acontecer que eu reveja este texto. É provisório. Certamente há coisas a corrigir, a melhorar, etc. Vocês ajudam-me?

1 comentário:

Anónimo disse...

...mas é preciso considerar que existem dois modos de combater o adversário:Um com as leis , que é próprio dos homens, e outro com a força, que é o processo dos animais.Como o primeiro pode ser insuficiente, o homem deve estar preparado para recorrer ao segundo.Nesse caso, deve imitar, ao mesmo tempo, a rapousa que sabe reconhecer as armadilhas, e o leão, que se defende dos lobos.
"É prudente não manter a palavra empenhada quando isto for prejudicial aos seus interesses, e quando desaparecerem as causas que o levaram a empenha-la".
"Não é essencial que possua todas as boas qualidades, mas é fundamental que aparente possui-las:possuindo-as e usando-as sempre, elas são prejudiciais, enquanto que aparentando possuí-las são úteis.È bom ser e parecer fiel, humano,íntegro,religioso...mas é importante ter o espírito preparado e estar disposto a agir de modo contrário sempre que seja necessário"
Em síntese:O homem não deve se afastar do bem.Se necessário, não pode ter dúvidas em praticar o mal.A preocupação principal deve ser com a aparência.
O homem deve ter sempre o cuidado para que suas ações espelhem grandeza,coragem,seriedade, força...tudo bem fundamentado,para
que ninguem pense em engana-lo ou traí-lo.A maioria dos homens pode ver, mas poucos podem perceber o que realmente somos.
"O vulgo se deixa sempre levar pelas aparências e pelos resultados."
(Maquiavel)-(O Príncipe)
-No marketing maquiavélico, os fins justificam os meios.