Jogos de futebol, espectáculos musicais de massa, comícios, paradas militares e exposição de poderio policial são, naturalmente, coisas diferentes. Mas todos esses fenómenos possuem, em sua densidade sensorial, cinestésica, um mesmo fio condutor: um elevado coeficiente de amortecimento da consciência crítica. São, na verdade, analgésicos poderosos. Nos comícios políticos, por exemplo, o fundamental não é o que está a ser dito, o que está a ser proposto, mas o espectáculo em si, a actuação espectacular do líder hipnotizante e carismático falando durante horas seguidas num culto profano. Em momentos eleitorais, o comício pode casar-se com o espectáculo musical, ampliando-se, desta maneira, o poder irradiador do soporífero, com a emoção substituindo a razão. As paradas militares e a exposição do poderio policial são outras manifestações nas quais o alerta e de intimidação aparecem transfigurados em espectáculo imponente, ritualizado, divinizado, espécie de benzodiazepínico social destinado a substituir o pai freudiano.
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