15 maio 2014

"O símbolo dá que pensar" (o conflito das interpretações)

Juiz de Direito no Tribunal Judicial da Cidade de Maputo, secção de Instrução Criminal, Dinis Francisco Nhavotso Silica foi assassinado a tiro na manhã do dia 8 deste mês, quando conduzia a sua viatura. O juiz trabalhava nos raptos que preocupam o país. Esta é a segunda vez que um juiz é assassinado*. Só por si, o assassinato permite colocar esta pergunta simples: por que o juiz foi assassinado? Porém, acontece que, segundo a polícia, no carro da vítima foi encontrado muito dinheiro em meticais e dólares. Este fenómeno permite a colocação destoutra pergunta: por que levava o juiz tanto dinheiro na sua viatura? O infeliz acontecimento possui, então, dois fenómenos:  o assassinato e o transporte de dinheiro. A primeira pergunta pode levar a supor que o juiz foi assassinado porque os raptores estavam incomodados com o seu trabalho sobre raptos; a segunda pergunta pode levar a supor que o juiz foi assassinado porque estava envolvido na corrupção. Os dois fenómenos e respectivas perguntas têm dado origem a posições públicas veementes, seja em jornais, seja em redes sociais digitais. Na versão do "O País", por exemplo, confira posições aqui e aqui. Rapto, morte, dinheiro. Como escreveu um dia o filósofo francês Paul Ricoeur, "o símbolo dá que pensar" neste conflito das interpretações.
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*O primeiro assassinato foi, creio que nos anos 90, na Matola, o do juiz Alberto Santos Nkutumula (mais a sua esposa). O juiz trabalhava no dossier do roubo de motores e de outro material de aviões militares.
Adenda às 05:23 de 16/05/2014: magistrados pedem segurança, leia aqui.
Adenda 2 às 05:48: leia esta versão aqui.
Adenda 3 às 06:09: leia Tomás Timbane, bastonário da Ordem dos Advogados de Moçambique, na sua página do Facebook, aqui e aqui.
Adenda 4 às 06:40: confira também aqui.

4 comentários:

nachingweya disse...

À esposa de César não basta ser honesta; tem também de parecer honesta.

Salvador Langa disse...

Agora só falta saber se algum dia saberemos o que realmente se passou. Acho que nunca saberemos.

João de Sousa disse...

Não pode dizer-se que "o juiz transportava elevada quantia" só porque foi encontrada no carro do juiz: pode ter sido posta lá sem o juiz saber ou depois do homicídio, como noutra situação qualquer. Certo é que o dinheiro não foi o móbil do crime, o que é estranho e faz pensar que serve para difamar o juiz, ou seja, que pode haver um propósito de amedrontar os juízes que ainda estão vivos ... É possível também que os assassinos não soubessem da presença do dinheiro, matéria que a investigação deve abordar... A pior notícia é: se matam um juiz na rua, ninguém está seguro; pior ainda, se propagam notícias de corrupção sobre a vítima, nem sequer o património da família está a salvo... Recomendo: protejam a sua memória...

nachingweya disse...

Normalmente quando acontece um simples acidente que seja ocorre de imediato um grande afluência de pessoas que nem por respeito guardam distância dos factos ( lembram-se quando despenhou uma avioneta na praia da Beira?) e NORMALMENTE TAMBÉM, a polícia e os bombeiros fazem-se tarde ao local(o próprio comandante geral da polícia sempre muito didacticamente nos explica que em nenhuma parte do mundo a polícia pode ser colocada em todas as esquinas).
Portanto, é mais do que crível que a cena do crime já estivesse viciada quando a polícia de investigação chegou, não se pondo de parte a possibilidade de colocação / subtração de parte do dinheiro encontrado mas certamente com muitas testemunhas atentas ao fenômeno.
Difamar um morto? Não me parece. Amedrontar os juízes? Talvez.
No entanto a troca de mimos entre a magistratura e a polícia que deve investigar faz antever um caso inconclusivo.
Se culpado o juiz , o Sistema vai de mal a pior.
Se inocente o juiz , o País está podre, as Mafias estão a Governar o governo.
É o apocalipse!