08 maio 2014

Gente de língua mestiça

Seria fascinante que um dia os nossos linguistas começassem a estudar de que maneira ou de que maneiras as línguas são usadas enquanto mecanismo de dominação, urbana e rural, de que maneira ou de que maneiras elas se inserem na e homologam a produção de relações sociais hierarquizadas, de que maneira ou de que maneiras as formas de dizer e de escrever reflectem o poder extenso da dominação política, de que maneira ou de que maneiras reflectem estruturas de hábitos adquiridos e enraizados pelo poder político, de que maneira ou de que maneiras elas se inscrevem, enfim, nos campos simbólicos de luta e de dominação. Acresce que o poder político ama pouco a fragmentação das nossas línguas, a sua mestiçagem, a sua, digamos, urbanização. Por quê? Porque gente falante de várias línguas, gente de língua mestiça, vê melhor o mundo e descobre melhor os cordelinhos das relações sociais, os mecanismos da dominação política.

1 comentário:

AGRY disse...

O recurso a uma linguística fraudulenta e mistificadora permite institucionalizar um léxico que incorpore os pressupostos que o Poder pretende perpetuar. A descodificação de palavras impregnadas de ideologia permite, segundo François Chesnais, apreender as linhas básicas do processo de internacionalização do capitalismo bem como o festival de termos “vagos e ambíguos” que se tornaram dominantes no discurso político e económico recente: austeridade, meritocracia, inevitabilidades, empreendedorismo, partilha de objectivos, construção do futuro, precariedade...