02 janeiro 2014

Espírito do deixa-falar (3)

Membros da equipa, da esquerda para a direita nas caricaturas em epígrafe: Sónia Ribeiro, moçambicana, professora de Biologia, Bairro Sansão Muthemba, cidade de Tete; Carlos Serra, moçambicano, coordenador, Bairro da Polana, cidade de Maputo; Geraldo dos Santos, moçambicano, historiador, Bairro da Malhangalene, cidade de Maputo; Félix Gorane, moçambicano, advogado, Bairro do Macúti, cidade da Beira; Joseph Poisson, francês, farmacêutico, Rue des Écoles (quarteirão latino), cidade de Paris.
Félix Gorane: não há estatutariamente nada que impeça a Comissão Política da Frelimo de propôr aos membros do Comité Central os nomes que propôs. Absolutamente nada nos seus estatutos fecha a porta a essa possibilidade ou a essa decisão, não há "feridas" legais. E há, até, a vantagem democrática de propôr três candidatos e não apenas um como costuma ser de regra nos outros partidos. Quanto ao Sr. Poisson e ao que ele escreveu sobre os partidos comunistas. Partidos que nada têm de comunistas como o Democrático e o Republicano americanos possuem Comités Centrais. Comissões Políticas também existem em partidos que nada têm a ver com o comunismo, como, por exemplo, no que tange ao nosso país, o Partido Renamo e o Partido Movimento Democrático de Moçambique, partidos que se consideram do "centro-direita". Finalmente, o Partido Frelimo nada tem hoje que se pareça com o comunismo, teve alguma coisa no passado, mas só no passado, poucochinho. Hoje o Partido Frelimo é um partido liberal como qualquer outro, bem mais liberal até, bem amigo do capitalismo. Tenho dito. Cumprimentos. Félix
Joseph Poisson: eu tinha promis que haveria de faire un mot sobre a sua primeira intervenção, Mr. Gorane. É falsa cette histoire de la démocratie dos partis communistes. Verdadeiros communistes nunca changent, eles não amam a mudança. Apenas amam mudanças nos outros que sejam úteis para eles. No parti communiste que é o Frelimo, 15 membros du comité politique escolhem três pessoas uma das quais deve ser obrigatoriamente choisie por 187 membros du comité central, un comité que ainda tem 22 membros suplentes. Quer dizer, le comité central du Frelimo está proibido de escolhas próprias. Mais que chose bizarre, quelle éffronterie "démocratique". Que démocratie é esta, Mr. Gorane? Amitiés. Joseph
Sónia Ribeiro: ora então que os bons olhos de 2014 vos vejam e vos protejam! Andais a discutir a Frelimo, tudo bem, é vosso direito. Eu gostaria, caros cavalheiros de finos jogos de palavras, de propor que estudássemos esta guerrinha que parece haver lá para os lados de Muxúngwe. Ou é mesmo uma guerra? Não acham isso mais decisivo do que discutir o que estão a discutir? Beijocas aqui do Zambeze. Sónia
(continua)
Adenda: a série pode também ser consultada na minha página da Academia.edu, aqui; sobre como nasceu este deixa-falar, confira um texto do Geraldo dos Santos, aqui.

5 comentários:

Unknown disse...


1. Em primeiro lugar, os autores políticos e as causas preliminares desta "guerra da paridade" são sobejamente conhecidas.

Penso que, querer estudá-las, esmiúça-las, etc., seria, neste momento, extenuar a fertilidade da mente. Com isto, não quero retirar a ninguém o direito de analisar e discutir o problema.

Acho que não é tão importante do ponto de vista circunstancial que se estude quem deu o primeiro, mas sim as consequências deste e de outros tiros.

Porquê???

Porque estamos perante uma acção deliberada em que o Estado luta contra o próprio Estado.

Como "amante" das Relações Internacionais, pode afiançar que não conheço no mundo outro país assim, que actua desta maneira:

* há um "Parlamento democrático" em que o Governo (militarizado) é parceiro de um determinado partido da oposição (militarizado). A despeito da guerra verbal, não há mortes e há um consenso bíblico quanto às regalias, salários, etc.;

* há uma guerra em Muxúngue em que o governo é figadal inimigo da Renamo.

Não estamos a falar de uma "Renamo renovado", à semelhança do que aconteceu em Angola, pelo contrário, é a mesma que é parceira do governo no Parlamento.

Quem abastece os biberões da Renamo, em Muxúngue, até que se prove em contrário, é o próprio Estado através dos parlamentares desse partido, por outro lado, quem abastece os guerrilheiros da parte governamental é também o Estado, através do governo.

Agora eu pergunto, isto merece estudo ou uma punição imediata por parte do povo moçambicano e da comunidade internacional?

Qualquer estudo que se faça, neste momento, terá menor impacto que as consequências desta maldita guerra.

2. Terei que voltar à escola primária ou ressuscitar Camões para nos dar outro conceito de guerra. Não tenho dúvida que o país está em guerra. Se ela só existe em Muxúngue, não significa que o país não esteja. Muxúngue é parte do país e o país é também Muxúngue. Onde antes havia paz, hoje há luta, sangue, miséria, tristeza, coluna militar, etc. Isto não é guerra?

Antes que as palavras me morram nos lábios, por hoje termino.

Zicomo

nachingweya disse...

Nesta ordem de ideias teremos que concluir que o Partido Comunista Chinês, amigo e agora motor de práticas capitalistas, é um partido liberal como qualquer outro.
Prefiro acreditar que com o fim da Guerra Fria muitas frentes de descolonização convertidas em partido , geralmente único depois das independências, ficaram sem ideologia uma vez rompido o cordão umbilical durante a gestação ainda . Depois de uma gênese comunista libertadora como pode a Frelimo admitir que é menos comprometida com o povo e mais com o capitalismo que ela mesmo diabolizou até 1995? Inconsistência 'partiotica'?
Quanto a Muxungue: Tudo nasce pequenino, tudo nasce localizado. A guerra também . Um dos piores erros é pensar que se trata de episódios que não merecem notícia ou debate sério. A situação de Muxungue merece actos como uma sessão extraordinária da A R exclusivamente dedicada à guerra com visitas dos deputados de todas as bancadas ao local de conflito, adiamento das férias de Natal do Chefe de Estado ( a carga cínica contida no discurso de convidar para jantar ainda hoje quem se mandou matar ontem é pouco criativa) etc. para alguma vez se demonstrar algum respeito pelos governados e pela vida humana. A vida dos eleitores!

ricardo disse...

"...Partidos que nada têm de comunistas como o Democrático e o Republicano americanos possuem "Comités Centrais"...". Diz Gorane.

Pois e, mas os Colegios Eleitorais sao constituidos por elementos escolhidos por todos os eleitores. E nao um grupo de apparatchicks confinados num Congresso a portas fechadas!

E mais, no dia da eleicao presidencial cada eleitor vota no candidato a presidente de sua preferencia, por uma comissao de delegados ("eleitores especiais") que representa o seu estado no colegio eleitoral.

O partido do candidato que ganha a maioria dos votos no estado elege sua comissão e o candidato (ou candidatos) que perder naquele estado não ganha nenhum delegado.

Estes "eleitores especiais" podem votar em qualquer nome, mas normalmente votam no candidato pelo qual foram eleitos.

Pagava para ver isto no CC da FRELIMO...


nachingweya disse...

Não percebi a pertinência e oportunidade da revisão da Constituição quando foi proposta e durante o processo naquilo que chegou aos ouvidos públicos. Mas olhando para a nossa Bandeira salta-me sempre a vista aquela AK47 que não têm nada a ver connosco desde 1992 e esperamos que não venha a ter no futuro desta bela pátria de cidadãos.
O que seria preciso e quanto custaria desarmar a nossa Bandeira?
(Peço ao Deixa-Falar e outros que debatamos este assunto. Por pertinência já mudamos o hino nacional, porque não a Bandeira?)

ricardo disse...

A AK-47 tem a ver com a ideologia de luta da FRELIMO e isso explica tudo. Mas eu estou mais preocupado com os estatutos desse partido:

Determina o artigo 76 dos estatutos da Frelimo que “os eleitos e os executivos coordenam a sua acção com os órgãos do Partido do respectivo escalão e são perante este pessoal e colectivamente responsáveis pelo exercício de funções que desempenham nos órgãos do Estado ou autárquicos” e “quando se trata de cargos de âmbito nacional, os eleitos e os executivos serão responsáveis perante a Comissão Política”.

Ora, isto é constitucional?