Em 1977 ou em 1978, cerca das 4 horas de manhã, não me ocorre em que mês, Dinis Carneiro Gonçalves - o Sebastião Alba, um dos mais áticos poetas de língua portuguesa em meu entender - foi à minha flat na Julius Nyerere, cidade de Maputo, bateu à porta, eu abri, ele olhou sorridente para mim, com aquele sorriso irónico e penetrante que lhe conhecia e disse: "Calitos (sic), deixa-me ouvir o primeiro movimento da La Campanella!" Meio sonolento, pedi-lhe para entrar, fui ao meu velho giradiscos e pus a tocar o concerto para violino e orquestra no 2, em B menor, opus 7, de Niccolo Paganini, solo em violino de Shmuel Ashkensasi, disco comprado em 1973 e que ainda guardo. Dinis ouviu o trecho sem falar, dentro dele próprio, após o que partiu, como que apaziguado.
Sonhadores, os sociólogos sempre procuraram duas coisas: as leis do social e a reforma das sociedades. Cá por mim busco bem pouco: tirar a casca dos fenómenos e tentar perceber a alma dos gomos sociais sem esquecer que o mais difícil é compreender a casca. Aqui encontrareis um pouco de tudo: sociologia (em especial uma sociologia de intervenção rápida), filosofia, dia-a-dia, profundidade, superficialidade, ironia, poesia, fragilidade, força, mito, desnudamento de mitos, emoção e razão.
4 comentários:
Que coisa mais bonita!!! Obrigadão, Carlos Serra!
Um dia vi um mini film sobre Alba, no qual dizia: "Hà muitos poetas conformados",ao que o homem que o filmava o perguntou: - E tu, näo-o és? E ele respondeu: - Näo.
Esse filme deccoria numa casa abandonada, na qual o Alba vivia, sem nenhumas condiçöes de uma habitaçäo sä.
Achei Alba um homem muito honesto para ele mesmo, quando se desligou da ditadura da vida social em que vivemos, preferindo viver ao Deus darà.
E é verdade, no que o Dr.Carlos Serra conta, li num outro texto em que o quem conta esse episodio diz ainda que quando acordou, ao amanhecer, descobriu que o Alba tinha desaparecido, assim como uma garrafa de wisky.
Muito original.
Um bom dia para todos os seguidores desse blog.
Félix
NINGUÉM MEU AMOR
Ninguém meu amor
ninguém como nós conhece o sol
Podem utilizá-lo nos espelhos
apagar com ele
os barcos de papel dos nossos lagos
podem obrigá-lo a parar
à entrada das casas mais baixas
podem ainda fazer
com que a noite gravite
hoje do mesmo lado
Mas ninguém meu amor
ninguém como nós conhece o sol
Até que o sol degole
o horizonte em que um a um
nos deitam
vendando-nos os olhos.
Sebastião Alba
Assim era Sebastiao Alba, o Jaimito da Poesia...
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