A complexidade da vida obriga os seres humanos a produzir quadros e categorias simplificadoras e domesticadoras do social, que operam através de três movimentos: julgamento retrospectivo (do género "se assim foi no passado, sempre assim será"), indução simplificadora (trata-se do "efeito do corvo negro": se encontramos um corvo negro, somos tentados a supor que todos os corvos são negros) e precedência afectiva (primeiro os “nossos”, depois os “outros”).
Segundo número aqui. Escrevi, já, que somos um país produtor de mortos sem sepultura e sem paz. Falei-vos do tráfico de escravos, observando que deu origem a milhares de mortos sem sepultura, seus espíritos errando sem paz, camponeses e artesãos fugindo sem descanso. Mas o percurso castrense prosseguiu de forma severa. A ocupação militar colonial a partir de 1886 e os conflitos entre Portugal e a Alemanha no decorrer da Primeira Guerra Mundial (especialmente entre 1916 e 1918 no norte/centro do país) ampliaram o medo, a morte, o saque e a fuga nas comunidades aldeãs.
Sétimo número aqui. Sugeri-vos um sumário no número inaugural desta série, aqui. Inicio o último ponto: 3. Ênfase esquecida: luta com votos e não com armas. A quase totalidade dos textos sobre as eleições municipais sul-africanas foi dedicada à hierarquia dos votos. Num país como o nosso, onde as armas estabelecem regras nas zonas rurais, faltou ter em conta um fenómeno: a ausência de protestos armados pós-eleitorais. [imagem adaptada daqui]
A polícia frustrou esta madrugada uma tentativa de assalto de homens armados da Renamo a infra-estruturas sociais da localidade de Maconje, distrito de Tsangano, província de Tete, designadamente o centro de saúde e a secretaria da administração local. Não houve vítimas. Uma viatura policial foi atingida, tendo ficado com vidros partidos e tanque de combustível afectado. Este é o segundo ataque no distrito, tendo o primeiro ocorrido ainda este ano na localidade de Panga. - jornal da noite das 19:30 da "Rádio Moçambique". Recorde aqui.
Num portal imobiliário: "Desde janeiro de 2016 tem-se verificado uma redução de 30 a 40% na maioria dos preços de aluguer de residências em Maputo, com uma redução superior de até 50% em algumas áreas da Matola, tais como Matola Rio, Fomento e Matola Cidade. [...] As regiões de Pemba, Palma, Nacala – outrora "a prometida corrida do ouro” - têm visto muitos projetos pararem, encerrarem, ou a funcionar a taxas extremamente baixas de ocupação com rendimentos negativos, uma vez que os investidores estrangeiros e as empresas multinacionais retiraram-se por ora destas regiões". Aqui.
Adenda às 11:04: confira a euforia em 2013 por exemplo aqui.
As transições são sempre compósitas, complexas, mestiças. O novo faz quase sempre amor com o velho, os espíritos do passado coabitam com os espíritos do futuro. Por baixo de um fato cerimonial pode muitas vezes esconder-se o camuflado da guerra.
Se quiser ampliar a imagem, clique sobre ela com o lado esquerdo do rato. Nota: "Fungulamaso" (abre o olho, está atento, expressão em ShiNhúnguè por mim agrupada a partir das palavras "fungula" e "maso") é uma coluna semanal do "Savana" sempre com 148 palavras na página 19. A Cris, colega linguista, disse-me que se deve escrever Cinyungwe. Tem razão face ao consenso obtido nas consoantes do tipo "y" ou "w". Porém, o aportuguesamento pode ser obtido tal como grafei.
Aqui. Amplie a imagem clicando sobre ela com o lado esquerdo do rato. Nota: em Yaawo, kucela significa amanhecer. O jornal Faísca é editado em Lichinga, capital provincial do Niassa. Sobre a província do Niassa, confira aqui.
Homens armados da Renamo atacaram cerca das 5 horas da manhã de hoje o posto administrativo de Nihessiue [espero ter registado bem o nome, CS], distrito de Murrupula, província de Nampula, tendo causado estragos no posto policial, no posto de saúde e na residência do chefe de posto, para quem foram disparadas duas balas, mas sem o ferirem. No posto de saúde, os homens da milícia da Renamo roubaram medicamentos e redes mosquiteiras e queimaram parte da residência do chefe do posto. -
"Rádio Moçambique", jornal da noite das 19:30.
Adenda às 19:56: os milicianos da Renamo não visam unidades militares, mas especialmente postos policiais e de saúde em postos administrativos, para além de emboscadas a veículos civis das colunas motorizadas - eis o que parece possível de concluir dos ataques que se multiplicam e se diversificam em termos provinciais.
Adenda 2 às 05:48 de 29/08/2016: confira o relato no portal da "Rádio Moçambique" aqui.
Um dos próximos números da coleção "Cadernos de Ciências Sociais" da "Escolar Editora" chamar-se-á "O que é psicologia?" (título provisório) e terá como autores Zaida Morais de Freitas de Cabo-Verde, Fátima Rodrigues de Portugal, Palmira Fortunato dos Santos de Moçambique e Jaqueline Gomes de Jesus do Brasil, pela ordem de entrada na foto abaixo.
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Na última página do semanário "Savana" existe uma coluna de ironia - suave nuns casos, cáustica noutros - que se chama "À hora do fecho". Naturalmente que é necessário conhecer um pouco a alma da vida local para se saber que situações e pessoas são descritas. Segue-se um extracto reproduzido da edição 1181, de 26/08/2016, disponível na íntegra aqui:
É necessário resamorizar a vida e o futuro se queremos ter um novo tipo de relações sociais que bloqueie armas físicas e armas simbólicas, relações sociais que desarmem as mentalidades bélicas. Samora não pertence ao passado, mas ao futuro, Samora é futuro. - a propósito de Samora Machel, disse algo como isso ontem a um grupo de jornalistas, à margem de uma palestra dada na Associação dos Escritores Moçambicanos.
"Temos que encontrar uma solução que seja sustentável, viável. Não rasgar a Constituição da República, não depor abaixo a democracia que é uma realidade neste país, onde ciclicamente as pessoas vão às urnas para diferentes tipos de eleições, afirmou." Aqui.
Adenda às 03:43: algumas posições minhas ontem numa palestra dada na Associação dos Escritores Moçambicanos, aqui.
Muros sociais, historicamente construídos e reproduzidos (jamais muros naturais), mapeiam o nosso relacionamento com outrem. Quem estiver para além dos muros familiares, de amizade e laborais, quem estiver fora dos nossos muros culturais é encarado como estranho e, eventualmente, como irredutível e perigoso, especialmente se o contacto for com estrangeiros. O território que é o nosso, o território no qual habitamos, o território com as suas fronteiras convencionais, é bem mais do que um território físico, bem mais do que o território de uma comunidade, de um país. É, também (talvez devesse dizer principalmente), um território cognitivo, um território de determinados costumes, de determinadas regras, de determinadas maneiras de encarar a vida, de determinados grupos e classes sociais. Por isso parece-me adequada a expressão muros sociais. Essa expressão poderia ser ampliada com estoutras: muros cognitivos, muros morais, muros de preconceitos, muros de prejuízos, muros de clichés, etc. Muros que, em sua diversidade social, são como semáforos sociais: dão licença aos nossos, vedam o acesso aos outros, aos estranhos.
Saiba sobre Moçambique através do mais recente número de um boletim editado por Joseph Hanlon, com data de hoje, aqui.
Sexto número aqui. Sugeri-vos um sumário no número inaugural desta série, aqui. Finalizo este ponto: 2 Síndrome dos erros do vencedor. Escrevi no texto anterior que adeptos e adversários comungam do mesmo princípio: o ANC é o eixo de referência, o vencedor por natureza, o líder permanente, afectado apenas pelos seus erros na redoma primordial. [confira um texto com data de hoje aqui] É como no futebol. Quando uma grande equipa é derrotada por uma equipa modesta, a convicção é que perdeu não por mérito do adversário mas pelos erros cometidos. Nas notícias jornalísticas e no diz-que-diz popular, não é a vitória normal da equipa modesta que está em vista, mas a derrota anormal da grande equipa habituada a ganhar. O que importa é a grande equipa, não a pequena. A derrota da grande equipa é considerada uma tragédia. Na verdade, parece sermos prisioneiros fervorosos de darwinismos de todos os tipos. [imagem adaptada daqui]
A "Escolar Editora" irá expor os 16 números já impressos da colecção "Cadernos de Ciências Sociais".
Citada pelo "macauhub", a agência de notação de risco Moody's prevê um futuro sombrio para Moçambique, aqui.
Confira os cabeçalhos das três mais recentes notícias do mundo de negócios em Moçambique aqui. [se quiser ampliar a imagem clique sobre ela com o lado esquerdo do rato]
O dominador nasce quando a sua ordem é obedecida (impulso); o dominado nasce quando a ordem já é dispensável e ele limita-se a obedecer (aguilhão): bastam insígnias, uniformes, títulos, etc., para fazerem o aguilhão actuar. A dominação está interiorizada, a obediência ganhou vida própria, o quadro de referência do dominado passou a ser o do dominador. Se os dominadores constroem os dominados, os dominados reproduzem os dominadores.
A Imprensa Universitária da Universidade Eduardo Mondlane está a organizar um museu tipográfico, reunindo velhas máquinas em desuso. [agradeço ao Sérgio Tique a gentileza de me dar a conhecer a iniciativa]
Número inaugural aqui. Escrevi, já, que esta curta série tem duas ideias. A primeira é esta: se tivermos em conta a história, somos um país produtor de mortos sem sepultura e sem paz. A segunda é esta: nos pontos agendados pela comissão mista da paz não consta o problema dos mortos no actual conflito. Vamos à primeira ideia. Na verdade, temos a nossa história cheia de guerras. Os registos escritos assinalam-nas, especialmente com o tráfico de escravos a partir do século XVII. A caça ao escravo criou milhares de mortos sem sepultura, seus espíritos errando sem paz, camponeses e artesãos fugindo sem descanso.
Quinto número aqui. Sugeri-vos um sumário no número inaugural desta série, aqui. Prossigo neste ponto: 2 Síndrome dos erros do vencedor. Quando o vencedor perde pontos eleitorais, parcial ou totalmente, a matriz do pensamento dos adeptos e dos adversários consiste não em salientar a estratégia e os ganhos do (s) adversário (s), mas os erros do perdedor em si, por si próprios, como se produto de um certo tipo de autismo político. Por outras palavras: o (s) adversário (s) é (são) desnecessário (s), o problema é suposto residir unicamente no perdedor habituado a ser vencedor. Foi assim com o ANC. Este partido cometeu erros, teve encalhes em algumas cidades - assim se defendeu e defende. Se não os tivesse cometido teria ganho. Adeptos e adversários comungam do mesmo princípio: o ANC é o eixo de referência, o vencedor por natureza, o líder permanente, afectado apenas pelos seus erros na redoma primordial. [imagem adaptada daqui]
Sobre os Jogos Olímpicos ontem terminados no Rio de Janeiro, um texto de Diogo Oliveira, a conferir aqui.