08 junho 2013

Gramsci+A carta dos médicos+Chissano

"A Associação Médica de Moçambique era apenas uma trincheira avançada, por trás da qual se situava uma robusta cadeia de fortalezas e casamatas; em medida diversa de Estado para Estado, é claro, mas exatamente isto exigia um acurado reconhecimento de caráter nacional." - esta adaptação de um texto clássico de Gramsci serve de intróito a uma notícia, hoje divulgada, com o seguinte cabeçalho: "Uma carta assinada pelo médico ginecologista Pascoal Mocumbi e subscrita por outros 84 médicos especialistas de diversas áreas e mais antigos do Serviço Nacional de Saúde (SNS) foi enviada ao Presidente da República, Armando Guebuza, para manifestar a sua indignação face à actual situação na Saúde e apela à sua intervenção para a solução deste problema." Na verdade, a carta, tendo à cabeça o nome sonante de Pascoal Mucumbi, representa um conjunto robusto e decisivo de "fortalezas e casamatas" neste delicado, muito delicado despique de trincheiras em curso no país.
Pensamento: tenho pensado se neste dossier e no da Renamo, Joaquim Chissano (ele que quis estudar medicina nos anos 60 do século passado) não seria um excelente negociador governamental. Lembremos o que afirmou há dias através do parágrafo final desta notícia, quando do oitavo dia da greve dos profissionais da saúde, aqui.
Adenda às 20:10: o presidente da República, Armando Guebuza, visitou esta manhã o Hospital Central de Maputo e pediu aos profissionais de saúde que regressassem ao trabalho porque - afirmou - a vida humana é sagrada e não tem preço.
Adenda às 9:20 de 09/06/2013: no portal da "Rádio Moçambique" um trabalho sobre a visita do Chefe de Estado referida na postagem anterior, aqui.

7 comentários:

TaCuba disse...

Brilhante, mas caro Prof o Chissano não figura entre os membros da linha dura da Frelimo...

Joana disse...

É giro ver aqueles criadores que passam destas bandas para copiar o tema e depois chaparem em seus sites como se fossem originais....ahahahaha!!!!

ricardo disse...

Esta evolucao dos acontecimentos reforca a minha conviccao que o actual bastonario dos medicos deveria ser substituido por alguem mais engajado com a sua classe profissional.

Outro pormenor. Estao la tambem duas assinaturas. Uma do prof. F.Vaz e outra da dra. O. Albuquerque. Convem recordar que ambos foram indicados pelo MISAU a produzirem um regulamento para os cursos de pos-graduacao, os quais, tambem estao sendo usados como armas de arremesso contra colegas de trabalho. Ontem mesmo, vi um dr. Mouzinho Mario - a contragosto - a anunciar estas irreflectidas medidas contra seus colegas. Em suma, ja nao ha duvidas que somente um punhado, mas muito residual mesmo, e que continua a afinar no diapasao do Governo.

So tenho pois a lamentar, a reaccao tardia destes veteranos ao actual "status-quo". Ha muito que deveriam ter tomado posicao perante o MISAU. Logo na primeira greve. Porque hoje, ja nao sei se serao escutados.

Carlos Serra disse...

Este é um problema que tem várias arestas e cuja solução não pode ser unívoca.

Salvador Langa disse...

Senhoras e Senhores é ler o que alguns escrevem no semanário Domingo do dia de hoje sobre a greve, especialmente o coronel Sérgio Vieira.

nachingweya disse...

A vida dos médicos também é vida humana, Sr Presidente.
Tão humana e, portanto, sagrada como a vida dos alfandegários, magistrados, deputados, ministros e desses empresários de sucesso que não precisam de trabalhar.
PS:ministros que mandam alcatroar estradas para o seu talhão com fundos de empresas tuteladas ou têm interesses empresariais privados em áreas onde gerem a coisa pública não podem garantir integridade

ricardo disse...

Tem razao sr. Professor. Todo problema tem pelo menos 3 dimensoes visiveis. Mas tambem, toda a solucao passa pela eliminacao e nao pela acomodacao de obstaculos intransponiveis.

Se a ordem nao se posiciona com firmeza, ao ponto de ser uma parte significativa dos seus associados a tomar posicao, para que servira ela?

Analisemos. Quais sao as 3 grandes questoes que constituem o "pomo" da discordia?

1- Salario. O que esta em causa?

2- Habitacao. O que esta em causa?

3- Estatuto do Medico. O que esta em causa?

O salario. Primeiro que tudo, ha que quebrar um tabu. Um ministro da Saude nao tem de necessariamente ser medico. Pode ser um simples gestor. Porque, acima de tudo, como pudemos observar, ha uma descontrolo financeiro naquele ministerio. Ha quem receba uma miseria. E ha quem receba salario e um ou mais subsidios. No MISAU, ha salarios sendo descontados para a celula da FRELIMO, mas o SISTAFE nao tem essa rubrica. Quid Juris? Por isso, antes de irmos fora de portas procurar bodes expiatorios na AT, Magistratura ou Banco de Mocambique, facamos o trabalho de casa no MISAU. A todos os niveis.

2- Habitacao. Aqui ha que clarificar o seguinte. Se o ministro Manguele ja promulgou um Despacho anulando a decisao de Paulo Garrido, estipulando a devolucao dos imoveis aos medicos, sobretudo os que residem fora da cidade de Maputo, entao, quem e que esta a desobedecer a ordem ministerial? Este, como ve, e um "nao problema". Nem sequer deveria ser discutido.

3- O Estatuto Medico. Este sim, e que o busilis da questao. E aqui onde tudo converge. Quem resolver este assunto, tera dado um passo de gigante que resultarao na anulacao dos dois anteriores. Mas este, e tambem aquele que dificilmente sera discutido ou aceite na forma em que esta. Primeiro, o documento ora aprovado na AR foi redigido por pessoas estranhas a classe medica. Nem sequer o MISAU teve poder de intervencao. Dois ou mais consultores das Financas com outros tantos estrangeiros, produziram um documento e fizeram-no aprovar na AR com o voto disciplinado da FRELIMO. Os medicos, claro esta, nunca poderiam digeri-lo, visto que: a) nao estabelece um estatuto remuneratorio e pensoes em conformidade com o aumento faseado dos salarios (promessa do Governo) ate 2015; b) nao assegura maior rigor para admissao na Ordem dos Medicos; e c) reduz o protagonismo da Ordem a meros actos simbolicos. E por fim, a grande questao, nao assegura reformas condignas a quem ja deu 20 ou 30 anos ao SNS. Ou seja, na Saude, para se ter uma boa reforma, e preciso ter ja sido ministro ou vice. Ou seja, a premiacao da carreira, e por expediente politico e nao profissional. E isto, e algo que nenhum defensor da classe medica podera aceitar.


Eis porque um escolho chamado Zilhao se tornou absurdamente inconveniente para a classe medica.