10 abril 2011

Cinco riscos espreitando os jovens cientistas sociais moçambicanos (11)

O último número da série.
Escrevi anteriormente que me falta o engenho para moralizar ou propor catecismos científicos. Todavia, tenho por bem que a humildade - uma profunda digamos que humildade operária - deve ser a coluna vertebral do jovem cientista social moçambicano, atento que precisa estar aos cinco riscos por mim sugeridos. Mas atento, também, a outros problemas, afinal riscos eles ainda, dois dos quais são estes: (1) a veneração pelos pais fundadores, pelos "clássicos" e (2) a veneração pelos pregadores, pelos proponentes de receitas.
A terminar, um pouco mais de predicação: os jovens cientistas sociais moçambicanos deverão tentar cortar o cordão umbilical que os liga aos produtores de manuais e de receitas, às fontes de autoridade sacralizada, deverão romper com a dependência dos paradigmas enlatados, deverão procurar a independência teórica e metodológica. É preciso ter em conta que todos os processos cognitivos estão sujeitos à historicidade, que não são eternos, que são sempre um momento numa cadeia ininterrupta de bifurcações e mudanças, de alternância entre o velho e o novo. Há todo um programa multisectorial de pensamento pós-enlatado a praticar e, especialmente, a praticar com muita humildade, com muito rigor científico, com muita pesquisa, com muita experiência de terreno e com uma permanente atenção a esta pergunta velha e esquecida: que tipo de ciências sociais precisamos para tornar o mundo mais justo e mais solidário? Isso tudo sempre procurando fugir aos riscos que sugeri, furtando-se ao pregadorismo barato e beato, ao academicismo estéril, ao erudicismo balofo, à vaidade de PhD, às seduções do poder político, ao divórcio para com as grandes causas da humanidade.
(fim)
Adenda: esta série será retrabalhada e reescrita para ulterior publicação.

2 comentários:

Xiluva disse...

Bravo!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

ricardo disse...

Do ponto de vista academico, acho a V. conclusao correcta. Mas ela leva-me a pergunta fatal:
A humildade operária, que deve ser a coluna vertebral do jovem cientista social moçambicano, e economicamante sustentavel? Pelo proprio jovem cientista e como? Pelos consumidores do jovem conhecimento cientifico, e quem?
Neste caso concreto, por experiencia propria, tenho constatado que neste pais, a humildade resume-se a discussao publica silenciosa e a publicacoes cientificas no exterior.
Academia ideologizada e contra-senso total. Vi e vivi isso na UEM pese embora estivesse num curso de ciencia aplicada. Nao encontrei cenario diferente nas outras instituicoes de ensino em Mocambique. Em suma, a humildade operária sempre se cingiu a publicos minusculos e selectivos, principalmente estrangeiros e do mesmo diapasao ideologico. Como uma coisa rustica inedita. E acredito que inclusivamente Vos fizestes o mesmo percurso seguindo a mesma cartilha. Hoje, consagrado e reconhecido internacionalmente, tendes uma VOZ autorizada para falar diferente do establishment local e apontar esses defeitos todos. Recordo-mo dos v. dialogos criticos que publicava no Jornal Domingo mas que na realidade tinham entre nos o mesmo efeito da musica dos Karat e Pudhys na ex-RDA. Criticas implicitas e indirectas, muitas vezes indecifraveis. O social, o povo, esse consumia aquilo como uma excentricidade dominical para encher chouricos. Mas hoje, esses jovens cientistas, relendo-os, inspiram-se para outros voos que todavia, querendo-o ser, fazem-no muitas vezes sob anonimato neste blog. Quantas vezes nao Vos vimos a reclamar?Nao Vos pediria para responder, mas o Centro de Estudos Africanos ate hoje e ainda considerado uma incubadora de ideias e visoes de Esquerda, o que, face a governancao neoliberal de Direita que temos desde 1994 ate desperta a curiosidade de muitos. Mas, Quid Juris, caro Professor? Sera que as virtudes se conformam no plano das ideologias? Eu penso que nao. Ficarei feliz no dia em que perceber que pensamentos e obras de arautos como Aquino de Braganca e outros forem abertamente questionados e contestados no Centro de Estudos Africanos. A idolatria cientifica conduz-nos ao engano e ao logro. Por uma questao de humildade operária, que deve ser a coluna vertebral do jovem cientista social moçambicano. E se houvesse algo a acrescentar, seria uma citacao de Dalai Lama, que no alto da sua humildade disse: "...O mestre é sempre responsável pelo seu proprio mau comportamento. É da responsabilidade do aluno não se deixar atrair por tais atitudes. Quando isso acontece, a culpa é de ambos: do aluno, por ser ecxessivamente obediente e devotado ao professor; e do mestre, porque lhe falta a necessária integridade para ficar imune aquele tipo de vulnerabilidade...". Fonte: Palavras de sabedoria - Dalai Lama.
Repito, embora academicamente correcta, a V. tese nao tera, muito provavelmente, sentido pratico no mundo real, dentro ou fora de Mocambique. Sendo que pessoalmente, embora nao seja um cientista social, palpita-me que o berco familiar e uma optima base para aquilo que viremos a ser no futuro, sobretudo profissionalmente. E isso tem sido desestruturado e descaracterizado a cada dia que passa neste pais, e sobretudo, por causa da tentativa dos libertarios de construir o Homem Novo. A intencao era boa. A aplicacao pratica foi outra coisa. Mas o caminho faz-se caminhando, ja nos disse. E enquanto houver vida, havera esperanca, diria eu.