25 abril 2011

Poder e representação: teatrocracia em Moçambique (4)

O quarto número da série, que no seu título usa um termo de Georges Balandier, teatrocracia.
No número anterior propus um sumário com oito pontos, destinados a um possível estudo do poder representacional no país.
O primeiro ponto é o poder pela visibilidade habitacional-laboral. Com efeito, do mais alto ao mais baixo escalão dos gestores do poder político, tudo se faz para que os locais onde morem e trabalhem se distingam pela diferença, pela visibilidade - enorme, imponente no que concerne aos mais altos escalões -, prepositadamente estruturada para mostrar que poder tem poder. Para a classe política, não faz sentido que o poder se apresente vulgarmente desprezível, em paridade com as obras do comum dos mortais, ele exige correspondência absoluta com a sumptuosidade na residência e no local de trabalho, sumptuosidade reforçada - nos escalões mais elevados - pela rede de empregados, assistentes, motoristas e seguranças. Promovido a chefe, grande ou pequeno, o simples mortal ascende ao reino do sagrado, entrando no sistema hierárquico da gestão política sacralizada. Nenhum elo da cadeia sacral permite a intrusão do profano: nos mais baixos escalões trabalha-se para se obter um símile identitário, mesmo se modesto. Por exemplo, na linguagem dos corredores hierárquicos do poder, a residência do pequeno chefe não é casa, mas palácio. O ser humano que se tornou chefe é metamorfoseado na categoria sagrada das estruturas (a estrutura está a chegar), torna-se Excelência.
Imagem: el poder, quadro do pintor e ceramista argentino Raúl Pietranera).
(continua)

2 comentários:

Anónimo disse...

Parabéns Professor pela exacta descrição do que acontece na nossa sociedade!

Os nossos Chefes entendem que o país se deve edificar do topo para a base, logo, o importante é construir sumptuosos novos Ministérios e outros Orgãos do poder Central, que impressionem o forasteiro e o Povo… sabendo, mas marimbando-se para o facto de “não haver almoços grátis”: os Chineses saberão apresentar a factura – ao Povo – da construção de todas essas infra-estruturas com juros capitalizados!

O mais preocupante é que esses senhores se AUTOCONVENCEREM que é prestigiante para o Povo, por mais miserável que” esteja”, ver os chefinhos, chefes ou chefões na luxúria e esbanjamento.

Julgam o Povo MASOQUISTA, logo, chefe que não “bate” não gosta do seu Povo.

Veja Professor o que aconteceu na inauguração do Zimpeto: aliciaram o Povo para a festa, para o poder, cito-o: “comemoracional-cerimonial; comicial; motorizado”…

E, depois da festa, cada um que se governasse (vale a pena ler pág. 3, Notícias de hoje : Inauguração do Estádio Naciona, Zimpeto entre o luxo e o caos). Um MEGAPROJECTO, sem qualquer viabilidade financeira, incapaz sequer de gerar receitas para a sua conservação futura.

Na ânsia de protagonismo, de visibilidade, não resistiram à construção do que chamam Estádio Nacional, esquecendo que o verdadeiro Estádio Nacional, é o da MACHAVA, esse sim, MONUMENTO NACIONAL, onde Samora proclamou a Independência Nacional. Local a preservar. Sem qualquer sentido o argumento que o estádio da Machava é pertença dum Clube, o Ferroviário, que afinal é Estado.

Em tempo de “CESTA BÁSICA” nada mais simbólico para o esbanjamento que o “fogo de vista”, simbolizado no fogo de ARTÍFICIO com que nos brindaram no Zimpeto.
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Salvador Langa disse...

Curto e brilhante.