28 junho 2007

Sarkozy e Guebuza (fim)


Temos assim um Sarkozy contra uma França preguiçosa, contra o assistencialismo, tal como temos um Guebuza contra o Moçambique preguiçoso à espera do Estado paternal. À busca da França sarkozyana gloriosa, antecipou-se Guebuza com a pátria amada e com a pérola do Índico. À família francesa unida de Sarkozy, pré-anunciou Guebuza a honesta família moçambicana.
E em múltiplos outros campos é possível encontrar identidades entre os dois presidentes.
Por exemplo, no campo das alianças e da cooptação política.
Se Sarkozy incluiu no seu governo ministros socialistas, Guebuza visitou o presidente do maior partido da oposição quando este foi hospitalizado na sequência de um acidente de viação e acaba de receber generais da Renamo descontentes com a sua situação profissional.
Entretanto - e este é um ponto capital -, ambos os presidentes evacuaram e evacuam do seu discurso qualquer referência séria e sistemática à divisão e às assimetrias sociais. Se à divisão se referiram e se referem, situaram-na e situam-na em campos inócuos (divergências de visão, perspectiva psicológica, globalização, etc.). Não surpreende, assim, que a preguiça seja por ambos encarada como algo exterior a um sistema social determinado e surja como algo que tem inexoravelmente a ver com as pessoas em si. No caso de Sarkozy a defesa do inatismo (homossexualidade, por exemplo) foi constante.
Ambos são dois bons líderes populistas no sentido do sincretismo político, da indeterminação e do minimalismo das orientações programáticas. Ambos oscilam entre uma orientação autoritária e uma deriva hiperdemocrática*.
E assim termino estas breves notas, às quais dei o selo do imediato e das quais aboli deliberadamente a análise em profundidade.
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Leia Taguieff, Pierre-André, L´Illusion populiste, Essais sur les démagogues de l´âge démocratique. Paris. Champs/Flammarion, 2007.

2 comentários:

Anónimo disse...

Gostei prof,gostei mesmo, do penúltimo paragrafo sobre a coincidência "populista" das duas figuras.E o "minimalismo" sem referência aos reais factores de coesão ou de fractura social, remete-nos à (in)capacidade de construção/reconstrução do discurso politico actual de todos os lideres politicos actuais - mesmo Chavez, Morales,ou Lula.Provávelmente porque pela primeira vez na história das sociedades o Poder de Estado e a Governação não tem senão uma capacidade residual de operar mudanças efectivas.A esfera do “social” já não lhes pertence ou pelo menos já não têm o monopólio dela.Há outros centros de poder que rivalizam e até mesmo superam os Estadosaos. Um antigo Ministro françês afirmou que para ele “a experiência mais forte que teve quando chegou ao poder,foi de compreender que não tinha poder”. E isso pode talvez explicar a tentação autoritária.Creio que a emergência do movimento cívico mundial em torno de vários direitos,valores,identidades (revalizando também com os Estados,reívindicando espaços mundiais) não passará “ímpune” pela História.A luta será dura!

Carlos Serra disse...

Obrigado pelo comentário e pela ampliação de visão que deu. Entretanto, acrescentei há momentos algo sobre a preguiça, coisa de que me esquecera.