24 novembro 2011

Diário de campanha (2)

Prossigo a série, abordando mais alguns pontos, mas lamentando sempre não poder estar no terreno observando e ouvindo.
Estigmatização. Em campanha eleitoral, os candidatos procuram mostrar que são as pessoas mais adequadas para governar e que os adversários não têm qualidades para isso. Tenho para mim que essa postura nada tem de anormal. O problema pode começar quando são transpostas as fronteiras da desqualificação aceitável e se entra num campo mais ofensivo, com recurso a expressões e a metáforas que não só desqualificam quanto estigmatizam.
Ausência da Renamo. Em 1998, a Renamo boicotou formalmente as primeiras eleições autárquicas do país, fenómeno que deu origem ao livro com as referências na primeira adenda abaixo. Em todo o lado, interpessoalmente ou em comícios, membros desse partido estiveram permanentemente a convidar as pessoas a não votar. Treze anos depois, a Renamo boicota de novo as eleições. Mas, desta vez, tanto quanto julgo saber, não tem andado a pedir às pessoas que não votem, pelo menos não há ainda registo público disso. Qual o impacto da ausência do partido? Irão os seus membros votar? Se sim, em que partido (s)? Um dado a avaliar após as eleições é a taxa de participação. Depois, será necessário verificar se a ausência de Renamo teve alguma influência nessa taxa. De qualquer das formas e segundo uma fonte, pelo menos em Quelimane parece que o partido apoia o MDM.
(continua)
Adenda: abordo múltiplos aspectos da engenharia eleitoral no seguinte livro: Serra, Carlos (dir), Eleitorado incapturável, Eleições municipais de 1998 em Manica, Chimoio, Beira, Dondo, Nampula e Angoche. Maputo: Livraria Universitária, 1999, 354 pp., confira especialmente pp. 43-243.
Adenda 2: recorde a minha série em 17 números intitulada Poder e representação: teatrocracia em Moçambique, aqui.
Adenda 3: sugiro recorde a minha série em 20 números intitulada Para ganhar as eleições em Quelimane, aqui.
Adenda 4 às 7:40: pontos de situação na imprensa aqui, aqui, aqui e aqui.

8 comentários:

Salvador Langa disse...

Mas na Beira o delegado da Renamo atacou o mdm dizendo que este recrutou gente para votar em Quelimane. Quanto mais divididos, mais facilitam a vitória contrária. Ora aqui está.

Anónimo disse...

Nao me surpreende que se tenha formado uma comissao de inquerito para averiguar o suposto transporte de eleitores da Beira para Quelimane pelo MDM cujo resultado vai ser anunciado dia 2 de Dezembro. O que me surpreende e o facto da CNE desta vez dar credito as queixas da Renamo. Renamo esta que em outras eleicoes denunciou o mesmo em relacao a Beira, sempre denunciou uso de meios e recursos do estado, etc,etc so que nunca ninguem levou a serio.

Anónimo disse...

Ontem estive a assistir o telejornal da nossa TVM e dar para notar, sem grande esforco, que o tempo de reportagem para os diferentes candidatos e de longe diferente. Por exemplo em Quelimane um dos candidatos merece 3 vezes mais tempo que o outro, porque sera?

Um outro facto curioso e que os 3 candidatos da Frelimo dizem que concorrem para dar continuidade com os programas e accoes "brilhantes" dos seus camaradas demicionarios. Entao se tudo era "brilhante" qual foi a necessidade de os mandar para a rua? porque e que se tem que gastar desnecessariamente dinheiro com intercalares se tudo andava bem?

Alguns dos dimicionarios mostram mais vitalidade na campanha que os seus camaradas actuais concorrentes pese embora algumas das razoes apresentadas para a sua renuncia fosse problemas de saude, problemas sociais, etc.

Anónimo disse...

Essa de dar continuidade pode sair pela culatra. Se for para dar continuidade com os burracoes de Quelimane, as ruas poirentas e a cronica falta de agua de Cuamba e o saneamento caotico de Pemba nao sei se nao se valera apena apostar nesta gente da continuidade.

E so ver o matagal mesmo em frente (onde deveria ser passeio) do palacio do governador de Cabo Delgado. Sera que vale apena apostar em quem aposta na continuidade deste matagal?

Anónimo disse...

Ninguem tem duvidas que, como tem vindo sempre a acontecer noutras eleicoes, ha uso indevido e abusivo dos meios e bens do estado. Os seus prevericadores nem fazem questao de esconder, acham-se com direito de os usar como quiserem que acham normal. Acho que deveria haver um grave penalizacao para os perivericadores ou sera que existe mas so funciona quando violado "pelos outros"?

TaCuba disse...

O problema tem sido colocado pelo Salvador, quem controla, quem é juiz imparcial neste processo? A CNE?

BMatsombe disse...

Partidos no poder em África usam toda a força do Estado para esmagar concorrentes.

ricardo disse...

Os candidatos exaltam-se. Os intelectuais indignam-se. Os correlegionarios ameacam. No entanto, em todos os pleitos eleitorais passa-se exactamente a mesma coisa...

Entao, porque e que se continua a acreditar neles?!

Nao seria melhor usar plebecistos com questionario de perguntas a todos os cidadaos, onde cada partido colocasse la a sua visao, e as pessoas respondessem, na condicao de, se aprovado por 50% dos eleitores, seria convertida em Lei que obrigatoriamente cumprida pelo Governo? Penso que este seria um metodo muito mais participativo e representativo.

E o governo? Nao seria melhor abrir um concurso publico para ministros, directores e PR? Penso que seria bem mais practico. Ja que o Estado e os interesses privados e familiares se juntam "naturalmente" neste Mocambique, entao nao obsta assumir uma visao empresarial do Estado. Governar por objectivos e nos, O POVO, os accionistas maioritarios da empresa. Se o CEO nao servir, rua. Abre-se novo concurso publico! Simples e eficaz.

E para que autarquias do Governo, com autonomia de gestao? E porque autarquia da oposicao, com representantes do MAE? Nao vejo porque autonomizar, se as ordens, o orcamento e os candidatos continuarem a vir da capital.

Em suma, acho que se perde muito tempo e dinheiro a brincar as eleicoes em Mocambique, que resultam quanto a mim, em shows de mera cosmetica para doador continuar a justificar (junto dos seus eleitores) a sua politica externa. A democracia dos nossos tempos ja nao e mais a de 100 anos atras. O mundo evoluiu. As formas de representatividade e de poder tambem. Admira-me que ainda nao se tenham apercebido disso...