05 setembro 2010

No lugar deles, o que faríamos? (1)

Achei bom criar esta nova série, com a seguinte pergunta: se estivessemos no lugar Deles, o que faríamos? Por outras palavras: em lugar de pensarmos a partir do nosso Lugar (da nossa posição social, do agregado comportamental do que somos e fazemos), o que achamos que faríamos se estivessemos no lugar dos Outros, no lugar Deles, daqueles que são diferentes de nós, daqueles cuja posição social e, portanto, cognitiva, não é a nossa?
Nota: seria óptimo que os leitores começassem desde já a propor respostas...
(continua)

7 comentários:

Abdul Karim disse...

No lugar dos que estiveram na manifestacao, provavelmente eu faria o mesmo,

No lugar do governo, eu ja tinha pedido demissao ha muito tempo.

João Feijó disse...

Questão bem colocada. Ora qual seria então o meu contexto?

1) Situação de desemprego de longa duração e ausência de habilitações literárias e profissionais (portanto de exclusão social)
2) Necessidade de subornar alguém na secretaria de uma escola (em quase meio salário mínimo) para em período pós-laboral ter uma vaga numa turma com mais de 60 alunos. Necessidade de também subornar (cada) professor
3) O pouco emprego existente é bastante precário, muitas vezes abaixo do ordenado mínimo (mas evidentemente a ter que suportar todas as despesas de transporte e a ser descontado no salário por cada vez que haja dificuldade de chapa. Descontos para a segurança social é ficção). Não compensa trabalhar, sou obrigado a fazer uma manobra e acabo por ser despedido.
4) Informação constante (nos jornais, na televisão, nas conversas informais) de funcionários governamentais que utilizaram ilicitamente dinheiro do Estado para fins pessoais.
5) Corrupção generalizada da polícia, de funcionários camarários, secretários de bairro, etc., etc., etc., que ao invés de servirem o cidadão abusam do poder para fins pessoais. Convicção generalizada, comprovada com as evidências diárias (demonstração crescente de sinais exteriores de riqueza), que os Governantes servem os seus interesses e não os do povo.
6) Cenário de pobreza e de exclusão que coexiste com uma crescente sociedade de consumo (valorização simbólica de telemóveis, aparelhos HI-FI, automóveis 4x4 ou de quintas nos subúrbios e compras na África do Sul), elevando as expectativas de mobilidade social e consequentes situações de frustração e de estigmatização social. Se “patrão é patrão”, “marginal é marginal", "preguiçoso é preguiçoso" e "falhado é falhado".
7) Extremam-se duas cidadanias que não comunicam entre si: a primeira das clínicas e escolas privadas, dos restaurantes de elite e dos 4x4; a segunda do bairro sobrelotado, do chapa 100, da refeição de chá e da sobrevivência diária.
8) O partido no poder afirma publicamente que aí ficará por “1000 anos”, inviabilizando as expectativas de rotação partidária. Crença generalizada que “estes pelo menos já se encheram enquanto que os novos que viessem ainda teriam que se encher”.
9) Cultura política de medo e impossibilidade de formação de uma associação da sociedade civil e de organização de manifestação pacífica. A experiência demonstra que o cabecilha seria rapidamente perseguido e intimidado e “neste país não temos quem nos proteja".


Alternativas viáveis (por ordem de prioridade)
1) Como "em Moçambique arriscar é arriscado" resta-me tentar arranjar um "brother" influente - um elemento no Governo, um "empresário de sucesso", um estrangeiro rico, ou um marido/esposa rico(a) - com bons contactos ou com posses económicas a partir do(a) qual pudesse retirar benefícios materiais. Exprimir docilidade e submissão, numa clara estratégia de sobrevivência social.
2) Arranjar um biscate qualquer (transportar mercadorias, comprar para vender seja o que for, estacionar ou limpar um carro, etc., etc.) para desenrascar, quer de forma lícita ou ilícita (se eu não o fizesse alguém o iria fazer, logo não posso ser "matreco")
3) Imigrar (clandestinamente) para a África do Sul e procurar desenrascar, de forma lícita ou ilícita.
4) Se nenhuma das alternativas anteriores resultar, se me aperceber que o grosso da população está na mesma situação que eu e se me sentir bastante desprotegido e revoltado, se perante uma situação de agravamento do custo de vida já não tiver nada a perder sentiria a necessidade de chamar a atenção nacional e internacional para a minha condição, da forma mais sensacionalista possível.

Carlos Serra disse...

A questão cardinal das ciências sociais...Ótipmas achegas para debate.

ricardo disse...

Identica questao foi colocada aos nossos governantes nos anos 60.

E eles responderam. Indo a Mueda exigir independencia e depois, conhecida a resposta, criando a FRELIMO.

O que e que teria sido se tivessem continuado a tentar a "via do dialogo"?

Unknown disse...

esta pergunta "no lugar deles o que fariamos" equival a reconhecer a existência de outras lógicas que determinam o comportamento de determinados grupos sociais. permite uma compreensão em vez de julgamento.
É uma postura que cada interveniente, num contexto de crise social ou mesmo no desenvolvimento rural, deveria ter.
para voltar à crise social, compreende-se a revolta. Já occorreu na história: o que levou o povo francês a se revoltar finais do século 18 foi o preço do pão que resultou na mudança radical de governação. porém, na altura, não havia sindicados e organisações socias, nem prática de manifestação em forma de desfil para determinadas revendicação. hoje esses instrumentos existem, principalmente nas camadas mais pobres (associaçao dos informais, sindicados, associaçºões de mulheres, etc), portanto seria uma via a tentar.
tantava também expressar revendicação: baixar o preço dos produtos alimentares de base, aumentar o salario mínimo, etc..

ricardo disse...

A política é quase tão excitante como a guerra e não menos perigosa. Na guerra a pessoa só pode ser morta uma vez, mas na política, diversas vezes (Winston Churchill)


Setembro Negro em Moçambique...

Nunca é tarde recordar que continua a valer o CONVITE para austeridade das regalias e salários dos altos dignatários do Estado, AR e empresas públicas, como BOM EXEMPLO a passar aos mais pobres da sociedade que já o fazem sem vontade. Coisa que NINGUÉM na política, imprensa, ONGs, academias nem os próprios manifestantes, falou no rescaldo destes tumultos...

Ou tratam-se de valores "irrisórios"?!

Nunca é tarde também RECORDAR que o papel dos sindicatos nas reuniões de concertação social com o Governo e Patronato deve ser revisto. No lugar de andarem a discutir o MÍNIMO SALÁRIO POSSÍVEL. Deveriam é passar a concentrar suas atenções no CABAZ MÍNIMO ALIMENTAR e como preservar os preços dos bens que o compõem (quaisquer que sejam os cenários e prioridades escolhidas pelo Governo, não se está a defender a politica da mão estendida). Pois está claro, que qualquer UM com salário mínimo sobrevive se tiver o que comer. Mas já não o fará, se tiver salário um salario competitivo face ao PIB, mas trabalhar de barriga vazia.

Um bom exemplo disso é Cuba, onde os salários SÃO MÍNIMOS para todos. Mas ninguém MORRE À FOME, DEIXA DE IR À ESCOLA OU DE TER ASSISTÊNCIA MÉDICA E MEDICAMENTOSA. E espantosamente, e quase assim na Coreia do Norte (?!!!), na Líbia (!?!) e na República Islâmica do Irão (?!?!) e Israel. Mas também na Suécia, Dinamarca, Noruega e Finlândia, onde mais de 60% do rendimentos pessoais são debitados em tributos que sustentam um fantástico sistema de segurança social. Não importa o regime político vigente, pois nunca como antes, as preocupações sociais estiveram realmente na agenda do dia da boa governação. E isto nao é um mero SLOGAN, é uma medida concreta e objectiva!

Temos que resgatar o Estado Social em Moçambique, ao invés de contribuir irresponsavelmente para a consolidação do mundo Material!

Para onde nos querem levar ao ignorarem isto? Uma nova guerra civil, sem ideologia e com objectivos anarquicos?

Porque meus senhores, É DA FOME QUE ESTAMOS A FALAR NAS CIDADES DE MAPUTO, MATOLA E CHIMOIO. E não do luxo, ostentação e do consumismo tolo de alguns iluminados que nos invadem a casa pela TV!!!

Sinceramente, eu gostaria que aparecesse aqui alguém a provar que eu estou ERRADO...

Disse

Abdul Karim disse...

Ricardo,

Nao estas errado, mas nao vai aparecer ninguem aqui para te responder,

O problema do governo, ja ha muito identificado, 'e "one way comunication" e esse tipo de comunicacao 'e feita porque nao existe capacidade de resposta as questoes, nem capacidade para discutir ideias, QI 'e baixissimo.

Mas reza a velha maxiam " na equipe que ganha, nao se mexe", entao eles nao vao aceitar mexidas, e nem aberturas, sao todos estrelas do "one way communication", nao ha feed back, podes aguardar sentado, ou ate deitares-te, nas calmas, nao precisas de te zangar,

Ja agora, as mambinhas "descarregaram a furia" ? ou acumularam pro proximo jogo ?