Como não sou um pensador sistemático, mas, antes, um pensador sazonal, um pensador-desenraca, posso dar-me ao confortante luxo de aqui enumerar as dez características do pensador sistemático. Ora vamos lá a elas. E depois debatamos, está bem?
1. Pensador sistemático não é aquele que faz das perguntas as suas únicas respostas, mas aquele que com as perguntas constrói um corpo de pensamento permanente e vivo;
2. Pensador sistemático não é aquele que petisca temas ou que prova vinhos, mas aquele que neles pega, os inspecciona e os analisa profunda e multilateralmente;
3. Pensador sistemático não é aquele que usa a autoridade dos outros para firmar a sua autoridade, mas aquele que usa a autoridade dos outros para construir a sua sem esquecer a dos outros;
4. Pensador sistemático não é aquele que se refugia nas essências para provar a sua mentalidade aberta e historicista, mas aquele que se apoia na mentalidade aberta e historicista para criar novas essências consciente de que outros as porão em causa um dia;
5. Pensador sistemático não é aquele que usa o não para defender o sim ou o sim para defender o não, mas aquele que usa o não e o sim porque sabe que a vida os contempla em igualdade de condições;
6. Pensador sistemático não é aquele que repete ou que inova, mas aquele que sabe inovar repetindo e repetir inovando;
7. Pensador sistemático não é aquele que muda a sua teoria consoante os momentos e as oportunidades, mas aquele que a mantém sejam quais forem os momentos e as oportunidades e que a muda se esses momentos e oportunidade exigirem uma nova epistemologia e um novo tipo de acção;
8. Pensador sistemático não é aquele que abdica do social sob pretexto de que lhe basta estudá-lo, mas aquele que faz do social o êmbolo do seu pensamento e da sua vida e por ele e pela verdade é capaz de dar a vida;
9. Pensador sistemático não é aquele que tem sempre razão ou que tem sempre dúvidas, mas aquele que sabe ter razão quando duvida e que sabe duvidar quando tem razão sem nunca perder o norte da razão;.
10. Pensador sistemático não é aquele que estudou mais ou que estudou menos do que os outros, mas aquele que soube estudar mais quando estudava menos e menos quando estudava mais.
Sonhadores, os sociólogos sempre procuraram duas coisas: as leis do social e a reforma das sociedades. Cá por mim busco bem pouco: tirar a casca dos fenómenos e tentar perceber a alma dos gomos sociais sem esquecer que o mais difícil é compreender a casca. Aqui encontrareis um pouco de tudo: sociologia (em especial uma sociologia de intervenção rápida), filosofia, dia-a-dia, profundidade, superficialidade, ironia, poesia, fragilidade, força, mito, desnudamento de mitos, emoção e razão.
Outros elos pessoais
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31 janeiro 2007
Gana sem 70% da sua floresta
"A madeira é um dos principais produtos de exportação, com a resultante degradação das florestas do país. Quase a metade de Gana estava coberta de florestas, acolhendo 680 espécies de árvores e vários tipos de mogno. A maior parte dessas árvores foi derrubada. No início da década de 1990, apenas restava de pé um terço das florestas do país."- leia aqui.
Recordando os 47 contentores de madeira apreendidos no porto de Pemba
Eu já referi a notícia dos 47 contentores de madeira apreendidos no porto de Pemba na entrada sobre a exploração das florestas em Cabo Delgado.
Mas vale a pena recordar de novo isso. Leia um despacho do jornalista Pedro Nacuo aqui.
(Foto: porto de Pemba, foto do "Notícias)
O sentido das acções
Penso na sociologia como uma arma libertadora, como uma espécie de abre-latas que troca a lata (que somos sem sabermos) pelo seu conteúdo (que somos e poderemos vir a saber). Uma sociologia, enfim, restituidora do sentido das nossas acções, como defendeu Bourdieu:
"A Sociologia talvez não merecesse uma hora de esforço se ela tivesse por fim apenas descobrir os cordões que movem os indivíduos que ela observa, se esquecesse que lida com homens e mulheres mesmo quando aqueles homens e mulheres, à maneira de marionetes, jogam um jogo cujas regras ignoram, em suma, se ela não tiver como tarefa restituir a esses homens e mulheres o sentido de suas ações." (Pierre Bourdieu)
"A Sociologia talvez não merecesse uma hora de esforço se ela tivesse por fim apenas descobrir os cordões que movem os indivíduos que ela observa, se esquecesse que lida com homens e mulheres mesmo quando aqueles homens e mulheres, à maneira de marionetes, jogam um jogo cujas regras ignoram, em suma, se ela não tiver como tarefa restituir a esses homens e mulheres o sentido de suas ações." (Pierre Bourdieu)
"Menores em conflito com a lei"
Segundo o "O País", a Itália vai financiar em dois milhões de euros um programa destinado a reeducar "menores em conflito com a lei". Primeiro organiza-se um banco de dados, depois um centro para esses menores.
Quem serão esses terríveis menores em conflito com a lei? Se calhar já estão pré-definidos.
Blogue
Dois leitores queixaram-se-me por email de que agora, por exemplo, quando querem ver algo aqui aparece ums mensagem dizendo que se entra em páginas não seguras...Por outro lado, estou a ter dificuldades para actualizar as postagens. Acontece que o blogger me obrigou a mudar para a nova versão, uma decisão imperial contra a qual nada pude fazer. Espero que os problemas que existem sejam rapidamente sanados.
Ai as mulheres...
Segundo o "O País", em notícia cheia de lacunas, aumentou (em Maputo? Em todo o país?) o número de homens que se queixa da violência doméstica (o jornal não especifica o tipo ou os tipos de violência). Em 2004 houve 99 queixas, em 2005 foram 767.
30 janeiro 2007
Racismo e fascismo nos grandes mídia americanos
Leia aqui, em inglês, um trabalho da colunista Margaret Kimberley (sugestão encontrada em Bosses).
PDD: a diagonal-liberal política do país
Se a Frelimo participa em conferências internacionais dos partidos da esquerda (socialistas, comunistas) e a Renamo nas conferências do centro-direita, aparece agora a novidade, a diagonal: Raul Domingos, presidente do Partido para Paz Democracia e Desenvolvimento (PDD), o terceiro partido do país, vai participar na Conferência Internacional dos Partidos Liberais Africanos a realizar-se no Senegal.
Carta para o Senhor Presidente da República, Armando Emílio Guebuza
Senhor Presidente
Permita-me que lhe escreva esta carta.
Sei que não tem tempo para a ler, mas quero acreditar que alguém lhe dará conhecimento dela.
Senhor Presidente: a nossa terra já exportou escravos, ouro, marfim, madeira, tanta coisa! Como sabe, escrevi nos manuais de História de Moçambique, nos anos 80, como tudo isso se passou.
Agora, Presidente, parece que estamos a regressar aos séculos da pilhagem.
As nossas florestas estão a ser delapidadas. E floresta, Presidente, é raíz, floresta é o conjunto das nossas raízes, desta terra amada, mas desta terra cada vez mais desmatada.
Presidente: corremos o risco de perdermos as raízes.
Permita-me sugerir-lhe uma coisa: a nomeação imediata de uma comissão de inquérito dirigida pelo decano dos nossos cientistas, Professor Engenheiro Carmo Vaz.
E é tudo, Presidente.
A luta continua.
Carlos Serra
Centro de Estudos Africanos
Terra amada, terra desmatada: o que acontece às nossas florestas em Cabo Delgado
É agora a vez de mostrar o que se está a passar em Cabo Delgado a propósito das nossas florestas, feito o percurso pela Zambézia (1 e 2).
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Eis uma carta do engenheiro Heike E. Meuser, endereçada ao governador de Cabo Delgado:
"Heike E. Meuser
Maputo, 08 de Janeiro 2007
DED, Maputo
V. Excia. O Governador de Cabo Delgado
Pemba
Excelentissimo Sr. Governador de Cabo Delgado,
venho por esse meio informar a V. Excia. dos acontecimentos que nos vivemos enquanto nos, os meus dois filhos de 11 e de 15 anos de idade, eramos como turistos em Cabo Delgado.
No sabado, dia 06 de Janeiro deste ano, meus filhos quiserem fazer um safari para ver os famosos lioes e elefantes no Parque National de Quirimba, em Mareja. Infelizmente, em vez de animais salvagems, eles eram testemunhos de um encontro com dois camões cheio de madeira preciosa, madeira que foi tirado de maneira ilegal do Parque National de Quirimba. Não só o facto de ser enfrentado com madereiros ilegais, também o encontro foi violente, um fiscal de Mareja foi aleijado dos madereiros, aparamente trabalhando por um chines.
Tal acontecimentos não favorecem ao turismo e dão um mal exemplo, ao lado dos efeitos negativos para os fundimentos da natureza mosambicana,
Agradecemos antecipadamente a Vossa atenção
Heike Meuser
Eng. Agr,, Mag. Agr."
____________________________________________
Eis uma carta denúncia:
DENUNCIA
A quem de direito:
Dia 6 de Janeiro de 2007, as 12h, recebemos informacao via radio Motorola que se estava a efectuar o transporte ilegal de madeira num camiao.
12.20, enviei um carro, land rover com 4 fiscais armados para confiscar a madeira e os mesmos encontrarao a um individuo numa motorizada.
Imobilizaram o individuo e respectiva motorizada e levaram a ambos na viatura land rover para o posto de Biaque.
Enquanto isso eu Dominik, tambem fui ao local para ver como estava a situacao, pois nesse momento eu estava de guia turistico com alguns turistas dos quais dois eram menores.
3 km, antes de chegar a Biaque, encontrei um Toyota Corolla escondido que achando que tinham ludubriado aos fiscais que capturaram ao individuo da motorizada decidiram arrancar com a viatura justo no momento que eu estava a chegar e comecei e perseguir o respectivo carro que este parou e dele sairam 2 individuos que eram fiscais fardados e se puseram em fuga mas a populacao diz que viu 3 pessoas a sairem do carro.
Perguntei ao motorista o que estava a fazer naquele local e disse que estava a comprar castanha.
Dirigimo-nos ao posto e nao havia ninguem, so estava um fiscal comunitario.
O land rover que estava com os fiscais armados e o individuo da motorizada foram por uma outra estrada a 3km de macomia, numa aldeia chamada arrapale para procurar o camiao, entraram do mato 3km adiante e encontraram 2 camioes de marca Faw,azul, MNB 98-56 e Faw, branco, MPB 09-69.
Falamos com os motoristas e pedimos os documentos e chaves dos camioes e ficaram 3 fiscais para guardar os camioes que transportavam 32 e 48 touros de pau ferro sem sigla.
Liguei para o Sr. Dias por volta das 15horas, responsavel da fiscalizacao, informando do ocorrido e pedindo ajuda de Pemba.
Disse que ia mandar um carro do parque e que guardasse os documentos dos camioes, enquanto isso chegaram ao local os senhores Rafael e Majimoto, fiscal do parque nacional e chefe do posto.
Estes comecaram a exigir me os documentos dos camioes, um motorista dum dos camioes comecou a agredir me a mim e a minha viatura, tentou levar as chaves do meu land rover, a situacao tornou-se incontrolavel e tentei sair dali e ele bateu-me com uma pedra no braco enquanto eu estava no interior do carro com os turistas nao esquecendo que duas eram menores.
Os fiscais do parque (Rafael e Majimoto), nao interviram nesta contenda e eu disse que ia dar queixa a policia.
Chegados ao posto policial de Anguabe que esta a 40km do local da contenda, liguei para o Sr.Dias a informa-lo do sucedido e ele disse que era para eu deixar os documentos e chaves dos camioes na policia.
Pedi para falar com o comandante mas nao estava e falei com o chefe de operacoes e pedi um policia armado para voltar a Biaque, nesse momento chegou o corolla com o operador ilegal mais 2 fiscais, entraram na esquadra e disseram que iam levar o caso para o posto que iam fazer um auto de noticias e aviso de multa.
Avisei aos presentes que o Sr.Dias tinha dado ordens para deixar os documentos e chaves na policia e negarao e entregaram aos operadores ilegais na presenca dos fiscais.
Pedi proteccao da policia e negaram alegando que teria proteccao dos fiscais do parque.
Voltamos para o local onde estavam os camioes, encontramos o corolla na estrada e os fiscais iam a pe para o mato, oferecemos boleia e negaram.
Chegados a local, levamos os nossos 3 fiscais que tinham ficado a guardar os camioes e comecou confusao entre motorista do camiao e os fiscais, feriu a um deles, tiraram a motorizada do land rover com ajuda da populacao local, partiu o radio motorola que recuperamos e fugimos, quando chegamos a estrada, estacionamos o nosso carro para bloquear o camiao que saia para Macomia e eles foram para Biaque, mobilizaram 20 homens para fazer frente ao meu carro e enquanto eles vinham nos faziamos marcha atras e eles acabaram cansados e desisitiram.
Enquanto isso o outro land rover levou o ferido e os turistas e eu continuei com as deligencias.
Os camioes por fim foram escoltados por uma viatura do parque que so estava com motorista sem fiscal, o corolla que iam a frente dos camioes e atras deles ia um hilux que tentou bloquearme mas nao conseguiu e eu fiquei atras dos camioes. Antes do cruzamento a Anguabe ultrapassei os camioes e fiquei parado a frente para impedir que fossem a selva macua.
Os camioes avancaram em direccao a Anguabe, ultrapassei-os para prevenir a saida para Montepuez, perto da esquadra encontrei ao hilux que dava boleia a mae dum fiscal.
Insistimos para meter os camioes no quintal da esquadra de Anguabe sede e nao aceitavam mas por fim aceitaram.
O motorista comecou a insultar aos fiscais ate que a policia teve que intervir fazendo uso da sua arma.
Abriu-se a investigacao e o policia de servico chamou-me de maneira arrogante, pediu-me o Dire e questionou o meu nome Dominik nome de mafioso, pedi para repetir e disse o mesmo.
Pediu o nome dos motoristas dos camioes mas nao pediu-lhe documentos.
Fiz queixa de agressao fisica contra minha pessoa e os meus fiscais e transporte ilegal de madeira, a policia nao aceitou a queixa de agressao e disse que so ia tratar do assunto madeira.
A policia entregou um auto de entrega aos agentes do parque, pedimos para ler em voz alta e nao aceitou.
Enquanto se fazia as diligencias o Sr. Magimoto, insultou-me, dizendo que eu nao sabia nada porque nao estava formado em Gorongosa, eu sugeri que ele devia contar os touros, sendo o fiscal e porque os camioes iam ficar na esquadra e ele disse que nao era trabalho dele, que eu fosse contar os touros e fui contar.
Quando todos estavam a sair ( Fiscais, Motoristas e operador ilegal), este ultimo ameacou-nos que se nos saissemos da esquadra alguem ia morrer.
Pedimos a policia para mostrar a copia do auto de entrega e a matricula nao correspondia com a do camiao.
Pedi o nome de oficial de servico e recusou-se e dar e essa conversa foi escutada via celular pelo Sr. Nazerali, assessor do parque.
Fomos jantar e apareceu o Director distrital da agricultura para falar comigo e estava acompanhado da esposa e do Comandante da Policia na sua viatura.
Reportei tudo que tinha acontecido, disse que estava desiludido por nao ter apoio das autoridades locais e disse que viviamos numa anarquia total e ele disse me que tinha que ter cuidado com o que dizia porque era perigoso.
Por volta da 1.30 da manha os camioes estavam na esquadra, voltei para casa porque dia seguinte tinha que levar os turistas para Pemba porque viajavam.
As 20.30 do dia 7 de Janeiro de 2007, liguei para o oficial de administracao para saber como estava a situacao e ele disse que os camioes tinham saido, quis saber a que horas tinham saido os camioes e nao me facultou essa informacao.
Nenhuma autoridade do parque foi a esquadra saber do assunto.
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Entretanto, leia aqui, aqui e aqui documentos em língua inglesa.
Já agora, saiba sobre os 47 contentores de madeira apreendidos há dias no porto de Pemba.
Finalmente, hoje ainda e a propósito do que se passa com as nossas florestas na Zambézia e em Cabo Delgado, escreverei aqui uma carta ao presidente da República.
29 janeiro 2007
Florestas de Cabo Delgado
Dhlakama promete géneros alimentares para afectados pelas cheias em Quelimane
"Podemos levar toneladas e toneladas de géneros alimentícios" - disse o presidente da Renamo, Afonso Dhlakama, após ter visitado os bairros mais afectados pelas chuvas na cidade de Quelimane e ter anunciado uma oferta da Renamo de arroz e farinha.
Um gesto novo este, sem dúvida.
O presidente da Renamo culpou o município local e especialmente o seu presidente, Pio Matos, pelos efeitos calamitosos das enxurradas. De acordo com Dhlakama, Pio Matos apenas se preocupa em mandar varrer algumas zonas. Por isso o problema não é a chuva, mas a falta de saneamento com o qual Pio Matos não se preocupa numa cidade cheia de buracos e de zonas alagadas - disse. Afirmou ainda que na era colonial havia um sistema de saneamento que permitia erradicar a água 24 horas depois das enxurradas (Rádio Moçambique, noticiário das 19.30, em despacho de cerca de cinco minutos).
Kusondzokera ndale pa dziko (3)
"Só há duas maneiras de analisar política: a certa que é vossa e a errada que é minha" (provérbio meu cuja patente não registei)
Prossigamos na estrada do kusondzokera ndale pa dziko (espreitando a política na terra).
Temos uma enorme e paciente capacidade para guardarmos a memória da nossa placenta psíquica.
Assim, há dias, o presidente do partido Renamo, Afonso Dhlakama, falou uma vez mais nos "comunistas" da Frelimo a propósito do que chamou roubo sistemático de votos nas eleições e apego ao monopartidarismo.
O Sr. Januário, por exemplo, membro do partido Frelimo, pode ser um ardente defensor dos ideais neo-liberais e ser até um bem-sucedido capitalista do import-export após ter obtido créditos do ex-Banco Austral. Todavia, para o Sr. Dhlakama o Sr. Januário é e será sempre um comunista. Não vale a pena, diz o nosso povo, com a sua forma prazenteira de ver a vida.
Por outro lado, do lado dos porta-vozes da Frelimo, a Renamo será sempre uma enorme unidade guerrilheira, bandida-armada, zaragateira e irresponsável.
Não importa o que o Sr. Pompílio faça, ele que é membro da Renamo e pacato funcionário de uma empresa pública, pois é e será sempre visto como filho dessa "unidade psíquica", como mero órgão de um corpo cuja patologia está fixada para sempre.
Temos, assim, o jogo interessante dos paralogismos irremediáveis.
Kusondzokera ndale pa dziko (2)
"Só há duas maneiras de analisar política: a certa que é vossa e a errada que é minha" (provérbio meu cuja patente não registei)
Vamos lá então prosseguir, em pequenos textos de cada vez, o kusondzokera ndale pa dziko (espreitando a política na terra).
Temos duas grandes virtudes no nosso pensamento avessos à angústia dos detalhes:
(1) Agrupar numa palavra, num conceito, uma realidade que pode ser ser (e é) vasta (a "unidade psicológica de grupo", diria Georg Simmel). As palavras ganham então uma clareza, uma homogeneidades e uma necessidade indiscutíveis. Por exemplo, em relação às eleições de 2004: "Embora o voto da Frelimo fosse mais baixo de 15-20% relativamente a 1999, a maior parte da abstenção foi do lado da oposição. Afonso Dhlakama perdeu 53% e a Renamo 45% do seu voto de 1999." Temos assim grandes conjuntos (Frelimo, Renamo, oposição, abstenção, 53%) reduzidos a uma carne sem ossos ou aos ossos sem carne, como quiserem. Com fragmentos conhecidos formamos uma unidade que julgamos sólida reconstituindo por extrapolação o que é desconhecido.
(2) Por extensão, atribuir a um fenómeno já de si complexo uma causa julgada tão clara como a água dos Pequenos Libombos. Por que razão menos pessoas votaram pela Renamo em 2004? Resposta: "Os eleitores potenciais da oposição decidiram que, tendo começado as chuvas, era melhor ir semear a machamba do que votar pela Renamo."
O nosso grande problema em sociologia política consiste justamente em usarmos florestas para nos pouparmos o abominável trabalho de tomar em conta a singularidade de cada árvore.
Harmonia
"Pregam a harmonia das classes como se estas fossem aglomerados fortuitos de indivíduos que olhassem curiosos uma vitrina numa tarde de domingo" (Freire, Paulo, Pedagogia do oprimido. Porto: Afrontamento, 1972, 2.º ed., p. 201)
Georges Dimitrov venceu
A equipa juvenil do George Dimitrov venceu a mini-liga Cadbury-Bebec.
Mas venceu também a nossa extraordinária capacidade mestiça para guardarmos e recordarmos nomes um pouco de todo o mundo e de todos as latitudes políticas, como o do falecido político búlgaro. Até um bairro Georges Dimitrov temos.
Os pontífices
Já aqui falei várias vezes sobre o positivismo. E também já aqui me perguntei e vos perguntei de que lado estais.
Volto agora brevemente ao tema.
Um dos grandes atractivos do positivismo consiste justamente em tirar o sexo à análise política. Pomo-nos a caminho com sagazes inspecções técnicas, multiplicamos os apelos ao equilíbrio analítico, procedemos a laboriosos estudos sobre a anatomia dos outros (do que escrevem e descrevem) para depois dizermos, com serenidade nefelibata e pontifícia, que não devemos tomar partido salvo o partido de não opinarmos enquanto não tivermos descoberto o sexo dos anjos.
Não há culpados nem culpadores: apenas há o reino da estética analítica. E esta estética analítica exige que expulsemos os demónios dos julgamentos e dos juízos de valor.
Estamos diante da ciência da opinião pontifícia que encontrou o Santo Graal. A opinião dos outros só tem sentido se avalizada pelos mentores dessa ciência.
Armados com a santíssima trindade, os pontífices fazem ciência tão naturalmente como o Sr. Jourdain fazia prosa: sem o saber. Sem chateação e sem ponto final, para dizer a coisa como o Jorge.
28 janeiro 2007
Administração da floresta na Zambézia: um take-away chinês (ou de como voltamos ao antigamente)
Podemos ser ricos de muitas maneiras.
Por exemplo, podemos ser ricos de pobreza.
O relatório que aqui divulgo, da autoria de Catherine Mackenzie, elaborado ano passado, mostra claramente de que maneira podemos um dia ficar sem florestas.
E, portanto, ricos de pobreza.
Mas mostra uma coisa bem mais profunda: os tentáculos de todos os tipos, estrangeiros e nacionais, que nos tornam dia a dia mais pobres e felizes com com essa pobreza, pobreza que enriquece estrangeiros, mas pobreza que, também, assegura dividendos a quem internamente permite o enriquecimento externo. Para mudar um pouco o pensamento do velho Mao Tse Tung: nenhum ovo dá origem a um pinto se um calor local não lhe der um empurrão. E ampliando, agora: nenhum neo-colonialismo medra sem donos da casa solícitos.
A coisa é, estruturalmente, bem mais complicada do que termos a Zambézia (e provavelmente também já Sofala) transformada num take-away chinês e de permitirmos que a nossa madeira faça florescer a indústria mobiliária chinesa.
Nos anos 80 mostrei, em livros de história, de que maneira nos fizeram exportar e exportámos, durante séculos, escravos, marfim, madeira, peles, tanta coisa, para que outros (nas Américas, na Ásia, na Europa) enriquecessem à nossa custa (da maioria). Isso foi feito não apenas por quem aqui vinha, mas por quem, nesta grande casa proto-moçambicana ontem, moçambicana hoje, colaborava no saque.
Não creio que o tempo de hoje seja muito diferente do tempo de ontem em muitas coisas.
Lamentavelmente.
Como um dia escreveu Marx, a história repete-se duas vezes: à primeira como tragédia, à segunda como farsa.
Estão dispostos a discutir comigo o que escrevi?
Lançamento conjunto a 27 de Fevereiro
Renamo moribunda segundo Mabunda
Ao longo de 2006, Frelimo e "Notícias" (especialmente) procuraram mostrar que a Renamo estava em queda livre, com deserções maciças, discursos incoerentes, despotismo de Dhlakama e comportamento desordeiro na Assembleia da República.
Agora, o jornalista Lázaro Mabunda (na imagem) encontrou uma fórmula ainda não usada: a Renamo está moribunda.
Infelizmente, o jornalista não forneceu os critérios pelos quais avaliou o estado de vida da Renamo.
27 janeiro 2007
"Vamos ver quem dispara melhor do que a Renamo"
"Vamos ver quem dispara melhor do que a Renamo" - palavras do presidente da Renamo, Afonso Dhlakama, ontem, num seminário para quadros do seu partido em Quelimane, ao não excluir o recurso às armas de fogo caso - disse - a Frelimo continue a "roubar" (sic) os seus votos nos pleitos eleitorais. A Frelimo tem usado polícias e soldados para assegurar o roubo de votos e por isso a Renamo tem de actuar - acrescentou. Ora, a Renamo também sabe usar a AK-47 (metralhadora russa), rematou Dhlakama, referido pela Rádio Moçambique (RM) hoje.
A RM ouviu depois o secretário do Comité Central da Frelimo para a Mobilização e Propaganda, Edson Macuácua, que disse que a Renamo é incoerente, que está desesperada, que é uma oposição em decomposição, etc. (noticiário da Rádio Moçambique de hoje, 27/01/07, 19.30)
Eu escrevi em entrada anterior que previa que a partir desde ano a temperatura política iria subir. E já começou a subir.
Porta-vozes de cada um dos lados farão comunicados cada vez mais inflamados, diabolizando o lado contrário.
Vou acompanhar de muito perto tudo isso.
Leia entretanto a posição da AWEPA sobre fraude ocorrida nas eleições de 2004.
Roubo, linchamentos e insegurança nos bairros periféricos de Maputo
"Nos bairros periféricos ocorrem muitos assaltos não reportados pela imprensa, que agitaram os moradores. Os linchamentos têm sido a via encontrada para repelir estas acções que, até certo ponto, estão a surtir efeitos nas proximidades donde tais factos ocorreram. Os malfeitores beneficiam do facto de grande parte dos bairros periféricos estarem ainda com as respectivas residências em construção, que com o salário mensal decorrem a um ritmo lento, pois é preciso “apertar o cinto”.
Há roubos que chegam a espantar, pela forma como ocorrem. Por exemplo, só por uma pequena deslocação do quintal para dentro da casa ou vice-versa é tempo suficiente para ficar sem os seus haveres. Este tipo de roubo acontece num curto espaço de tempo que nem dá para acreditar. Mas é assim.
Quando nas proximidades existe uma obra inacabada, sem o respectivo tratamento que dá indicações de que alguém para lá se desloca, cenas destas acontecem com frequência" - Adélia Humberto.
Há roubos que chegam a espantar, pela forma como ocorrem. Por exemplo, só por uma pequena deslocação do quintal para dentro da casa ou vice-versa é tempo suficiente para ficar sem os seus haveres. Este tipo de roubo acontece num curto espaço de tempo que nem dá para acreditar. Mas é assim.
Quando nas proximidades existe uma obra inacabada, sem o respectivo tratamento que dá indicações de que alguém para lá se desloca, cenas destas acontecem com frequência" - Adélia Humberto.
Os mal-parados
"Nós (Finlândia) não temos problemas com Moçambique, mas tenho dois pequenos casos que vocês conhecem: sobre os fundos doados pela Suécia e pela Dinamarca. Tivemos um projecto de melhoria de condições das mulheres presas. Porém, o dinheiro que investimos foi usado pelos funcionários públicos. Então escrevemos uma carta para o ministro do pelouro e também falei com sua Excelência antigo presidente da República, Joaquim Chissano, e nada aconteceu e nós terminamos o projecto” - representante da Finlândia nas Nações Unidas, Ilkka Taipale, falando sexta-feira em Maputo.
A caminho das eleições
Enquanto a Frelimo se desdobra no terreno divulgando as teses do seu recente congresso, a Renamo multiplica-se em seminários.
Falando na Beira num seminário para quadros do seu partido, o presidente da Renamo, Afonso Dhlakama, pediu-lhes que se "mantenham coesão e vigilância permanentes, contra quaisquer actos que concorram para a prática de fraude eleitoral nos próximos pleitos." E, de acordo com o "Notícias" de hoje, Dhlakama afirmou ainda que “A própria AWEPA já declarou que houve fraude em Moçambique. Os americanos, a União Africana e outras entidades já disseram isso. O problema não é de Dhlakama nem da Renamo. O problema é a fraude que a Frelimo anda a fazer.”
Prevejo que se aproximem dias muitos difíceis, de intenso combate político.
Quero prognosticar que as próximas eleições (seja qual for o seu tipo) serão as mais duras da história desta país. Mas sobre isso escreverei proximamente.
Sibindy Political Fashion House
Aqui está, uma vez mais, o mais vistoso político da praça, Yá-Qub Sibindy, com seu turbante e sua capulana heráldica. Quem o não reconhece em qualquer parte deste planeta?
Prevejo que mais dia menos dia, esse valoroso combatente contra a pobreza absoluta ao lado do partido no poder crie uma outra frente de luta: a da moda especial para políticos, bem fashion. Nome proposto para a instituição ou para a empresa, em inglês, já que essa é a nossa moda linguística: Sibindy Political Fashion House.
Dispensai o mundo alheio!
De acordo com o "Notícias" de hoje, o ministro da Juventude e Desportos, David Simango, afirmou que os jovens "não devem pensar num mundo que não é seu" e por isso "os jovens devem saber estabelecer prioridades na vida, para fazer face aos desafios do futuro".
Há ditos tão doutos, tão profunda e tocantemente missionários, que dispensam qualquer outra profundidade cognitiva.
26 janeiro 2007
Blogues pessoais actualizados
Os meus seis outros blogues foram actualizados esta semana (veja os elos à direita). O deixa-falar e o diagnóstico social , por mim coordenados, também. No primeiro prevejo que vai começar um "terrível" debate sobre linchamentos. Finalmente, hoje ainda será actualizado o blogue sobre direito alternativo , o nono, que faço em co-autoria com a Yla.
Kusondzokera ndale pa dziko (1)
"Só há duas maneiras de analisar política: a certa que é vossa e a errada que é minha" (provérbio meu cuja patente não registei)
"Kusondzokera nkati mwa mabhasa ya ndale pa dziko la pantsi"...Esta expressão, no Nhungwe lá em Tete, minha terra, pode traduzir-se por "espreitando a política na terra". Mas vamos simplicar, tornar a expressão mais curta, mais culimável, justamente a do título: "kusondzokera ndale pa dziko".
Entrámos em tempos decisivos, os próximos três anos vão ser cruciais para avaliar o peso da nossa democracia.
Da sessão da Assembleia da República em Março (onde se discutirá o relatório da Conta Geral do Estado 2005) às eleições legislativas e presidenciais, muitas estradas vão ser percorridas, muita paciência vai ser necessário tchovar.
Em crónicas numeradas, aqui, neste diário, irei percorrer uma das estradas, a imediatamente política. Retomarei, a partir de hoje, sistematicamente, o que há anos atrás, por outros meios, designadamente em livros, fiz: analisar a machamba política, o seu húmus, as suas plantas, as suas raízes, as suas ervas daninhas, as suas lagartas predadoras, os seus múltiplos amores e os seus ódios, os seus jogos de corredor rizomático, as suas alianças e desalianças com os sais minerais, etc.
Sigam-me, então, discutam comigo, está bem? Kanimambo.
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Obrigado, nda tenda AV, mano tetense que me ajudou a nhungwezar isto.
Secretários de bairro culimam na machamba da vida
“Os secretários passaram por ali na vizinha, mas como eu não tenho nada para lhes dar, fiquei de fora”, dizia a senhora com cara de amargura no meio de tanta miséria que a chuva só veio piorar.
Esse bem poderia ser uma segunda hipótese de título deste trabalho do "Canal de Moçambique".
"CONJECTURAS: O 51º Toyota"
Uma bela crónica, bem sociológica, a de Rogério Sitoe, director do "Notícias" e ex-estudante da UFICS. "Vou recorrer ao senso comum para a desconstruir", frase dele. Leiam aqui.
A genuflexão em dólares
"Guebuza regressa do Japão com 4,1 milhões de dólares" - eis uma manchete do "O País".
Pois é, nada custa tchovar todos os dias a genuflexão.
Os turbos americanizados do Made in Mozambique
Uma empresa local organizou para amanhã um espectáculo de beneficiência a que chamou "show" e fez publicar num diário local um enorme anúncio com os nomes dos artistas que lá irão cantar e tocar.
Prestem atenção aos nomes desses artistas. Vejam quão moçambicanizados estamos, quantos frutos tem dado a campanha do "Made in Mozambique" nesta terra.
Mas quem disse que os solidários artistas vão actuar em Maputo e não, por exemplo, em Los Angeles?
25 janeiro 2007
As saborosas tangerinas de Inhambane: sociologia de José Craveirinha
Aontem tomar chá não tomou... foi no serviço.
Aoje não toma vai tomar amanhã.
Não toma amanhã toma a outro dia.
Ou quando encontra toma de noite.
E quando não toma de noite então dorme.
Mas quando sonhar amendoim já tomou chá e já comeu.
Houve uma fase em que eu pensei que a sociologia, que a história estavam naqueles livros nos quais o pensamento já fez a digestão e a que chamamos manuais. Houve uma fase em que eu pensei que a história, que a sociologia, estavam nos livros de história e de sociologia, com as suas regras, a sua erudição, os resultados da pesquisa, o seu cabalístico mundo de notas e de citações. Mas hoje penso que, afinal, a história e a sociologia estão nos romances e na poesia.
Tal como o maior sociólogo francês do dia-a-dia é, para mim, o romancista Émile Zola, o maior sociólogo moçambicano é o poeta José Craveirinha, com a sua poesia quente, viril, bela, forte de suco gástrico, cheia da nossa vida, dos nossos sonhos e das nossas tristezas.
As tangerinas de Inhambane têm o selo da revolução. Mas quanto delas, do poema, não se mantém hoje ainda actual?
I
Serão palmas induvidosas todas as palmas que palmeiam os discursos dos chefes?
Não são aleivosos certos panegíricos excessivos de vivas?
Auscultemos os gritos vociferados nos comícios,
E nas bichas são ou não são bizarros os sigilosos sussurros?
Em suas epopeias de humildade deixam intactos os sonhadores.
Sabotagem é despromover um verdadeiro poeta em funcionário.
Não bastam nos gabinetes os incompetentes?
Ainda mais alcatifas e ares condicionados?
Aos dirigentes máximos poupemos os ardilosos organigramas.
Como são hábeis os relatórios das empresas estatizadas
Prosperamente deficitários ou por causa das secas
ou porque veio no jornal que choveu a mais
ou por causa do sol ou porque falta no tractor um parafuso
ou talvez porque a polícia de trânsito não multou Vasco da Gama infringindo os códigos
na rota das especiarias de Calicute.
E os nossos tímpanos os circunjacentes murmúrios?
Não é boa ideologia detectar na génese os indesmentíveis boatos?
Uma população que não fala não é um risco?
Aonde se oculta o diapasão da sua voz
E quanto ao mutismo dos fazedores de versos?
Não sai poesia será que saem
nos verões crepusculares dos bairros de caniço augúrios cor-de-rosa?
Quem é o mais super na meteorologia das infaustas notícias?
Quem escuta o sinal dos ventos ante da ventania e avisa?
II
Na berma das avenidas asfaltadas de lixo olhemos perplexos
os sarcásticos prédios por nós escaqueirados. Não dói?
Nas escolas é maningue melhor partirmos as carteiras e estudar no chão?
E nas fábricas que mãos são estas nossas proletárias mãos que só desfabricam?
Mas nesta colmeia muita atenção ao mel das abelhas aduladoras.
E o que é que se passa com o engordecido responsável sempre a mandar-se em missão de serviço nos melhores hotéis das Europas?
Ou no espólio no saco cheio
vale mais a carência nacional do que ter sido um pide
vale ou não vale nosso esperto milícia Fakir?
III
Que os camionistas heróis dos camiões emboscados a tiro nas viagens
tragam as saborosas tanjarinas d'Inhambane ao custo das ciladas
mas descarreguem primeiro nos hospitais nas creches e nas escolas
que o futuro do País também está na doce doçura das tanjarinas d'Inhambane
e o poder sobrevive na força de um povo com tabelas de amor e não de preços.
Mas os auspiciosos cajus purpurinos já não nos dão tincarôsse porgi
Especular a pátria não é guiar a viatura nova contra os muros e os postes?
Ilegalidade só é ilegalidade nos outros?
Quizumba só é quizumba no mato?
Então juro que tanjarina d' Inhambane é tanjarina de Moçambique.
Eu adoro trincar voluptuosamente os sumarentos gomos da tanjarina d'Inhambane.
E desde leste a oeste quem não gosta das saborosas tanjarinas d'Inhambane?
Então os que abjuram os sagrados frutos da terra façam lá mulher e filhos.
Façam lá um pai e uma mãe. Façam lá tios e sobrinhos. Façam lá uma família.
Façam lá irmãos e irmãs. Façam lá amigos e amigas. Façam lá colegas e camaradas.
Façam lá com a incompreensão ternura amor e paz se são capazes!
IV
As orientações de alguns directores desorientam os juízes... (de'es também)
Mas quem disse que não tenho pena dos conjuntos safaris
embrulhando-os fresquinhos e sem problemas de suores originários deste instável clima tropical?
Quem disse que não lamento vê-los penosamente dos "Ladas" com suas poses
as incalejadas mãos deles sem aguentarem sequer abrir-se a porta
e assentados esperem que seja o motorista irrevogavelmente
dê a volta ao mundo do fatalismo e cumpra ainda hereditariamente essa tarefa?
Quem é que disse que não tenho pena?
Quem disse que não sinto este drama?
V
Depressa você Madalena vai bichar lenha deixa bicha de carapau.
Vóvó fica bichar na comprativa amanhã tem arroz.
Titia sai na bicha de capulana vai bichar pão.
Toninho com Quiristina vai bichar água.
Sexta-feira antepassada mamana Júlia dormiu lá mesmo.
Bichou toda a noite no Jone Uarre mas chegou vez... nada!
Aontem tomar chá não tomou... foi no serviço.
Aoje não toma vai tomar amanhã.
Não toma amanhã toma a outro dia.
Ou quando encontra toma de noite.
E quando não toma de noite então dorme.
Mas quando sonhar amendoim já tomou chá e já comeu.
VI
A gente faz favor quer cascar com unha de dedo grande as tanjarinas d'Inhambane.
Olha lá! Você estás cansada da tua terra?
Salta arame... vaiaaaiii...Você não gosta bandeira? Leva documento... famba!!!
Antigamente 'panhava mais fome mas não ficava aqui?
Antigamente era palmatoada. Não estava? Não ia na estiva?
Antigamente sapato não era corrente de ferro? Agora só quer "Adidas" não é?
Antigamente sentava no xibalo. Agora senta no Scala não senta? Mas quem deu?
Antigamente escrevia nome? Aonde? Capaz?
Agora manda carta no jornal p'ra dizer que pão não presta.
Antigamente encontrava passaporte? Agora não 'panha passaporte fica triste.
Fica muito zangado. Faz barulho. Antigamente não era só caderneta?
Sim, agora come carapau. Não é peixe? Batata doce e mandioca não é comida?
Nossa barriga alembra bife com batata frita e azantona.
Alembra bacalhaumais grelos e aquele azeite d'oliveira com vinho tinto de garrafão lacrado.
Mas nós tinha isso quando queria ou quando restava? era nossa casa? Qual casa?
Lá naquela casa a gente puxava otoclismo p'ra nosso cu p'ro cu dos outros?
Vá! Fala lá! A gente não ficava de cócoras na sentina. A gente tinha mais o quê?
VII
É verdade chuva na machamba não chove. Mas a gente espera. Chuva vai vir.
É verdade a gente come couve com couve carapau com carapau farinha com farinha
Mas senta na nossa mesa. Toda a família senta em casa no prédio. Amigo também senta
Ir embora não voltar mais? Não pode. Deixar aqui. Ir aonde? Capaz!
Mudar moçambicano ficar o quê? Mudar a cara ficar qual cara? Fugir há outro que vai fugir. Moçambicano próprio não foge.
Quando homem é homem é só um coração. Não é dois.
VIII
Mesmo quando não tem senha de gasolina não faz mal. Não há crise. Candonga tem.
Mas quem disse que aquelas saborosas tanjarinas d'Inhambane não vem mais?
É preciso, nós vamos fazer estratégia de mestre Lénine
e vamos avançar duas dialécticas cambalhotas atrás
moçambicanissimamente objectivas
concretissimamente bem moçambicanas.
IX
Agora alerta camarada Control. Vem aí o camião com tanjarinas d'Inhambane.
Tira o dedo do gatilho e faz um aceno d'alegria aos estoico motorista.
Ganha metical mas desde Inhambane, desde Chai-Chai, desde Manhiça
ele está a guiar mas ele só sabe que chegou quando está a chegar.
Camarada Control: Aldeia é aldeia não é vila.
Camarada Control: Vila é vila não é cidade.
Camarada Control: Cidade é cidade não é distrito.
Camarada Control: Distrito é distrito não é província.
Camarada Control: Província é província não é nação.
Camarada Control: Control é Control não é Governo.
Camarada Control: nosso território nacional é desde o primeiro grão d'areia
em Cabo Delgado até ao último milímetro na Ponta D'Ouro.
X
Camarada Control: Abre o teu mais fraterno sorriso no meio da estrada
e deixa passar de dentro para dentro de Moçambique
nossas preciosas tanjarinas d'Inhambane.
Agora casca uma tanjarina e prova um gomo mais outro gomo.
É doce ou não é doce Camarada Control?
Pronto!
Muito obrigado Camarada Control!
E viva as saborosas tanjarinas d'Inhambane!!!
VIVA!!!
José Craveirinha(1982-84)
Cidade do Maputo
Mamana Josefinô
24 janeiro 2007
Quénia: 7.º Fórum Social Mundial e entrevista de Samir Amin sobre os senhores da guerra em África
Termina amanhã o 7.º Fórum Social Mundial, a decorrer em Nairobi, Quénia. É estranho o quase silêncio da nossa imprensa sobre tão importante acontecimento. Leia, entretanto, uma entrevista dada pelo Professor Samir Amin à Carta Maior, a propósito dos senhores da guerra em África.
Bispo Sengulane e os linchamentos em Maputo: necessário um transplante de coração
A propósito dos linchamentos na periferia da cidade de Maputo, o "Notícias" entrevistou há tempos o bispo da diocese dos Libombos, Dinis Sengulane. Eis o diálogo:
NOT – Falou dos linchamentos. O que pensa que estará por detrás do fenómeno que tende a atingir proporções alarmantes?
DS - Isto representa uma prova clara de que a nossa moral está a precisar de um remédio muito urgente, aquilo que a Bíblia chama de coração de carne não existe, há sim coração de pedra, precisamos de fazer um transplante de coração, porque o que está a acontecer coloca um grande desafio para nós os dirigentes religiosos, porque a nossa mensagem não consegue afectar, influenciar ou ter um impacto muito grande no seio da sociedade, de tal modo que sintamos a importância da santidade da vida humana e a necessidade da promoção da dignidade da pessoa humana. Estamos a precisar de usar mais espaços na igreja, nos meios de comunicação social, nas escolas, isto é, institucionalizarmos a mensagem de paz e reconciliação em todas as instituições.
O coração tem razões que a razão não conhece
Apesar de todos os ataques contra Whitewall, os maiores financiadores do regímen de Mugabe são bancos e companhias de seguros baseados em Londres, afirma o Africa Confidential.